São Paulo, segunda-feira, 23 de agosto de 2010

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Crime castiga a maior favela de Caracas

Em visita acompanhada pela Folha, policiamento aparece insuficiente e hospital da região exibe precariedade

Há apenas 250 policiais monitorando município que abrange favela, onde moram cerca de 600 mil pessoas

FLÁVIA MARREIRO
DE CARACAS

Marco Hernández gemia numa maca às 20h de sábado, 18 horas depois de ter levado cinco tiros em Caracas. Dois deles que partiram seu fêmur. A mãe, a tia e a irmã dele esperavam dos médicos do hospital Pérez de León a lista de material de cirurgia.
Só comprando de gaze a fios cirúrgicos era possível aumentar as chances de Hernández, 27, desempregado, ser operado na unidade. "Viemos aqui, não nos aceitaram. Rodamos dois hospitais e nos devolveram para cá", conta a irmã, Carolina.
Chega a ser um clichê em Caracas descrever o hospital municipal Pérez de León, que atende o Petare, o maior complexo de favelas do distrito metropolitano, como "hospital de guerra". É para lá que vão os feridos a bala e arma branca das redondezas, num fluxo que aumenta nos fins de semana.
O local foi uma das paradas da patrulha policial do município de Sucre, um dos cinco que formam Caracas, que a Folha acompanhou anteontem.
Hernández era um dos nove feridos que chegaram ao hospital desde sexta-feira, num final de semana até então considerado tranquilo.
Além da falta de insumos, o elevador que leva ao centro cirúrgico no segundo andar "às vezes" funciona. E a precariedade do hospital é tema de embate feroz entre Hugo Chávez e o prefeito opositor do município, Carlos Oscaríz, que acusa o primeiro de negar-lhe verbas.
"Até agora temos quatro mortos desde sexta. A coisa se complica quando é metade ou fim do mês, quando sai o pagamento", diz Pausides Benítez, 41, chefe da Divisão de Patrulha da Polícia. Sua jornada terminaria às 6h da manhã de domingo somando o dobro de mortos: oito.
A Folha o viu desmantelar ao menos duas festas "irregulares", frustrado ante o enxame de garotos em motos, que zuniam nas ruelas da favela que começa num morro, como no Rio, e se cola às demais dos arredores de Sucre. "Não temos como parar todo mundo, mas 75% dos crimes são feitos por "motorizados"."
É da responsabilidade de Benítez monitorar o município, que inclui Petare, com 250 homens. Ele diz que seu efetivo dobrou em um ano, com o governo oposicionista. "Ainda assim, precisava de mais 200 policiais."
A área responde por cerca de 30% dos assassinatos na cidade, com marca em 2009 de 94 para cada 100 mil habitantes -menos que em 2008.

VIOLÊNCIA
A irmã de Hernández tem um problema adicional. Carolina está preocupada porque os que atiraram no desempregado prometeram segui-lo para matá-lo.
Não é uma preocupação em vão. Neste mês, os médicos do Pérez de León pararam para protestar contra a insegurança. E os casos vão de tentativa de estupro a roubo no estacionamento.
"Rezo toda vez que meu filho tem ataque de asma porque não sei se chego viva a esse hospital. Meu irmão ter sido baleado é um pesadelo, mas eu já vivia com medo todos os dias", continua Carolina, 34, que diz que votará na oposição nas eleições legislativas de 26 de setembro e culpa Chávez pela falta de estrutura do hospital municipal.
Não só Carolina exibe a classificação. Petare, antes um bastião chavista, impôs derrotas a Chávez em referendos em 2007 e 2009.


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