|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
"Não sei o que acontecerá conosco",
desabafa porta-voz da entidade
BEATRIZ LECUMBERRI
DA FRANCE PRESSE, EM BAGDÁ
Lágrimas de impotência, raiva,
medo e vontade de abandonar a
missão: o ataque de ontem contra
a sede da ONU em Bagdá baixou
ainda mais o moral dos mais de
cem funcionários que optaram
por continuar no Iraque após o
atentado de 19 de agosto.
A cerca de 250 metros do prédio
semidestruído no atentado de
agosto, ardiam os destroços de
mais um carro-bomba -que a
polícia iraquiana deteve a tempo
de evitar novo massacre.
Para os funcionários da ONU,
não resta dúvida de que o objetivo
dos agressores era matar o maior
número possível de pessoas que
trabalham para a organização.
"A sensação que fica para nós é
que eles ganharam mais uma
vez", lamenta Antonia Paradela,
responsável pelo Programa Mundial de Alimentação (PAM) em
Bagdá e porta-voz interina da organização no Iraque. "Nem sequer tínhamos nos recuperado do
primeiro ataque e agora acontece
isto. Não sei o que vai acontecer
conosco."
Desde o atentado de 19 de agosto, no qual morreram 23 pessoas
-incluindo o representante máximo da missão, o brasileiro Sérgio Vieira de Mello-, grande
parte dos funcionários não-iraquianos da ONU deixou o país.
Telefonemas para a organização
na cidade não são respondidos, e
são poucos os que acreditam no
retorno de seus colegas a Bagdá
no futuro próximo.
"É verdade que agora somos
menos", explicam seus companheiros, discretamente. "Depois
do atentado de 19 de agosto, as
pessoas ficaram entrando e saindo. Houve gente que teve direito a
duas semanas de férias extras, e
outras pessoas foram embora
porque podiam fazer seu trabalho
de outros países."
Jansa Hussein, iraquiana que
trabalha em programas humanitários da ONU há sete anos, recordou entre lágrimas a imagem que
viu ao chegar ao Hotel Canal ontem. "O corpo do policial carbonizado no chão, o carro ainda ardendo em chamas e as pernas do
suicida. Foi só o que restou dele",
conta. Para ela, todos os iraquianos que trabalham para a ONU,
dois dos quais estão entre os 19 feridos do atentado de ontem, querem continuar seu trabalho. "Estes ataques decepcionam a todos
que trabalham neste edifício para
melhorar a vida dos iraquianos."
Depois do atentado, os funcionários iraquianos da ONU buscavam explicação para a nova agressão: os inspetores de desarmamento não evitaram a guerra, os
13 anos de embargo ou o fato de a
ONU não ter conseguido evitar a
ofensiva de março.
"Resta-nos o consolo de saber
que há muitos iraquianos positivos, mas existem outros que querem prejudicar o país inteiro e que
sabem que somos vulneráveis,
coisa que não escondemos", disse
um funcionário que, exaurido,
pediu demissão nesta semana.
"Somos alvos bem visíveis."
Para alguns, o atentado de ontem pode também ser uma mensagem enviada na véspera da
abertura da reunião da Assembléia Geral, da qual participa uma
delegação iraquiana. "De qualquer maneira", diz Paradela, "não
sabemos quais eram as intenções
do suicida. Além disso, fala-se do
Iraque todos os dias na ONU."
Texto Anterior: Frases Próximo Texto: Iraque ocupado: Na ONU, Bush voltará a defender a guerra Índice
|