São Paulo, sábado, 24 de janeiro de 2004

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FÓRUM SOCIAL MUNDIAL

Para eles, país usa dois pesos e duas medidas

Árabes criticam pressão dos EUA por democratização

PAUL TAYLOR
DA REUTERS, EM DAVOS (SUÍÇA)

Líderes árabes e muçulmanos criticaram ontem a campanha americana por democracia no Oriente Médio, qualificando-a de hipócrita e dizendo que Washington deveria primeiro deixar de usar dois pesos e duas medidas no conflito árabe-israelense.
Num debate público promovido no Fórum Econômico Mundial, em Davos, figuras de alto escalão da Arábia Saudita, do Egito e do Irã acusaram a administração Bush de ignorar as armas israelenses de destruição em massa e as violações dos direitos humanos dos palestinos cometidas por Israel, ao mesmo tempo em que pressionam os Estados árabes e muçulmanos para que se desarmem e se democratizem.
"A democracia ou qualquer coisa que se assemelhe a uma participação mais ampla terá de vir de dentro das sociedades", disse o príncipe Turki Al Faisal, que pertence à família real saudita e é o embaixador em Londres.
Ele se queixou de que os EUA falam em promover a democracia no Oriente Médio, mas se negam a reconhecer um dos poucos líderes da região eleito democraticamente, o palestino Iasser Arafat.
O diretor do Programa de Desenvolvimento da ONU, Mark Malloch-Brown, disse que a democracia não pode ser imposta pela força e que ela deitará raízes apenas nos lugares onde possa ajudar a superar a pobreza.
Gamal Mubarak, influente filho do presidente egípcio, Hosni Mubarak, manifestou seu apoio aos chamados por reforma, democracia multipartidária e uma sociedade mais aberta no mundo árabe, inclusive em seu próprio país. Mas ele disse que o fato de Washington se negar a tratar o problema palestino de frente enfraquece os reformistas árabes.
O chanceler do Irã, Kamal Kharrazi, rejeitou críticas feitas ao estilo da democracia em seu país, depois que um conselho de clérigos barrou quase a metade dos candidatos à eleição parlamentar do próximo mês. ""Estamos determinados a ter uma eleição justa, e o presidente vai assegurar que isso aconteça", disse ele no debate promovido pela rede BBC.
Kharrazi disse que os EUA não agem de maneira justa e equilibrada ao promover a democracia, de modo que suas pressões seletivas sobre alguns países do Oriente Médio são interpretadas como tentativa de promover instabilidade. Além disso, disse que a maioria dos iraquianos quer uma eleição geral para escolher um governo que garanta a soberania iraquiana, assumindo o poder em lugar das forças de ocupação americanas, mas que Washington não tem interesse em promover uma eleição desse tipo.
Richard Haass, antigo alto funcionário do Departamento de Estado americano e um dos arquitetos da campanha em prol da democracia no Oriente Médio, disse que a ação é uma tentativa de romper com décadas de hipocrisia durante os quais os EUA trataram governantes árabes como amigos e, ao mesmo tempo, ignoraram sua natureza autoritária.
Haass tentou justificar as opções de Washington: "A política externa diz respeito, em parte, a dois pesos e duas medidas. Ela pode ser consistente em seus princípios, mas às vezes é necessário fazer escolhas. Não podemos nos dar ao luxo de sermos 100% consistentes".


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