São Paulo, domingo, 24 de janeiro de 1999

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CONFLITO SEM FIM
Imagens do fotógrafo Sebastião Salgado mostram vítimas dos conflitos, retomados em dezembro
Angola se depara com nova guerra civil

CARLOS EDUARDO LINS DA SILVA
da Sucursal de Brasília

As esperanças de paz em Angola são "exíguas", mas, "ainda assim, temos de trabalhar sobre elas", disse ontem o presidente do Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas (ONU), o brasileiro Celso Amorim.
Em entrevista exclusiva à Folha, por telefone, de Nova Iorque, Amorim afirmou que a estratégia para a paz em Angola precisa ter duplo alcance: pressionar os rebeldes da Unita a cumprirem o acordo de paz de 1994 e, depois disso, incentivar a volta ao diálogo.
A guerra civil em Angola, iniciada após a independência de Portugal, em 1975, foi interrompida em 1991, retomada em 1992, e novamente suspensa em 1994.
A partir de abril de 1998, os rebeldes da Unita (União pela Independência Total de Angola) passaram a violar de maneira ostensiva o acordo de paz firmado em Lusaka (Zâmbia), quatro anos antes.
Em 4 de dezembro, o governo mobilizou suas tropas para um grande ataque contra as bases da Unita, no Planalto Central do país.
Para surpresa do governo angolano e de muitos observadores, os rebeldes da Unita demonstraram grande capacidade militar, rechaçaram a ofensiva e partiram para um poderoso contra-ataque.
Fortes chuvas na região dos combates fizeram com que eles perdessem intensidade nas últimas semanas. Mas a situação é tão volátil que o secretário-geral da ONU, Kofi Annan, chegou a sugerir que a entidade deixasse o país.
A Unita vinha sendo objeto de sanções da ONU por descumprir o acordo de Lusaka, que previa a desmilitarização dos rebeldes e a entrega de territórios sob seu controle para o governo.
As sanções se provaram inúteis. A Unita continuou a explorar e vender diamantes, que lhe rendem estimados US$ 610 milhões por ano, e a comprar armamentos.
O governo de Angola acusou formalmente o de Zâmbia de ajudar a Unita. Há rumores de que o Gabão também tem auxiliado os rebeldes angolanos.
As armas, modernas, que a Unita tem usado vêm da Ucrânia, uma das ex-repúblicas soviéticas que comerciam tanto com diamantes quanto com armamentos.
Acredita-se que mercenários da África do Sul e do Congo participem das tropas da Unita.
Os dois lados da guerra civil parecem ter pouca condição de vencê-la. A Unita, por não dispor de organização e capilaridade em seus contingentes. O governo, por ter comandantes militares há muito afastados dos combates e soldados mal armados e mal equipados.
Um dos países mais ricos em recursos naturais da África (que já foi o quarto maior produtor do mundo de café e diamantes e tem grande potencial petrolífero), Angola tem visto a situação social de seus 10 milhões de habitantes deteriorar-se a cada ano. Em 1998, 500 mil pessoas ficaram sem lar.
Pelo menos 16% do Orçamento (de estimados US$ 10 bilhões) são destinados à guerra civil. A dívida externa do país é de US$ 6 bilhões. O salário médio do angolano é de US$ 6 mensais. O que é pior: a esperança diminui a cada mês.



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