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Walter Rodgers, da CNN, fala da experiência de acompanhar combates
Mostrar americanos mortos era proibido, diz repórter
LAURA MATTOS
DA REPORTAGEM LOCAL
Aos 62 anos, Walter Rodgers,
correspondente da TV CNN na
guerra do Iraque, passou quatro
semanas com três opções para
dormir: um monte de feno e o
banco ou o capô de seu carro.
Durante o conflito, ele fez parte
do projeto "embedded" do Pentágono, que consistiu em "encaixar" ou "embutir" jornalistas nas
tropas para mostrar o avanço da
coalizão em tempo real.
Rodgers se transformou numa
das estrelas da cobertura da ofensiva por mostrar ao vivo as batalhas do 7º Regimento de Cavalaria. Fora o "detalhe" de quase não
dormir, contar com pouca água e
comida e trabalhar sob tempestades de areia, o correspondente esteve várias vezes sob fogo cruzado. Atravessou estradas com iraquianos atirando dos dois lados. E
estava ao vivo quando uma bomba explodiu a poucos metros dele.
À Folha, por e-mail, Rodgers falou sobre seus dias de guerra. Ele
conta como agia ao encontrar iraquianos mortos. "Não fixava o
olhar para não me assombrar
com o rosto de um cadáver." E
afirma que o Pentágono o proibiu, por contrato, de exibir rostos
de soldados americanos mortos.
Folha - Como era transmitir ao vivo, durante as ações militares?
Walter Rodgers - Tenso. Todos
se esforçavam para pôr o produto
no ar quando granadas e foguetes
cruzavam nossas cabeças e o tiroteio ocorria ao nosso lado. Muitas
vezes, acontecia à noite ou numa
tempestade de areia.
Folha - Como fazia para dormir,
comer, tomar banho?
Rodgers - O desconforto físico
era pior do que estar no tiroteio.
Os combates eram eletrizantes.
Viver sem água quente, eletricidade, dormir torto dentro do carro,
no capô ou em montes de feno,
estar sujo o tempo todo era realmente desconfortável. Era frio,
era quente. Tempestades de areia,
uma completa tortura.
Folha - Enquanto os soldados
descansavam, o sr. aproveitava para produzir matérias especiais.
Quando conseguia parar?
Rodgers - Tive quase nenhum
descanso. Se quiser descansar, vire bombeiro. Correspondentes de
guerra trabalham até cair.
Folha - Quantos feridos e pessoas
mortas encontrou pelo caminho?
Rodgers - Vimos muitos soldados iraquianos mortos. Tentava
não olhá-los ou ao menos não fixar meu olhar neles. Se você fixa
os olhos num cadáver, a imagem
assombra você. Então, controlava
minha visão sempre, como um
radar. Via tudo à minha volta,
mas, como não fixava o olhar, não
me assombrava com o rosto de
um cadáver, uma perna despedaçada ou moscas comendo o rosto
de um soldado do Iraque. Vi muito mais mortos do que feridos.
Folha - Qual foi o pior momento
para o sr.? E o maior medo?
Rodgers - Houve momentos em
que corríamos de atiradores por
duas horas, com tiros dos dois lados da estrada, as balas saltando à
nossa volta. Felizmente, os iraquianos são maus atiradores. Foi
um milagre nada ter acontecido,
porque muitas vezes nossa equipe
era um alvo vulnerável.
Folha - O sr. teve de assinar um
contrato com o Pentágono. Quais
era os termos do documento?
Rodgers - Não me lembro de todos, mas diziam, basicamente,
que não podíamos mostrar o rosto de um soldado americano
morto. Éramos proibidos de revelar uma operação militar dos EUA
antes de seu início. Não podíamos
divulgar números exatos das forças norte-americanas etc. Todos
pareciam justos e razoáveis.
Folha - Como avalia as críticas de
que as TVs americanas se pautaram
pela versão do governo dos EUA?
Rodgers - Não usamos só informações do governo dos EUA. Estava na linha de frente. Divulguei
o que vi. Essa era a vantagem dos
"embutidos". Vimos as batalhas,
os fracassos e os sucessos. O processo dos "embedded" foi revolucionário, realmente um avanço jornalístico.
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