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Grande coalizão alemã dá sinais de desgaste
Dois anos após tomar posse em aliança com social-democratas, Angela Merkel tem que remanejar governo pela primeira vez
Já de olho nas eleições de 2009, SPD deve intensificar ataques à chanceler e ao parceiro conservador, a União Democrata Cristã
RENATE KRIEGER
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA, DE BONN
Após dois anos articulando
reformas em comum, a grande
coalizão de governo da Alemanha entrou dividida na segunda
metade do mandato, que vai até
setembro de 2009. Nesta semana, a saída do vice-chanceler
Franz Müntefering evidenciou
o desgaste entre os conservadores da União Democrata Cristã
(CDU), da chanceler Angela
Merkel, e o Partido Social-Democrata alemão (SPD).
Franz Müntefering, que também era ministro do Trabalho,
era tido como o principal apoio
social-democrata de Angela
Merkel no governo. Sua saída,
por razões pessoais (sua mulher tem câncer), é a primeira
alteração ministerial da gestão
da chanceler, empossada em
novembro de 2005.
Juras e intenções
O posto de ministro do Trabalho será ocupado por Olaf
Scholz. Frank-Walter Steinmeier, ministro das Relações
Exteriores, passará a ser o rosto
social-democrata ao lado de
Merkel. "Vou trabalhar por
uma imagem mais unida da
grande coalizão. Não podemos
disputar eleições pelos próximos dois anos", afirmou o novo
número dois do governo alemão, na quarta-feira.
No dia seguinte, Angela Merkel conversou com Steinmeier
sobre suas novas funções.
"União significa puxar a corda
do mesmo lado, na mesma direção", disse a uma TV alemã.
A aparente harmonia, no entanto, não esconde que o casamento entre SPD e CDU não
vai bem. No início deste ano,
durante a presidência alemã da
União Européia, Merkel e
Steinmeier demonstraram
união no plano internacional.
Atualmente as relações estão
abaladas -especialmente por
causa da recente visita do Dalai
Lama à Alemanha.
"Não se sabe como eles vão
articular o governo internamente", avalia o professor Tilman Mayer, do Instituto de
Ciências Políticas da Universidade de Bonn. "As últimas críticas de Steinmeier a Merkel, há
duas semanas, causaram tensão entre ambos. Steinmeier
acha que Merkel errou ao receber o líder espiritual", explicou
à Folha.
A China vê o dalai lama como
símbolo do separatismo tibetano e cancelou duas reuniões internacionais na Alemanha em
razão da visita.
Fim de jogo?
No primeiro tempo do mandato, a grande coalizão diz ter
conseguido um balanço positivo: implementou reformas como a do sistema de saúde, aumentou a idade da aposentadoria para 67 anos a fim de enxugar as contas do Estado e diminuiu o desemprego, que em outubro registrou seu menor nível em 12 anos.
No fim do mês, a taxa de desemprego da Alemanha era de
8,2%, ou 3,4 milhões de desempregados. Em 2005, o país tinha 5 milhões.
Agora, o governo alemão busca união para implementar as
reformas que ainda faltam. Mas
enquanto a CDU pressiona pela
continuidade das reformas, o
SPD, parceiro minoritário na
coalizão, luta por coesão interna. Após a saída de Müntefering, na quarta-feira, uma pesquisa do instituto Forsa deu
24% de intenções de voto aos
social-democratas -o nível
mais baixo em anos.
O SPD vem sofrendo principalmente com a ascensão do
partido radical de esquerda Die
Linke, criado em junho. Com
propostas de justiça social e
distribuição da riqueza acumulada durante as reformas, a Linke vem se fortalecendo especialmente nos Estados da antiga Alemanha Oriental.
A última pesquisa deu 12% de
intenções de voto ao partido,
que já é o terceiro mais forte da
Alemanha.
Eleições regionais
As divergências da "coalizão
rubro-negra", como é conhecida, mostram que os partidos já
se deixam levar pela tentação
de se articular para as eleições
regionais, em 2008. Com críticas mais veementes à chanceler
Angela Merkel, o partido social-democrata quer sacudir o
trono de popularidade da líder
do governo.
Para o professor Tilman Mayer, Frank-Walter Steinmeier
ganha fôlego político na cadeira
de vice-chanceler. Estrategicamente, contudo, tanto os social-democratas quanto os conservadores da CDU enxergam
que são mais fortes juntos. Por
enquanto, não há risco de eleições antecipadas, diz Mayer.
"A coalizão ainda faz sentido.
Se rachasse agora, fortaleceria
a Linke, porque abalaria a imagem do governo", explica.
Dezoito anos após a reunificação, a tendência de "esquerdização" da Alemanha pode ter
sido um dos motivos da saída
de Franz Müntefering do governo. "Mesmo alegando razões pessoais, o momento foi
oportuno" diz Mayer.
Müntefering estava enfraquecido no SPD por querer a
continuidade de reformas liberais iniciadas pelo ex-chanceler
social-democrata Gerhard
Schröder. Há duas semanas,
perdeu uma importante batalha interna, quando o partido
decidiu endossar uma medida
para prolongar o pagamento do
seguro-desemprego a desempregados com mais de 58 anos.
Segundo analistas, a gota d'água pode ter sido o veto da CDU
a uma proposta do SPD de estabelecer um piso salarial para
empregados dos Correios.
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