|
Próximo Texto | Índice
TRANSIÇÃO EM CUBA / SUCESSÃO EM FAMÍLIA
Eleito, Raúl sinaliza mudanças na economia
Confirmado no cargo, novo líder diz que situação econômica é "insustentável", mas promete consultar o irmão sobre alterações
Novo comandante promete acabar com "proibições simples" em breve; seu número dois será "guardião ideológico" da revolução
Alejandro Ernesto/Efe
|
Confirmado no cargo, Raúl Castro discursa no Parlamento da Ilha |
LAURA CAPRIGLIONE
ENVIADA ESPECIAL A HAVANA
Na Cuba pós-Castro que a
burocracia comunista quer fazer crer que será realidade daqui em diante, nada poderia ser
mais emblemático do que a primeira página do jornal oficial
"Juventud Rebelde" que circulou ontem, dia em que, depois
de 49 anos de poder incontrastável, Fidel Castro, 81, foi substituído na presidência do Conselho de Estado, órgão máximo
de poder na ilha, por seu irmão
Raúl Castro. Nele se vê um
exército armado de fuzis empunhados por dezenas de "Fidéis
Castros", encimados pela frase:
"A Revolução necessita agora e
no porvir de muitos "Fidéis'".
E foi um "Fidel" com DNA e
tudo, o irmão mais novo dele,
de 76 anos, que se sentou na cadeira de presidente do Conselho de Estado, agora como titular do cargo, eleito pela 7ª legislatura da Assembléia Nacional
do Poder Popular que se reuniu
ontem. Tudo como se esperava
desde que, há anos, Fidel disse
que o irmão o sucederia.
Fidel, aliás, não esteve presente na Assembléia. Mas enviou seus votos por escrito. Votou em Raúl por certo, já que o
novo presidente, como costuma acontecer nos escrutínios
de partido único, ganhou com
100% dos votos.
Chefe das Forças Armadas
Revolucionárias (FAR) de Cuba, Raúl estava no comando do
país desde julho de 2006, quando, doente, Fidel lhe passou
temporariamente o poder, depois de uma cirurgia intestinal.
Mudanças
Raúl não se apresentou com
o traje verde-oliva que se fundiu à imagem do irmão, assim
como a barba, que o ex-guerrilheiro disse que rasparia no dia
em que se consumasse a construção do socialismo em Cuba.
Nunca raspou os pêlos, que entretanto ficaram finos e ralos.
Só com o bigode tradicional,
Raúl apareceu de terno escuro
bem cortado, gravata clara e camisa social branca, no pronunciamento que fez pela TV oficial depois de sua eleição pelos
614 deputados reunidos na Assembléia Nacional, no Palácio
das Convenções de Havana, em
uma das mais restritas áreas da
capital, o bairro de Miramar.
No total, foram 43 minutos
de discurso (pouco para os padrões castristas, de cinco horas), em que Raúl leu com voz
firme texto preparado com antecedência. Chegou a defender
um Partido Comunista Cubano
"mais democrático". Mas qualquer ilusão reformista desfez-se na mesma frase, quando o
novo líder reafirmou disposição de que o partido continue a
ser o único legalizado na ilha.
Raúl qualificou de "irracionais e insustentáveis" os preços
subsidiados da "libreta" de racionamento vigente desde a revolução de 1959, o que sugere
um aumento no custo de vida
do cubano médio.
Em contrapartida, disse pretender elevar o valor dos salários, de modo a cobrir as necessidades das famílias. "Mas isso
só se conseguirá fazendo crescer a economia" -e não precisou data para que nada ocorra.
Nem o reajuste dos preços nem
o aumento de salários.
No mesmo capítulo da economia, atacou a dualidade monetária em Cuba, pela qual coexistem duas moedas, uma (voltada para o turismo) valendo 25
vezes mais que a outra (voltada
para os cubanos).
Evasivo, Raúl prometeu para
as próximas semanas o início
da eliminação de proibições
"mais simples" -não disse
quais-, mas salientou que outras -também não disse
quais- demorarão mais para
ser levantadas, pois estão relacionadas à defesa nacional contra agressões externas -especificamente, ele mencionou as
americanas, como esperado.
O novo presidente defendeu
"uma estrutura estatal mais
compacta e funcional, com um
número menor de organismos
da administração central e uma
melhor distribuição das funções", com vistas a "tornar mais
eficiente a gestão do governo".
O objetivo, disse ele, é "satisfazer as necessidades básicas da
população, tanto materiais como espirituais, partindo do fortalecimento do crescimento
sustentado da economia".
Dos 614 deputados da Assembléia Nacional, pelo menos
80% nasceram ou foram educados depois da vitória da revolução de 1959. Mas o comando do
país ficará mesmo nas mãos da
velha guarda. Além de Raúl, a
eleição de José Ramón Machado Ventura, 77, ex-combatente
guerrilheiro e membro do Birô
Político do PCC, mostrou que o
núcleo duro dos revolucionários não está disposto a se aposentar. No fim da assembléia,
como não podia faltar, veio o
grito "Viva Fidel". Unânime.
Próximo Texto: Ilha privilegiou "velha-guarda" para controlar expectativas Índice
|