São Paulo, domingo, 25 de junho de 2000


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MULTIMÍDIA
The New York Times - de Nova York
Programa de bonecos faz sátira política na TV e desafia Putin

MICHAEL WINES

ESTADOS UNIDOS - No que parece ser mais um capítulo da luta pela liberdade de expressão, o Kremlin entregou um jornalista às guerrilhas tchetchenas, pediu aos jornais que obtenham licença federal para continuar funcionando e pôs o barão da mídia russa Vladimir Gusinski na prisão.
Mas o derradeiro teste para as intenções do Kremlin pode ocorrer caso o governo tente destruir um monte de grotescos bonecos de borracha sem pernas.
Os bonecos -um orelhudo presidente Vladimir Putin e seu "rasputinesco" chefe de gabinete, Alexander Voloshin, velhos comunistas carecas, cabeçudos de direita e outras celebridades- fazem parte do elenco de "Kukly".
"Kukly" é uma sátira política. Muitas vezes obsceno, hilariante e ácido, é, há tempos, o programa de TV mais popular da Rússia. Às 22h dos domingos, mais de metade da nação está colada à TV, vendo o programa da rede NTV.
Há um certo consenso -inclusive entre os responsáveis pelo programa- de que as desconcertantes estrelas do show entrarão em colisão contra quem quer que detenha o poder no Kremlin.
"Queremos chegar ao limite da liberdade de expressão e mostrar isso aos outros", disse Grigory Lyubomirov, roteirista e diretor.
"Vivi por dez anos com liberdade de expressão aqui. Não quero que volte a ser o que era", disse.
"Kukly" normalmente testa esse limite. A televisão norte-americana pode estar saturada com sexo e violência, mas duvida-se que as corporações nova-iorquinas tenham coragem suficiente para voltar a veicular seus programas satíricos mais memoráveis.
As tiradas feitas pelo "Kukly" sobre o "charme" dos políticos russos, desde sadomasoquismo a violação da virgindade, não podem ser plenamente descritas, ao menos não nesse espaço. Um episódio famoso, de 1995, malhou o salário mínimo de US$ 10, decretado pelo então presidente, Boris Ieltsin, e seu premiê, Viktor Tchernomirdin, mostrando-os como mendigos bêbados, revirando lixo atrás de comida.
Putin foi recentemente apresentado como um cirurgião, operando o corpo político russo, munido de uma machadinha e de um maçarico. Pessoas próximas ao presidente garantem que ele se enfureceu com outro episódio, uma adaptação de uma fábula alemã, no qual ele é apresentado como um menino raivoso e sozinho.
Não é surpresa que "Kukly" esteja prestes a "ser fritado" pelos políticos. Lyubomirov, um filósofo de 46 anos que frequentou a mesma universidade em São Petersburgo que Putin, afirmou que os produtores do programa costumavam receber telefonemas da mulher e das filhas do ex-presidente Ieltsin. Não para que as críticas ao dirigente fossem menos duras, mas para que ele não fosse apresentado como um fraco.
Entretanto Lyubomirov disse que a pressão sofrida pelo "Kukly" durante a era Ieltsin não chega aos pés da que o programa passou a enfrentar desde que Putin chegou ao poder, como premiê, em agosto do ano passado.


Tradução de Marcelo Bicalho Behar


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