São Paulo, sábado, 25 de julho de 2009

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Zelaya pisa em Honduras, mas depois recua

Exército hondurenho impede chegada de simpatizantes com os quais o presidente deposto esperava cruzar fronteira

Em povoado a cerca de 12 km da divisa com a Nicarágua, apoiadores que tentavam ir ao encontro de Zelaya foram detidos com bombas de gás

Orlando Sierra/France Presse
Cercado de apoiadores e jornalistas, Zelaya ergue os braços ao se aproximar do limite entre Nicarágua e Honduras

FABIANO MAISONNAVE
ENVIADO ESPECIAL À FRONTEIRA ENTRE NICARÁGUA E HONDURAS

O presidente deposto de Honduras, Manuel Zelaya, tentou ontem pela segunda vez voltar ao seu país, desta vez por terra. Chegou a cruzar a fronteira com a Nicarágua por alguns passos, mas foi impedido de prosseguir por milhares de policiais e militares, que bloquearam toda a região fronteiriça e impuseram um toque de recolher depois do meio-dia.
Foi um longo dia para Zelaya, deposto por militares e enviado para a Costa Rica há quase quatro semanas por tentar promover uma Assembleia Constituinte que Justiça e Congresso consideraram ilegal. Ele dormiu na cidade nicaraguense de Estelí, de onde saiu por volta das 10h. Ele mesmo dirigia um jipe branco modelo Wrangler. Com ele, viajavam o chanceler venezuelano, Nicolás Maduro, e dois seguranças.
Na metade do caminho até a fronteira, por volta das 11h, Zelaya parou num cruzamento, onde realizou uma improvisada entrevista coletiva no canteiro central. Ali, disse que poderia voltar por qualquer dos três países fronteiriços com Honduras -além da Nicarágua, El Salvador e Guatemala- e que tinha opções por terra, pelo ar ou pelo mar.
"Com a minha presença em Honduras, o golpe de Estado será revertido. O povo vai me rodear, e os soldados abaixarão as armas", afirmou.
No meio da entrevista, Zelaya recebeu uma ligação do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que desejou "boa sorte" e expressou sua preocupação com a tentativa de retorno. Na conversa, feita diante dos jornalistas, o mandatário deposto disse que "ia em paz".
"Obrigado pelo apoio, Lula, já estou chegando à fronteira", afirmou, antes de desligar.
A chegada à fronteira foi caótica. Uma pista da estrada estava bloqueada pelas dezenas de caminhões que esperavam cruzar até Honduras -a passagem está fechada desde anteontem.
Sob uma chuva cada vez mais forte, Zelaya desceu do carro a cerca de 200 metros da fronteira. "Hoje é um bom dia para morrer pela pátria", disse, enquanto se abrigava da chuva num precário bar de madeira.

Passando a corrente
Depois que a chuva cessou, por volta das 14h30 locais (17h30 de Brasília), Zelaya finalmente cruzou a fronteira -ao menos, por alguns passos.
Os poucos militantes que o acompanhavam fizeram um corredor humano para que o presidente deposto caminhasse alguns metros até a linha fronteiriça, demarcada por uma corrente. Ali, conversou com o tenente-coronel Luis Ricarte, comandante das dezenas de militares que formavam um cordão humano na rodovia.
Em seguida, o oficial se retirou, e os militares recuaram alguns metros. Zelaya então levantou a corrente com as mãos e entrou alguns passos em território hondurenho. Ficou ali por cerca de uma hora. Em seguida, voltou ao ponto anterior.
"Houve um acordo de respeitar as ligações que os militares farão [a seus superiores]", disse Zelaya, ao explicar por que não avançava. Mas Ricarte não voltou mais -segundo policiais, ele foi detido por ter falado com o presidente deposto.
Por volta das 17h, um grupo de cerca de cem simpatizantes chegou a pé depois de uma caminhada de sete horas pelas montanhas da região. "Vim para esperar nosso presidente Zelaya. Vê-lo, abraçá-lo e levá-lo ao posto dele", disse a dona de casa Carla Aguilar, 20.
Às 18h50, porém, Zelaya deixou a fronteira rumo à cidade nicaraguense de Ocotal, onde deveria passar a noite.
Na fronteira, havia mais jornalistas do que apoiadores de Zelaya, impedidos de chegar pelas oito barreiras de controle entre Tegucigalpa, a 175 km, e a fronteira. Os militares ainda fizeram barreiras de terra e de pedra em vários pontos da via.
No povoado de El Paraíso, a cerca de 12 km da fronteira, cerca de mil manifestantes foram impedidos de avançar por policiais, que usaram gás lacrimogêneo e foram atacados com paus e pedras. Ao menos três policiais e três manifestantes se feriram -um deles por um tiro.
Na primeira tentativa de Zelaya voltar ao país, no dia 5, o Exército hondurenho impediu o pouso de seu avião em Tegucigalpa. Na ocasião, confronto entre apoiadores do presidente deposto e forças de segurança deixaram dois mortos, as únicas vítimas oficiais até aqui dos conflitos pós-golpe.


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