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Zelaya pisa em Honduras, mas depois recua
Exército hondurenho impede chegada de simpatizantes com os quais o presidente deposto esperava cruzar fronteira
Em povoado a cerca de 12 km da divisa com a Nicarágua, apoiadores que tentavam ir ao encontro de Zelaya foram detidos com bombas de gás
Orlando Sierra/France Presse
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Cercado de apoiadores e jornalistas, Zelaya ergue os braços ao se aproximar do limite entre Nicarágua e Honduras
FABIANO MAISONNAVE
ENVIADO ESPECIAL À FRONTEIRA ENTRE
NICARÁGUA E HONDURAS
O presidente deposto de
Honduras, Manuel Zelaya, tentou ontem pela segunda vez
voltar ao seu país, desta vez por
terra. Chegou a cruzar a fronteira com a Nicarágua por alguns passos, mas foi impedido
de prosseguir por milhares de
policiais e militares, que bloquearam toda a região fronteiriça e impuseram um toque de
recolher depois do meio-dia.
Foi um longo dia para Zelaya,
deposto por militares e enviado
para a Costa Rica há quase quatro semanas por tentar promover uma Assembleia Constituinte que Justiça e Congresso
consideraram ilegal. Ele dormiu na cidade nicaraguense de
Estelí, de onde saiu por volta
das 10h. Ele mesmo dirigia um
jipe branco modelo Wrangler.
Com ele, viajavam o chanceler
venezuelano, Nicolás Maduro,
e dois seguranças.
Na metade do caminho até a
fronteira, por volta das 11h, Zelaya parou num cruzamento,
onde realizou uma improvisada entrevista coletiva no canteiro central. Ali, disse que poderia voltar por qualquer dos
três países fronteiriços com
Honduras -além da Nicarágua, El Salvador e Guatemala-
e que tinha opções por terra,
pelo ar ou pelo mar.
"Com a minha presença em
Honduras, o golpe de Estado
será revertido. O povo vai me
rodear, e os soldados abaixarão
as armas", afirmou.
No meio da entrevista, Zelaya recebeu uma ligação do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que desejou "boa sorte" e
expressou sua preocupação
com a tentativa de retorno. Na
conversa, feita diante dos jornalistas, o mandatário deposto
disse que "ia em paz".
"Obrigado pelo apoio, Lula, já
estou chegando à fronteira",
afirmou, antes de desligar.
A chegada à fronteira foi caótica. Uma pista da estrada estava bloqueada pelas dezenas de
caminhões que esperavam cruzar até Honduras -a passagem
está fechada desde anteontem.
Sob uma chuva cada vez mais
forte, Zelaya desceu do carro a
cerca de 200 metros da fronteira. "Hoje é um bom dia para
morrer pela pátria", disse, enquanto se abrigava da chuva
num precário bar de madeira.
Passando a corrente
Depois que a chuva cessou,
por volta das 14h30 locais
(17h30 de Brasília), Zelaya finalmente cruzou a fronteira
-ao menos, por alguns passos.
Os poucos militantes que o
acompanhavam fizeram um
corredor humano para que o
presidente deposto caminhasse alguns metros até a linha
fronteiriça, demarcada por
uma corrente. Ali, conversou
com o tenente-coronel Luis Ricarte, comandante das dezenas
de militares que formavam um
cordão humano na rodovia.
Em seguida, o oficial se retirou, e os militares recuaram alguns metros. Zelaya então levantou a corrente com as mãos
e entrou alguns passos em território hondurenho. Ficou ali
por cerca de uma hora. Em seguida, voltou ao ponto anterior.
"Houve um acordo de respeitar as ligações que os militares
farão [a seus superiores]", disse
Zelaya, ao explicar por que não
avançava. Mas Ricarte não voltou mais -segundo policiais,
ele foi detido por ter falado com
o presidente deposto.
Por volta das 17h, um grupo
de cerca de cem simpatizantes
chegou a pé depois de uma caminhada de sete horas pelas
montanhas da região. "Vim para esperar nosso presidente Zelaya. Vê-lo, abraçá-lo e levá-lo
ao posto dele", disse a dona de
casa Carla Aguilar, 20.
Às 18h50, porém, Zelaya deixou a fronteira rumo à cidade
nicaraguense de Ocotal, onde
deveria passar a noite.
Na fronteira, havia mais jornalistas do que apoiadores de
Zelaya, impedidos de chegar
pelas oito barreiras de controle
entre Tegucigalpa, a 175 km, e a
fronteira. Os militares ainda fizeram barreiras de terra e de
pedra em vários pontos da via.
No povoado de El Paraíso, a
cerca de 12 km da fronteira,
cerca de mil manifestantes foram impedidos de avançar por
policiais, que usaram gás lacrimogêneo e foram atacados com
paus e pedras. Ao menos três
policiais e três manifestantes se
feriram -um deles por um tiro.
Na primeira tentativa de Zelaya voltar ao país, no dia 5, o
Exército hondurenho impediu
o pouso de seu avião em Tegucigalpa. Na ocasião, confronto
entre apoiadores do presidente
deposto e forças de segurança
deixaram dois mortos, as únicas vítimas oficiais até aqui dos
conflitos pós-golpe.
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