São Paulo, domingo, 25 de agosto de 2002

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Negócios norteavam diplomacia americana

DA REDAÇÃO

As comunicações entre o Departamento de Estado e a Embaixada dos EUA em Buenos Aires durante o período da "guerra suja" na Argentina revelam que ideologia e negócios caminhavam lado a lado entre as prioridades da diplomacia americana.
Enquanto parte dos documentos deixa claro os esforços de Washington para obter o apoio argentino contra a União Soviética, dentro do espectro da Guerra Fria, dezenas de telegramas demonstram o empenho dos diplomatas para preservar os interesses corporativos americanos no país.
Em alguns casos, as fronteiras entre o poder público do governo dos EUA e o poder privado de suas corporações pareciam inexistir.
Em fevereiro de 1981, por exemplo, o secretário de Estado Alexander Haig se encontrou com Henry Ford 2º, neto e herdeiro do fundador da indústria automotiva Ford. Não se tratava apenas de um evento social: o empresário se preparava para uma viagem de negócios a Brasil, Argentina e Uruguai. Havia agendado encontros com os presidentes desses três países.
Haig recebera do embaixador americano em Buenos Aires um relatório sobre o estado das relações EUA-Argentina naquele momento e uma lista de assuntos do interesse estratégico que deveria relatar a Ford, para que este pudesse, por sua vez, discutir com o presidente argentino.
Assim, o empresário embarcou para Buenos Aires encarregado de passar os seguintes recados: "Nós [os EUA" esperamos melhorar as relações em todos os campos; buscamos maior cooperação do governo argentino em assuntos Leste-Oeste [Guerra Fria", como o embargo parcial de grãos; avanços nos direitos humanos continuam a ser importantes, mas serão perseguidos de forma menos abrasiva".
Enquanto o empresário fazia avançar a agenda diplomática, os diplomatas defendiam os seus interesses empresariais. Numa "análise da situação política com relação à crise militar", redigida em setembro de 1975 pela embaixada na Argentina, o autor explica "por que os EUA devem se importar" com a crise que levaria o país à ditadura militar.
"Os EUA têm importantes interesses na Argentina. Os mais tangíveis estão na forma de US$ 1,5 bilhão que temos aqui em investimentos privados", relata o texto.
A defesa desses dólares se refletia também na preocupação dos funcionários do Departamento de Estado com a segurança dos executivos de grandes empresas americanas como a Ford e a Chrysler, alvos de ataques e ameaças dos grupos armados de esquerda.
Um memorando interno da embaixada americana relata, por exemplo, os detalhes do assassinato, em 1975, de Jorge Kenny, um argentino que era diretor de marketing da Chrysler. "Kenny, que tomava café da manhã, foi metralhado através de uma grande janela. (...) Não foi deixado nenhum indício sobre qual organização foi responsável." (MS)


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