São Paulo, sexta-feira, 25 de agosto de 2006

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Greve de professores vira revolta social no México

Prédios públicos, emissoras de rádio e até o Legislativo local estão ocupados

Repressão policial e recusa do governador a aumentar salários inflamam greve que acontece no segundo Estado mais pobre do país


Ulises Ruiz/Efe
Silvio Rojas, membro da Assembléia Popular do Povo de Oaxaca, é ferido por repressão policial em protesto que dura 90 dias


RAUL JUSTE LORES
DA REPORTAGEM LOCAL

Uma greve de professores no Estado de Oaxaca, sul do México, transformou-se na mais violenta revolta popular do país desde o levante liderado pelo Subcomandante Marcos em 1994 em Chiapas.
Professores, sindicalistas, camponeses e um pequeno grupo guerrilheiro, a Frente Revolucionária Popular, criaram a Assembléia Popular do Povo de Oaxaca e ocuparam os principais prédios públicos da capital do Estado, também chamada Oaxaca (pronuncia-se "oarraca"). O movimento exige a renúncia do governador e mais recursos para o Estado.
O conflito só comprova a tensão social do país, que ainda discute quem venceu a eleição presidencial de 2 de julho. A esquerda denunciou fraudes.
Mais de 70.000 professores entraram em greve em maio, quando há paralisações anuais por conta da renegociação salarial. Só que o governador não concedeu nenhum aumento e ordenou uma violenta repressão para desalojá-los da praça principal de Oaxaca.
Mais de 1.000 policiais atacaram os grevistas acampados com gás lacrimogêneo em 15 de junho. No último mês, os manifestantes ocuparam dez estações de rádio da cidade, além da sede do governo e da Assembléia Legislativa. Governador e deputados usam sedes provisórias.
O Estado é bastião do Partido Revolucionário Institucional (PRI), que governou o México de forma autoritária por 71 anos. O governador é um caudilho que também teve sua vitória em 2 de julho contestada.
Os dois candidatos que ainda disputam a vitória na eleição presidencial, o conservador Felipe Calderón e o esquerdista Andrés Manuel López Obrador, aproveitam o conflito.
Calderón fala da violência e da manipulação dos movimentos sociais pela esquerda, enquanto López Obrador aponta a insensibilidade do governo e a repressão aos professores.
Até agora, o presidente Vicente Fox se negou a intervir, dizendo que se tratava de um problema "local". Agora, uma inevitável intervenção pode gerar mais violência.

Miséria indígena
O protesto dos professores ganhou o apoio imediato em um Estado miserável. Oaxaca vive da agricultura e, mais recentemente, do turismo. Dos 32 estados mexicanos, é o segundo pior em praticamente todos os indicadores sociais, acima apenas de Chiapas.
Cerca de 20% dos 3,3 milhões de habitantes é indígena -80% dos indígenas vivem da agricultura de subsistência e 60% das casas do Estado são de piso batido ( em todo o México, o índice é de 15%).
"Há muita raiva e descontentamento em um Estado com problemas ancestrais", diz o produtor cultural Ignacio Toscano, que dirige uma ONG de formação musical em Oaxaca. "Nenhum governo fez nada pelos mais pobres daqui, principalmente para os indígenas."

Jóia colonial
A revolta tomou Oaxaca, que é uma das mais belas cidades turísticas do país. A 465 quilômetros da Cidade do México, foi declarada Patrimônio Cultural da Humanidade pela Unesco. Além das construções dos séculos 16, 17 e 18, um conjunto de pirâmides zapotecas fica no vizinho Monte Albán.
Nos últimos anos, um movimento liderado pelo artista plástico Francisco Toledo conseguiu restaurar todo o centro colonial, que ganhou diversos ateliês, hotéis cinco estrelas instalados em antigos conventos e dezenas de galerias de arte e artesanato. Um destino para boêmios e intelectuais que não passam por Cancún.
Agora, vários prédios coloniais estão pichados com dizeres como "Tourists, go home" e "Oaxaca é anticapitalista".


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