|
Texto Anterior | Índice | Comunicar Erros
Cinema do Irã sofre com censura oficial
Maior cerceamento do governo nos últimos anos vem prejudicando os talentosos e renomados cineastas do país
Política oficial mudou em favor de repressão a filmes com pretensões intelectuais e incentivo a dramas sem conteúdo
MONAVAR KHALAJ
DO "FINANCIAL TIMES", EM TEERÃ
O cinema de arte iraniano
conquistou prêmios no mundo todo, e sua sensibilidade
realista e linguagem rica tiveram elogios generalizados.
Diretores como Abbas Kiarostami ("Dez" e "Gosto de
Cereja") e Jafar Panahi ("O
Balão Branco" e "Ouro Carmim") foram celebrados e
honrados com prêmios em
festivais como o de Cannes.
Mas, em seu país, cineastas
e críticos estão pessimistas
quanto ao futuro do setor. A
política do Estado parece ter
mudado em favor da repressão aos filmes com quaisquer
pretensões intelectuais, dizem, e promove no lugar dramas leves e despretensiosos.
A situação não é favorecida
pela ampla disponibilidade
de DVDs piratas ou legítimos
de todos os grandes sucessos
nacionais e internacionais.
Nas salas de cinema, os filmes estrangeiros em geral estão proibidos, e só os nacionais que passam pela censura
encontram espaço.
Nos últimos cinco anos, comédias se tornaram os maiores sucessos de bilheteria. No
atual ano do Irã, iniciado em
21 de março, a lista é comandada por "Poopak Va Mash
Mashalah" e "O Filho de
Adão e a Filha de Eva".
No primeiro, Poopak é uma
jovem que se criou no Canadá
e está visitando a tia no Irã. "O
Filho de Adão e a Filha de
Eva" é uma comédia romântica na qual casal de advogados divide escritório.
A questão é determinar se
esse tipo de produção bastará
para manter apoio ao cinema
que alimentava talentos como Kiarostami e Panahi.
Segundo a ONG Associação de Vídeo Doméstico, a
venda de ingressos de cinema
caiu de 81 milhões anuais em
89 a 8 milhões em 2009.
Os dois maiores sucessos
do ano não geraram mais de
10 bilhões de rial (US$ 952
mil) em bilheteria, de acordo
com veículos e blogs locais.
O filme iraniano de maior
bilheteria dos últimos anos
foi a comédia "Ekharijiha 2º",
ou "O Proscrito". A comédia é
a continuação de sucesso anterior e se passa entre presos
iranianos detidos no Iraque
nos anos 80.
Um blog reformista descreve esses filmes como "Khaliwood". "Khali" quer dizer
"tediosamente vazio".
Elham, 27, trabalha no setor privado e deixou de ir ao
cinema duas vezes por semana, como costumava. "Parei
de ir ao cinema há seis meses,
para não desperdiçar tempo e
dinheiro", diz, acrescentando
que bons filmes se tornaram
raros desde a posse do presidente Mahmoud Ahmadinejad, há cinco anos.
DEPENDÊNCIA
Os cineastas iranianos dependem do governo porque
os roteiros precisam de aprovação do Ministério da Cultura para entrar em produção.
O cinema no país depende
em larga medida de fontes
privadas de financiamento.
Mas a censura é tão rigorosa
que potenciais investidores
temem financiar qualquer
coisa contenciosa ou meditativa, afirmam os críticos.
Diretores populares estão
praticamente impedidos de
obter financiamento. E os internacionalmente conhecidos enfrentam situação pior.
Kiarostami, Panahi e Baqman Qobadi só mostram seus
filmes no exterior. Panahi foi
detido por três meses neste
ano pelo apoio à oposição no
contestado pleito de 2009.
Mas alguns filmes mais incisivos escaparam à rede.
"Procurando Elly", de Ashgar Farhadi, que conquistou
o Urso de Prata no Festival de
Berlim, foi exibido em Teerã.
O filme retrata grupo de
iranianos que vai em férias
ao mar Cáspio. Enquanto
tentam manter os costumes
sociais, Elly, a mulher solteira, desaparece, um acontecimento que leva ao exame de
uma sociedade repressiva.
Mas isso é visto como insuficiente por muitos. O cineasta Hassan Fathi declarou há
dois meses que nem se queixava mais, pois "a esperança
de melhora desapareceu".
Tradução de PAULO MIGLIACCI
Texto Anterior: Pesquisador do Zimbábue espera mudança Índice | Comunicar Erros
|