São Paulo, segunda-feira, 25 de novembro de 2002

Próximo Texto | Índice

ÁFRICA OCIDENTAL

Líder muçulmano culpa governo pela situação de tensão; país acalma-se após a saída das candidatas a miss

Número de mortos na Nigéria chega a 215

DA REDAÇÃO

O número de mortos nos conflitos recentes na Nigéria já chegou a 215, segundo a Cruz Vermelha. Os choques deixaram ainda mais de 1.100 feridos, depois que milhares de muçulmanos começaram, quarta-feira, a sair às ruas em Kaduna (norte) e em Abuja, a capital, exigindo o cancelamento do concurso de Miss Mundo, marcado para o próximo dia 7, e a prisão de jornalistas responsáveis por um artigo jocoso em relação ao profeta Muhammad.
Segundo as autoridades nigerianas, a calma havia voltado ontem às regiões tumultuadas. O concurso foi transferido para Londres e os jornalistas foram presos.
Os organizadores do concurso Miss Mundo e o governo nigeriano atribuíram os distúrbios à reação a um artigo do jornal "This Day", em que se dizia que "até o profeta Muhammad se casaria com uma das belas mulheres".
Mas Nabiu Ahmed, secretário do Conselho Nacional da Charia (lei islâmica) na Nigéria, disse que os muçulmanos estavam furiosos porque os preparativos para o concurso começaram durante o mês sagrado do Ramadã.
"Suspender o concurso de beleza na Nigéria e transferi-lo para outro lugar foi uma sábia decisão, que já deveria ter sido tomada há mais tempo. Mas é uma desgraça que o governo só tenha atendido ao desejo do povo depois que ocorreram esses massacres", declarou Ahmed.
Indagado sobre o impacto causado pelo artigo publicado no "This Day", Ahmed respondeu que "o concurso foi a origem dos distúrbios, porque, se esse controvertido evento não tivesse sido programado, jamais teriam escrito esse artigo blasfematório".
Os jornalistas Simon Kolawole e Isioma Daniel, responsáveis pela edição do "This Day", foram presos no sábado.
Ahmed disse ainda que a chegada das candidatas no mês sagrado [de jejum, orações e abstinência sexual para os muçulmanos" havia aumentado as tensões e atacou o governo nigeriano por financiar esse tipo de espetáculo.
"É verdade que houve concursos na Nigéria durante quase 40 anos, mas nunca nos preocupamos como muçulmanos, pois eram organizados por entidades privadas. Mas, desta vez, o evento foi organizado com ajuda do governo, que usou dinheiro dos impostos, e além disso durante o Ramadã, o que é inaceitável", concluiu o líder religioso.
Ahmed negou que a anulação do concurso vá prejudicar economicamente a Nigéria. "Se a política econômica que nos foi imposta pelo Fundo Monetário Internacional, pelo Banco Mundial e pelas instituições financeiras internacionais não podem ajudar a atrais investimentos externos, é impossível que uma exibição de nudez consiga essa proeza."
Os organizadores do concurso negaram, porém, que tivessem recebido verba do governo nigeriano, mas foram estreitamente associados à administração do presidente Olusegun Obasanjo.
O concurso recebeu o patrocínio do governo, dos Estados e da companhia de petróleo estatal. O governo também ofereceu medidas de segurança especiais, e a organização de caridade da mulher do presidente nigeriano se beneficiou com as cerimônias de gala.
Na manhã de ontem, depois que as misses haviam deixado o país, a normalidade voltou à cidade de Kaduna, cidade predominantemente muçulmana onde os confrontos foram mais acirrados. Ironicamente, o maior número de vítimas é de muçulmanos.
Famílias se aventuraram timidamente a sair de suas casas para comprar comida nos mercados desabastecidos.
Os combates destruíram pelo menos 22 igrejas cristãs e oito mesquitas, disse Shehu Sani, membro do Congresso dos Direitos Civis baseado em Kaduna.
Dez hotéis também foram semidestruídos, informou Sani.


Com agências internacionais.


Próximo Texto: Miss mundo: Aliviadas, candidatas chegam a Londres
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.