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São Paulo, domingo, 26 de janeiro de 2003

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ISRAEL VOTA

Para esta terça, pesquisas prevêem vitória de Sharon, derrocada trabalhista e aprofundamento das divisões internas

Eleição fragmenta a política israelense

Governo de Israel/France Presse - 8.jan.2003
O premiê Sharon observa fronteira entre Israel e Cisjordânia perto de Umm Al Fahm, norte do país


MARCELO STAROBINAS
DA REDAÇÃO

As eleições parlamentares de Israel, na terça-feira, devem ser um retrato da desilusão e das profundas divisões internas que marcam o país em mais um turbulento capítulo de sua história.
A violência ininterrupta do conflito com os palestinos, a crise econômica e até escândalos de corrupção nos mais altos círculos dão um gosto amargo à eleição. A abstenção promete ser grande.
Como nem o Likud (centro-direita) nem o Partido Trabalhista (centro-esquerda) conseguiram convencer os israelenses de que porão fim ao banho de sangue e trarão de volta a bonança econômica de tempos passados, muitos votarão em grupos sectários, aprofundando a fragmentação política do país.
As pesquisas de opinião prevêem pouca ou nenhuma alteração no equilíbrio de forças dentro do Knesset (Parlamento). O bloco de partidos de direita, liderado pelo Likud, deve sair vencedor.
O líder likudista e atual premiê, Ariel Sharon, é favorito para seguir à frente do governo -seu partido, dizem as pesquisas de opinião, passará das atuais 19 cadeiras para mais de 30.
O Partido Trabalhista, liderado pelo prefeito de Haifa, Amram Mitzna, é forte candidato a principal derrotado. Dono da maior bancada (26 deputados), as sondagens prevêem que manterá menos de 20 cadeiras.
Os trabalhistas arcam ainda com o ônus do fracassado processo de paz de Oslo com os palestinos. Após integrarem a coalizão do governo Sharon, não foram capazes de apresentar uma proposta alternativa convincente.
"A tentativa de Mitzna de projetar uma imagem mais de esquerda e pró-paz não funcionou", opina Gabriel Ben-Dor, diretor do Centro de Estudos de Segurança Nacional, da Universidade de Haifa. "O debate sobre a questão palestina não é intenso porque, na visão dos políticos israelenses, não há muito a fazer."
O eleitorado se preocupa com o terrorismo e é majoritariamente a favor de algum tipo de negociação para solucionar o conflito que, desde setembro de 2000, já matou quase 700 israelenses e mais de 1.700 palestinos.
O tema, porém, não trará alterações na composição do Parlamento. Os israelenses parecem dispostos a manter a linha defendida por Sharon e por seu chanceler, Binyamin Netanyahu. Ou seja, negam-se a tratar com o líder palestino, Iasser Arafat; querem nova liderança e reformas democráticas na Autoridade Nacional Palestina e exigem um cessar-fogo palestino como condição para iniciar o diálogo.

Questões internas
São as questões de caráter doméstico que devem trazer algumas novidades ao cenário político de Israel. A Intifada e o desaquecimento da economia mundial tiveram efeitos nefastos. O país tem hoje um índice 10,5% de desemprego. E pode viver recessão pelo terceiro ano seguido -o Produto Interno Bruto (PIB) diminuiu em 1% em 2002, e as previsões são semelhantes para este ano.
"Como no Brasil, em Israel as verdadeiras questões para as pessoas são econômicas e sociais", diz Ben-Dor. "A imprensa internacional tem interesse na questão palestina, mas, para os israelenses, o que realmente conta é quanto dinheiro estão ganhando, o custo de vida, esse tipo de coisa."
Uma das consequências eleitorais desse aperto de cintos é a fragmentação social e partidária. Cada grupo, seja ele étnico, religioso ou social, tenta garantir para si o máximo de benefícios possíveis. Ganha força o que os sociólogos convencionaram chamar de "as novas tribos de Israel".
A eleição de terça deve consolidar a presença no Parlamento de "tribos" já consagradas: os "russos" (representantes do mais de 1 milhão de imigrantes da ex-URSS), os judeus ultra-ortodoxos (divididos em "subtribos" ashkenazim, oriundas do Leste Europeu, e sefaradim, vindas do mundo árabe), os árabes (20% da população, que se diz cidadã de segunda classe), os seculares e os colonos dos territórios ocupados.
A miríade de propostas e interesses em jogo na campanha -quase 30 partidos estão concorrendo- foi engrossada por candidatos nanicos que deram um colorido bizarro ao horário eleitoral na TV local. Entre eles, figuram um movimento por um governo sem políticos, defensores dos direitos dos taxistas e um partido pela legalização da maconha.
A já tradicional disputa entre os judeus ortodoxos e os israelenses seculares é um dos temas dominantes da atual campanha. Com uma plataforma baseada no repúdio à excessiva influência dos religiosos em assuntos orçamentários e sociais, o partido Shinui pode se consolidar como uma das principais forças no Parlamento.

Likud x trabalhistas
Como não bastasse a diversidade de opiniões, Mitzna, o líder trabalhista, adotou uma posição ousada: prometeu que, após o pleito, não aceitará um convite de Sharon para a formação de uma nova coalizão de união nacional.
Essa divisão deve complicar ainda mais as já duras negociações para a composição de governo. Mitzna, dizem os analistas, cometeu um erro estratégico ao fechar as portas ao Likud.
"Isso foi estúpido, porque a maioria dos israelenses quer a união nacional", afirma Avraham Diskin, professor de ciência política da Universidade Hebraica de Jerusalém. "A maioria acha a divisão interna muito perigosa num momento difícil como esse."
Se as urnas confirmarem as previsões das pesquisas, e o Partido Trabalhista tiver mesmo uma derrota esmagadora, a história pode tomar outros rumos, destaca Gabriel Ben-Dor.
"Se o partido sair mal das urnas, Mitzna não estará mais em condições de ditar as diretrizes e impor sua vontade", argumenta. Nesse caso, outros deputados trabalhistas -Shimon Peres e Binyamin Ben Eliezer são nomes fortes- assumiriam o comando partidário. E, possivelmente, aceitariam um convite de Sharon para voltar ao governo.


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