São Paulo, terça-feira, 26 de novembro de 2002

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AMÉRICA LATINA

Gutiérrez compara golpe que liderou à Revolução Francesa e credita vitórias dele e de Lula a desejo de mudança

Eleito no Equador promete "união nacional"

Guillermo Granja/Reuters
O coronel Lucio Gutiérrez, presidente eleito do Equador, concede entrevista coletiva em Quito depois da divulgação dos resultados


FRANCESC RELEA
DO "EL PAÍS", EM QUITO

O coronel esquerdista Lucio Gutiérrez, 45, rejeita o rótulo de golpista. Para o presidente eleito do Equador, o movimento que liderou em janeiro de 2000, contra o presidente Jamil Mahuad, não foi um golpe de Estado. "Um golpe de Estado é feito pelas elites políticas, militares ou econômicas", diz. "Aqui o povo se rebelou", acrescenta, comparando o movimento à Revolução Francesa.
Quanto às frequentes comparações com o presidente da Venezuela, Hugo Chávez, Gutiérrez faz questão de marcar as diferenças. Ele promete fazer um governo de união nacional, com a participação de "empresários, banqueiros e movimentos sociais".
Gutiérrez, que recebeu 54,4% dos votos no segundo turno da eleição presidencial, anteontem, contra 45,6% do seu adversário, o milionário Álvaro Noboa, diz que sua eleição, assim como a de Lula, no Brasil, representa o desejo de mudança da população. "Temos sido governados por políticos que não entenderam o verdadeiro conceito de democracia. Esqueceram da população e criaram classe privilegiadas", diz. "O povo se cansou dos mesmos de sempre."

Pergunta - O que o sr. sente quando o chamam de golpista?
Lucio Gutiérrez -
Não sinto nada, porque não sou golpista. O que aconteceu não foi um golpe de Estado. Um golpe é feito pelas elites políticas, militares ou econômicas. Aqui o povo se rebelou, e os militares tinham duas opções: massacrar esse povo ou se unir a ele. Um grupo de militares decidimos nos unir ao povo, porque tinha razão e porque o artigo 4º da nossa Constituição garante o direito dos povos de se rebelar contra governos opressivos. A corrupção, a injustiça e a impunidade são formas de opressão.

Pergunta - Mas o presidente Mahuad foi derrubado por armas e nunca apresentou sua renúncia. Isso não foi um golpe de Estado?
Gutiérrez -
Então a Revolução Francesa também foi um golpe de Estado, porque naquela época a monarquia era o governo legal. O povo se rebelou e tirou a monarquia. Em vez de um golpe, acho que é um orgulho para os franceses e um exemplo para o mundo.

Pergunta - Sua trajetória até a Presidência é parecida à de Hugo Chávez na Venezuela?
Gutiérrez -
É possível que haja algum paralelismo, mas temos diferenças notáveis de personalidade. Eu falo em buscar consensos, vou governar com os empresários, os banqueiros e os movimentos sociais.

Pergunta - O sr. se sente parte de um movimento novo na política da América Latina, como o caso de Lula, no Brasil?
Gutiérrez -
Acho que na América Latina temos sido governados por políticos que não entenderam o verdadeiro conceito de democracia. Esqueceram da população e criaram classes privilegiadas. Esse povo se cansou dos mesmos de sempre.

Pergunta - O sr. manterá a base militar americana no porto equatoriano de Manta?
Gutiérrez -
Respeitaremos todos os convênios e tratados firmados. Na ocasião, eu me opus à concessão da base de Manta. Enquanto se respeitar o acertado e a base for utilizada para combater o narcotráfico e não para a guerra na Colômbia, não haverá razões para revisar o acordo.

Pergunta - A base militar viola a soberania do Equador?
Gutiérrez -
É óbvio, a soberania é inalienável. Se existe uma base americana no Equador, porque não poderia haver uma base equatoriana nos EUA?


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