São Paulo, domingo, 26 de novembro de 2006

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Símbolo de San Francisco, Golden Gate deve ganhar esquema anti-suicídios

VINÍCIUS QUEIROZ GALVÃO
DE NOVA YORK

Fazia sol em 19 de setembro de 2000 quando Kevin Hines, 24, foi de ônibus à ponte Golden Gate, em San Francisco. Ao ouvir vozes interiores, andou até o mirante, subiu no parapeito e pulou. Sobreviveu. Desde a inauguração da obra, em 1937, cerca de 1.600 suicidas se atiraram dos 80 metros em direção à baía, altura equivalente a um prédio de 26 andares. Até hoje, apenas 12 não morreram.
Um dos mais importantes pontos turísticos dos EUA, a Golden Gate registra hoje o maior índice de suicídios do mundo. Para conter a estatística, a prefeitura estuda a construção de barreiras de proteção, ao custo de US$ 25 milhões (R$ 54 milhões).
Embora pareça politicamente correto, o projeto gera discussões e criou uma corrente de moradores, políticos, engenheiros e médicos contrários. Os argumentos:
1) As grades descaracterizariam a arquitetura Art Déco original da ponte;
2) Os suicidas migrariam para outras pontes na região da baía de São Francisco, como a Bay Bridge;
3) Apenas 3% das pessoas que se matam na cidade usam a ponte como método;
4) Os US$ 25 milhões, cuja origem ainda é desconhecida, poderiam ser mais bem aplicados, como em programas educativos.
"Garanto que se houvesse proteção eu não teria tentado me matar. O acesso é muito fácil, e a vida vale mais do que a estética", disse Hines à Folha. Hoje, ele trabalha em campanhas e programas anti-suicídio de ONGs da cidade. Quebrou os tornozelos, seis costelas e deslocou duas vértebras na queda.

Aerodinâmica
Denis Mulligan, engenheiro da Highway and Transportation District, agência que administra a Golden Gate, explica que as obras mudariam a aeração e a aerodinâmica da ponte, o que prejudicaria a estrutura de 2,7 km.
"As mudanças trariam um impacto imenso. É como modificar as asas de um avião. Parece nada, mas o desgaste é enorme", diz.
Só o estudo de impacto ambiental custou US$ 2 milhões (R$ 4,23 milhões) à concessionária, que calcula US$ 70 milhões (R$ 151 milhões) em custos de manutenção nos próximos cinco anos.
Resultado: pedágio mais caro, fim do serviço de ônibus e demissão de todos os funcionários que trabalhavam na ponte. Uma parceria com a iniciativa privada deve ser aprovada em troca de publicidade em breve.

Cinema
Os suicídios da Golden Gate viraram coisa de cinema. Em 2004, o diretor Eric Steel gravou 20 saltos na ponte. O registro é a base do documentário "The Bridge", lançado neste ano. O filme, exibido recentemente na 30ª Mostra Internacional de São Paulo, ouve depoimentos de familiares e amigos dos suicidas para tentar entender seus motivos.
Por mês, duas pessoas se jogam da Golden Gate, segundo a Highway and Transportation District. Em 2005, 23 morreram, e outros 76 foram impedidos de pular por policiais que faziam vigilância na região. Dois antigos pontos famosos de suicídio, o Empire State Building e o Rockefeller Center, em Nova York, reduziram para zero as mortes instalando barreiras de vidro.


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