São Paulo, domingo, 26 de novembro de 2006

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Especialistas vêem aumento da islamofobia no continente

DE LONDRES

Em meio à crescente controvérsia sobre a integração muçulmana e de imigrantes na Europa, a Folha ouviu durante a última semana um grupo de especialistas para analisar a questão dos pontos de vista político e social. Leia a seguir suas principais conclusões. (MAC)

 

FOLHA - Os governos europeus estão radicalizando suas políticas contra imigrantes e muçulmanos?
DAUD ABDULLAH, vice-presidente do Conselho Muçulmano Britânico
- É importante reconhecer que a islamofobia está se espalhando rapidamente pela Europa, e isso tem suas raízes no preconceito histórico contra imigrantes. Muitos políticos estão tentando utilizar isso a seu favor -no Reino Unido, o governo trabalhista concluiu que não tem mais o apoio da comunidade muçulmana e começou a buscar os votos conservadores e de radicais de direita.
MILENA BUYUM, coordenadora da Assembléia Nacional Contra o Racismo - As organizações fascistas de extrema-direita estão avançando na Europa -elas têm representação no Parlamento Europeu e influenciam políticas de governo em diversos países-, e os partidos mais ao centro estão assumindo algumas das bandeiras desses movimentos. Isso é preocupante, mas há oposição a esse movimento, há políticos dizendo que esse ataque é inaceitável, que é racismo.
STEPHEN CASTLES, professor da Universidade de Oxford, especialista em migração internacional e sociedades multiculturais na Europa - A preocupação com segurança está virando hostilidade em relação aos imigrantes e muçulmanos, apesar de a maioria deles não ter relação nenhuma com extremistas.

FOLHA - O multiculturalismo torna as sociedades menos integradas?
STEPHEN CASTLES
- Esse argumento culpa a vítima. Os imigrantes sofrem com o racismo, não ganham as condições para se integrar e acabam sendo excluídos sob o argumento de que sua cultura não é compatível com a européia. O medo dos muçulmanos e das diferenças culturais é resultado da falha em conseguir igualdade para os imigrantes.
TREVOR PHILLIPS, chefe da Comissão para a Igualdade Racial do governo britânico - O conceito de multiculturalismo está datado. Reconhecer as diferenças é importante, mas não se pode aceitar tudo por causa disso. Se quisermos obter os benefícios da diversidade, não podemos ser complacentes. Precisamos integrar essa sociedade multiétnica, ou haverá mais fragmentação.
MILENA BUYUM - Dizer que enfrentamos os problemas atuais porque valorizamos as diferenças culturais é inverter completamente a questão. O multiculturalismo oferece a melhor solução para uma sociedade coesa, em que as pessoas podem escolher ser como quiserem, em vez de serem forçadas a largar suas culturas, línguas e identidades.

FOLHA - É possível integrar muçulmanos à cultura ocidental?
DAVID EDGAR, dramaturgo e membro da Sociedade Real de Literatura do Reino Unido
- Não creio que a questão possa ser polarizada assim. Essa idéia de que direitos humanos e das minorias é parte da tradição ocidental desde o Iluminismo é um equívoco. Diversos países europeus não têm um bom registro em termos de direitos humanos nas últimas décadas. O argumento de que temos uma coisa maravilhosa e imutável chamada civilização ocidental que está sendo confrontada por outra coisa fixa chamada de cultura islâmica não é verdadeira.
DAUD ABDULLAH - Os muçulmanos estão na Europa há mais de um século, os europeus têm contato com o islã há mais de mil anos. Dizer que não podemos viver com os ocidentais é uma falácia.
STEPHEN CASTLES - Certamente há valores diferentes. Pode-se argumentar que os valores muçulmanos são mais conservadores, centrados no núcleo familiar, que vêm de uma sociedade pré-industrial. Numa sociedade democrática, as pessoas devem ter direito de manter sua cultura, além de terem a oportunidade de participar como cidadãos.


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