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EX-IMPÉRIO
Professor analisa entrega de Macau à China
Macau marca fim
de era em Portugal
FRANÇOIS MUSSEAU
do "Libération"
Portugal cometeu "erros enormes" em seu processo de descolonização. Mas o fim do domínio
português em Macau, na semana
passada, foi mais digno do que a
saída portuguesa da África e marcou o fim de uma era para Portugal, diz Eduardo Prada Coelho,
editorialista do diário português
"Público" e professor de Ciências
da Comunicação na Nova Universidade de Lisboa.
Em entrevista ao "Libération",
ele analisa o impacto do fim da
era colonial portuguesa.
Pergunta - Com a devolução
de Macau, o império colonial
português deixa de existir. Como isso está sendo visto?
Eduardo Prada Coelho - Para
as massas, com perfeita indiferença. Os laços com Macau se tornaram muito fracos.
É certo que as cerimônias oficiais talvez tenham causado certo
pesar. Mas a devolução causou,
mais do que tudo, a satisfação de
termos negociado o processo de
forma prudente e ponderada.
Depois do drama de Timor Leste, vivido aqui de maneira intensa, isso é um consolo. É uma partida digna e pacífica. E Portugal é
hoje menor do que nunca. É o final de um ciclo, uma longa página
de nossa História agora fechada.
Em Portugal, é hora de fechar o
balanço da descolonização, muitas vezes difícil, cujos problemas
estão ainda frescos na memória.
Para nós, a grande dor foi a perda das principais colônias (Moçambique, Angola, Guiné-Bissau,
Cabo Verde, Timor Leste) logo
depois da Revolução dos Cravos,
em 1974.
Partimos precipitadamente,
sem atentar à situação que deixamos. Entre a anexação de Timor
pela Indonésia e a sangrenta guerra civil de Angola, não podemos
dizer que temos um retrospecto
brilhante. Erros enormes foram
cometidos, isso é inegável. Mas,
na época, tudo transcorreu muito
rápido. O aspecto positivo é a integração dos "retornados", os
imigrantes de Angola e de Moçambique. Voltando a Portugal,
eles logo se adaptaram, e desempenham um papel importante na
esfera política, no mundo das empresas ou na mídia.
Pergunta - Os portugueses
aprenderam a lidar com a descolonização?
Prada Coelho - Acredito que
não haverá jamais essa reconciliação. Temos um pacto de silêncio
tácito. Depois da ditadura Salazar,
Mário Soares, o "pai" da transição
democrática, fez uma escolha decisiva para Portugal: entre o papel
de vanguarda no Terceiro Mundo
e o de retaguarda na Europa, optou pelo segundo.
Isso implica esquecer muita coisa. Mas os acontecimentos de Timor provocaram aqui, de modo
emocional e não ideológico, uma
catarse coletiva sem precedentes.
Não só a solidariedade portuguesa por Timor, fortemente ressaltada pela mídia, nos permitiu liberar o peso que tínhamos na
consciência, mas também desempenhar um papel atuante que nos
deu motivo de orgulho.
Estamos convencidos, em Portugal, de que as grandes manifestações populares e o papel do primeiro-ministro Guterres junto a
Clinton provocaram a intervenção da ONU. Depois da impotência frente à tragédia angolana, por
fim pudemos nos sentir parte dos
protagonistas úteis, dos porta-estandartes da consciência mundial
perante o cinismo.
Pergunta - Que laços restam
com as colônias?
Prada Coelho - A descolonização agora ficou para trás, e creio
que hoje em dia é muito mais fácil
reforçar esses laços. No plano político, estamos começando.
Criou-se uma Comunidade dos
Países de Língua Portuguesa
(CPLP), que alguns vêem como
uma espécie de "Commonwealth
lusa". Ainda embrionária, essa
comunidade sediada em Lisboa
progride lentamente.
O principal obstáculo é que o
Brasil, um parceiro essencial que
se vê como grande potência, não
aderiu verdadeiramente à idéia.
Pode-se perceber a tendência claramente nas comemorações dos
500 anos do descobrimento brasileiro. Brasília se recusa a reconhecer Portugal como pai do país e
fala de influências "mistas".
No que concerne à cooperação
cultural, Portugal se esforça, mas
ficamos limitados por nossa fragilidade econômica. Além do patrimônio da língua e da religião, ainda restam laços afetivos muito
fortes. As campanhas de solidariedade para com as ex-colônias
funcionam bem. Por intermédio
da música e da literatura, sobretudo, eles estão muito presentes.
Isso pode parecer apenas circunstancial, mas em Angola ou
Cabo Verde temos muitos torcedores dos clubes de futebol portugueses como o Sporting de Lisboa
e o Benfica.
Pergunta - Portugal aceitou
que hoje é apenas um pequeno
país?
Prada Coelho - Com certeza. E,
aqui, todo mundo está consciente
da oportunidade histórica que a
Europa constitui. Os portugueses,
em seu conjunto, se orgulham
muito de fazer parte da Europa e
têm consciência daquilo que a
União Européia lhes dá em termos de infra-estrutura e de crescimento econômico.
Quanto à evolução histórica,
não esqueço jamais a frase de nosso grande escritor Fernando Pessoa, "depois das grandes descobertas, aos portugueses resta o desemprego".
Tradução de Paulo Migliacci
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