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DIREITOS HUMANOS
Para a ONG, ação nas prisões do país explora discurso da segurança, o mesmo que americanos usam no Iraque
Anistia diz que tortura cresce no Brasil
FREE-LANCE PARA A FOLHA, EM LONDRES
A ação dura das polícias estaduais, principalmente em São
Paulo e no Rio, levou a um aumento das violações de direitos
humanos, numa forma comparável aos abusos cometidos pelos
soldados americanos no Iraque,
tendo como pretexto a guerra ao
terrorismo.
A acusação foi feita ontem em
Londres pela Anistia Internacional, um dos mais influentes grupos de defesa de direitos humanos do mundo, na divulgação de
seu relatório anual, compilando
violações cometidas em 2003.
"Medidas de segurança adotadas pelos governos estaduais para
combater os elevados níveis de
criminalidade urbana continuaram a resultar num aumento das
violações de direitos humanos.
Milhares de pessoas, predominantemente homens jovens, pobres, negros ou pardos, foram
mortos em confrontos com a polícia", afirma o relatório.
"O que acontece no Brasil é exatamente o que acontece com relação à situação global. Há totalmente um paralelo", disse Tim
Cahill, responsável da Anistia pela
parte do relatório referente ao
Brasil. "Estamos vendo o uso do
discurso de segurança para justificar abusos e repressão. Um grupo
social está sendo punido de uma
forma geral, em lugar da punição
a grupos específicos", afirmou o
pesquisador.
Segundo a Anistia, da mesma
forma que soldados dos EUA torturaram detentos na prisão iraquiana de Abu Ghraib, em Bagdá,
houve um "contínuo aumento da
prática de tortura" em razão da
ação mais dura das polícias contra
integrantes de grupos como Comando Vermelho, no Rio, e Primeiro Comando da Capital
(PCC), em São Paulo.
"Os Estados estão implementando políticas de segurança pública altamente discriminatórias e
repressivas. A ação baseada na
violação aos direitos humanos
fundamentais não traz segurança", disse Cahill.
Autoridades estaduais, na polícia e no Judiciário, são também
apontadas como responsáveis pelo aumento da repressão a lideranças de sem-terra, com julgamentos com potencial político,
como o do líder José Rainha. Não
há comentários sobre a política
federal de reforma agrária.
Em parte, diz a ONG, a ação repressiva foi resultado de um "clamor na opinião pública por policiamento mais severo e por mais
medidas punitivas judiciais".
"Reconhecemos que a situação
é complexa, que os policiais têm
um trabalho difícil. Mas, ao mesmo tempo, consideramos que os
governos não estão implementando políticas que reformam a
polícia", afirmou o pesquisador
da Anistia.
Esquadrões da morte
O relatório menciona o fato de
que "esquadrões da morte" estão
presentes em 15 Estados e que
existe uma "crescente impunidade" que protege policiais que matam civis.
A Anistia afirma que houve aumento de 11% em casos de mortes
de civis por policiais em São Paulo
em 2003 e de 34% no Rio. "Muitas
dessas mortes ocorreram em situações que apontavam para o
uso excessivo de força ou execuções extrajudiciais."
A Anistia diz que Rio e São Paulo são os Estados em que a repressão policial é mais evidente.
Exemplos de ação violenta citados são a morte do chinês Chan
Kim Chang no presídio Ary Franco, no Rio, e torturas na Febem de
Franco da Rocha, em São Paulo.
O relatório vê também progressos, principalmente com relação a
investigações de corrupção no Judiciário e na polícia, em São Paulo
e no Espírito Santo. Houve ainda
julgamentos "importantes"
quanto aos massacres da Candelária e Vigário Geral, no Rio, ambos em 1993.
Lula
A Anistia reserva elogios e críticas ao primeiro ano do governo
de Luiz Inácio Lula da Silva. Ele
recebe cumprimentos por ter incluído direitos econômicos e sociais como parte da luta por direitos humanos, principalmente em
razão do Fome Zero.
Lula também é elogiado por ter
criado o Sistema Único de Segurança Pública, mas a Anistia diz
que a demora na implementação
é motivo de "certa decepção". A
aprovação do Estatuto do Desarmamento, que controla a venda
de armas, é um "primeiro passo".
Mas há críticas à política indigenista do governo. "A demora do
governo em homologar terras indígenas tem aumentado a vulnerabilidade desses grupos", diz a
ONG, que vê "uma escalada nas
mortes, intimidações e perseguições a populações indígenas."
(FABIO ZANINI)
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