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Venda de crianças amplia epidemia
BASILDON PETA
DO "THE INDEPENDENT", NA ZÂMBIA
Elvin Mudyakuvinda está vendendo suas duas filhas pequenas
para poder alimentar as outras oito crianças de que cuida.
Ela diz que é sua última opção
após ser forçada a vender tudo o
que possuía -animais, talheres e
roupas- para comprar comida.
Como muitos zambianos atingidos pela seca, Mudyakuvinda
está presa em um círculo vicioso
de pobreza e fome.
Mas, famílias desesperadas tentando vender suas filhas como
"noivas" estão fazendo com que a
Zâmbia mergulhe em uma epidemia de Aids que destrói seu tecido
social, já que crianças forçadas ao
casamento, e às vezes à poligamia,
passam a ser tão expostas ao HIV
quanto os adultos.
As duas filhas de Mudyakuvinda que estão à venda -Memory,
8, e Hildah, 13- já foram tiradas
da escola. A fome lhes roubou a
energia suficiente para caminhar
os cinco quilômetros que separam sua casa da escola.
Agora, elas ajudam sua mãe a
catar pedaços de madeira para fazer carvão, que elas tentam vender a motoristas na estrada que liga a capital, Lusaka, ao balneário
de Livingstone. Mas não há interessados: ela não consegue vender
carvão há quase duas semanas.
"É por isso que eu tenho de casar minhas filhas. Se vier alguém
que possa pagar o que eu preciso,
vai levá-las embora. Dói ter de fazer isso, mas não tenho opção."
Pretendentes interessados terão
de pagar 600 mil kwachas (cerca
de R$ 430) por cada filha. Isso garantiria à sua família um pouco de
comida para os próximos meses.
Segundo Stella Goings, diretora
do Unicef (Fundo das Nações
Unidas para a Infância) na Zâmbia, pelo menos 20% dos 11 milhões de zambianos estão infectados com o vírus da Aids, e, logo, a
Zâmbia pode se tornar um dos
países mais afetados pelo HIV.
O Unicef estima que 75% das famílias na Zâmbia tenham adotado pelo menos um órfão da Aids.
Goings afirma que o mundo
tem de perceber que a fome, que
afeta 3 milhões de zambianos e
pelo menos 14 milhões de pessoas
em toda a região sul do continente
africano, está diretamente ligada à
Aids. Qualquer tentativa de resolver o problema da fome que não
tente lidar com a questão da Aids
é totalmente equivocada, diz.
"É um círculo vicioso. Começa
com crianças sendo vendidas como mão-de-obra, prostitutas ou
noivas e acaba com os próprios
pais se vendendo para ganhar dinheiro", afirmou. "O comportamento de risco que se segue leva
ao HIV, que depois leva à diminuição da produtividade."
Muitos adultos e seus filhos estão doentes demais para trabalhar
na terra, tornando-os dependentes de ajuda externa.
"Se deixarmos o HIV de lado e
doarmos montanhas de comida,
não vamos resolver o problema."
Depois de serem vendidas, as
mulheres têm de permanecer casadas, não importa se sofrem abusos, já que os pais não têm dinheiro para comprá-las de volta.
Na Escola Básica de Simukombo, no distrito de Kazungula (sul
do país), professores afirmam que
12 meninas de oito a 13 anos de
idade deixaram a escola para que
seus pais pudessem vendê-las para comprar comida. Elas pegaram
Aids imediatamente, dizem.
Na Escola Maunga, a história é a
mesma: 42 crianças, a maioria
meninas, foram vendidas.
Os pais de Irene Simungo, 16,
morreram de Aids. É sua avó de
70 anos que cuida dela agora -e
de outros sete órfãos da Aids.
Por enquanto, Irene acorda cedo e colhe frutas perto de casa antes de caminhar quatro quilômetros até a escola. Mas ela logo terá
de ser vendida, para que sua avó
possa alimentar os outros.
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