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São Paulo, terça-feira, 28 de janeiro de 2003

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IRAQUE NA MIRA

Discurso sobre o Estado da União não deverá ter declaração de guerra, mas buscará angariar apoio ao ataque

Bush discursa para convencer EUA e mundo

ENRIC GONZÁLEZ
DO "EL PAÍS", EM WASHINGTON

O momento crítico chegou. Mas as circunstâncias não são as que George W. Bush esperava. Seu discurso anual sobre o Estado da União, hoje, não poderá ser uma declaração de guerra contra o Iraque, como tinha previsto, mas o anúncio de uma "última fase diplomática", que o presidente dos EUA enfrenta em relativa solidão.
Seus aliados são poucos e mornos. Sua opinião pública titubeia. O início da invasão pode ser fechado para o começo de março, e Bush deverá tomar nesse prazo as decisões mais graves e arriscadas de seu governo. A paz parece impossível. Ficam duas incógnitas: como será a segunda Guerra do Golfo e como será o mundo depois. Nesta semana, que começou ontem com o relatório dos inspetores e terminará com uma reunião entre Bush e o premiê britânico, Tony Blair, as respostas começarão a se concretizar.
No Estado da União do ano passado, Bush citou pela primeira vez o "eixo do mal", de países que supostamente estariam desenvolvendo armas de destruição em massa (Iraque, Irã e Coréia do Norte). Para confeccionar o discurso de hoje, Bush esperou até a última hora. Ele queria conhecer o relatório dos inspetores da ONU ao Conselho de Segurança e saber qual o ânimo da comunidade internacional. Agora já sabe: o relatório carecia de provas conclusivas e foi recebido com prudência por países como França, Rússia e China, cuja aprovação ou consentimento tácito é quase imprescindível para uma operação militar.
Bush deverá, portanto, dar um passo atrás e fazer um novo esforço para convencer o mundo e os americanos de que invadir o Iraque é imprescindível. Dirá que Saddam tem "30 mil mísseis" e "milhares de toxinas perigosas que podem matar milhões".
Mas seguirá sem revelar, em princípio, as provas que diz possuir. Sua mensagem ao Congresso trará, segundo Dan Bartlett, diretor de Comunicação da Casa Branca, "a oportunidade de falar diretamente ao público sobre as perspectivas de guerra e sobre as razões pelas quais o mundo se uniu para exigir o desarmamento desse regime". Não será, porém, o discurso final. Bush qualificará o crucial mês de fevereiro de "a última fase da diplomacia". "Não haverá declaração de guerra", disse.
As pesquisas indicam que o apoio à guerra caiu. Menos de 30% dos americanos têm a presa de Bush -57% dizem aprovar um ataque, mas 71% querem que se apresentem provas contra o Iraque para justificar um ataque.
Das cinco potências com direito a veto no CS da ONU, três (França, Rússia e China) vêm aumentando suas reticências. Bush e Blair não reuniram sequer os nove votos necessários para contar com a maioria no CS. O que se verá a partir de amanhã é se Bush conta com uma flexibilidade suficiente para reconstruir um consenso internacional cada vez mais rompido. Suas reações, até o momento, são as habituais.
Um dos grandes erros de Bush foi sua linguagem, uma retórica de pastor televisivo escassa de matizes e abundante em sentenças religiosas e morais.
A inquietação pelo tom presidencial se estende inclusive aos parlamentares republicanos. O senador Chuck Hagel, uma das vozes republicanas mais respeitadas em assuntos militares, lamentou a "crescente brecha entre os EUA e o resto do mundo" e a atribuiu, em parte, à agressividade e à arrogância de Bush. "Neste momento decisivo da história americana, os EUA necessitam mais humildade e menos insolência no uso de seu poder militar e devem reconhecer que a concretização de seus objetivos requer alianças e consenso." Entre os democratas, as críticas são generalizadas.
Depois da guerra, o assunto principal do discurso será a economia cambaleante do país. Pesquisas apontam que a maioria dos americanos acha esse assunto mais importante do que o Iraque.


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