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IRAQUE NA MIRA
Discurso sobre o Estado da União não deverá ter declaração de guerra, mas buscará angariar apoio ao ataque
Bush discursa para convencer EUA e mundo
ENRIC GONZÁLEZ
DO "EL PAÍS", EM WASHINGTON
O momento crítico chegou. Mas
as circunstâncias não são as que
George W. Bush esperava. Seu
discurso anual sobre o Estado da
União, hoje, não poderá ser uma
declaração de guerra contra o Iraque, como tinha previsto, mas o
anúncio de uma "última fase diplomática", que o presidente dos
EUA enfrenta em relativa solidão.
Seus aliados são poucos e mornos. Sua opinião pública titubeia.
O início da invasão pode ser fechado para o começo de março, e
Bush deverá tomar nesse prazo as
decisões mais graves e arriscadas
de seu governo. A paz parece impossível. Ficam duas incógnitas:
como será a segunda Guerra do
Golfo e como será o mundo depois. Nesta semana, que começou
ontem com o relatório dos inspetores e terminará com uma reunião entre Bush e o premiê britânico, Tony Blair, as respostas começarão a se concretizar.
No Estado da União do ano passado, Bush citou pela primeira vez
o "eixo do mal", de países que supostamente estariam desenvolvendo armas de destruição em
massa (Iraque, Irã e Coréia do
Norte). Para confeccionar o discurso de hoje, Bush esperou até a
última hora. Ele queria conhecer
o relatório dos inspetores da ONU
ao Conselho de Segurança e saber
qual o ânimo da comunidade internacional. Agora já sabe: o relatório carecia de provas conclusivas e foi recebido com prudência
por países como França, Rússia e
China, cuja aprovação ou consentimento tácito é quase imprescindível para uma operação militar.
Bush deverá, portanto, dar um
passo atrás e fazer um novo esforço para convencer o mundo e os
americanos de que invadir o Iraque é imprescindível. Dirá que
Saddam tem "30 mil mísseis" e
"milhares de toxinas perigosas
que podem matar milhões".
Mas seguirá sem revelar, em
princípio, as provas que diz possuir. Sua mensagem ao Congresso
trará, segundo Dan Bartlett, diretor de Comunicação da Casa
Branca, "a oportunidade de falar
diretamente ao público sobre as
perspectivas de guerra e sobre as
razões pelas quais o mundo se
uniu para exigir o desarmamento
desse regime". Não será, porém, o
discurso final. Bush qualificará o
crucial mês de fevereiro de "a última fase da diplomacia". "Não haverá declaração de guerra", disse.
As pesquisas indicam que o
apoio à guerra caiu. Menos de
30% dos americanos têm a presa
de Bush -57% dizem aprovar
um ataque, mas 71% querem que
se apresentem provas contra o
Iraque para justificar um ataque.
Das cinco potências com direito
a veto no CS da ONU, três (França, Rússia e China) vêm aumentando suas reticências. Bush e
Blair não reuniram sequer os nove votos necessários para contar
com a maioria no CS. O que se verá a partir de amanhã é se Bush
conta com uma flexibilidade suficiente para reconstruir um consenso internacional cada vez mais
rompido. Suas reações, até o momento, são as habituais.
Um dos grandes erros de Bush
foi sua linguagem, uma retórica
de pastor televisivo escassa de
matizes e abundante em sentenças religiosas e morais.
A inquietação pelo tom presidencial se estende inclusive aos
parlamentares republicanos. O
senador Chuck Hagel, uma das
vozes republicanas mais respeitadas em assuntos militares, lamentou a "crescente brecha entre os
EUA e o resto do mundo" e a atribuiu, em parte, à agressividade e à
arrogância de Bush. "Neste momento decisivo da história americana, os EUA necessitam mais
humildade e menos insolência no
uso de seu poder militar e devem
reconhecer que a concretização
de seus objetivos requer alianças e
consenso." Entre os democratas,
as críticas são generalizadas.
Depois da guerra, o assunto
principal do discurso será a economia cambaleante do país. Pesquisas apontam que a maioria dos
americanos acha esse assunto
mais importante do que o Iraque.
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