São Paulo, quarta-feira, 28 de fevereiro de 2001

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DIREITOS HUMANOS

Governo discute com alta comissária das Nações Unidas e classifica relatório norte-americano de hipócrita

China reage a críticas da ONU e dos EUA

DAS AGÊNCIAS INTERNACIONAIS

O governo chinês empreendeu ontem um bate-boca público em Pequim com a alta comissária da ONU para direitos humanos, Mary Robinson, por causa do tratamento dado à seita banida Fa Lun Gong, negou um pedido dela para eliminar campos de trabalho forçado e chamou o governo dos EUA de hipócrita por dizer, em um relatório divulgado anteontem, que a situação dos direitos humanos na China piorou no ano passado.
Acossado por todos os lados -pelos EUA, pelas Nações Unidas e por grupos defensores de direitos humanos que querem impedir o sucesso de sua candidatura para abrigar em Pequim os Jogos Olímpicos de 2008-, o governo chinês lançou ontem um contra-ataque em múltiplas frentes.
O país desprezou o pedido de Mary Robinson, que visita o país, pela abolição dos campos de trabalho forçado para onde são levados para passar até três anos, sem julgamento, membros da Fa Lun Gong, além de usuários de drogas, prostitutas e dissidentes políticos.
A China também criticou o relatório anual de direitos humanos do Departamento de Estado dos EUA e revidou com um longo relatório sobre problemas sociais nos EUA.
"Essa é uma típica ação que mostra o duplo padrão dos EUA em relação aos direitos humanos", disse, num comunicado, o Ministério das Relações Exteriores da China, acusando Washington de "ir muito longe para defender abertamente o infernal culto desumano da Fa Lun Gong".

Compaixão
Um membro do gabinete chinês afirmou que a "reeducação pelo trabalho em campos" é uma forma compassiva de lidar com problemas sociais e relacionou sua campanha contra o banido grupo religioso Fa Lun Gong com a guerra contra as drogas preconizada pelos EUA.
"As autoridades tratam aquelas pessoas que recebem a reeducação como os professores tratam os estudantes, como os médicos tratam os pacientes e como os pais tratam os filhos", afirmou Liu Jing, chefe do Conselho para Prevenção e Combate aos Cultos.
"Acho que o problema é que ela (Mary Robinson) tem muito pouca informação sobre a Fa Lun Gong", disse Liu.
Acredita-se que até 5.000 membros da Fa Lun Gong sejam mantidos nos campos de trabalho forçado. Liu negou rumores de que pelo menos cem membros do grupo teriam morrido sob custódia policial.
"A Fa Lun Gong é como uma droga espiritual", disse Liu. "Ela provoca tantos danos aos seus praticantes, especialmente os mais devotos, quanto as drogas."
Robinson, porém, manteve sua posição. "É muito claro que os direitos humanos dos membros da Fa Lun Gong estão sendo transgredidos neste momento na China", disse ela em uma entrevista coletiva algumas horas depois.
"Minha mensagem é que é importante para as autoridades chinesas ter em mente todo o tempo que os membros da Fa Lun Gong têm direitos que devem ser respeitados independentemente de como a China trata a própria Fa Lun Gong", disse ela.
O grupo, que adota elementos de taoísmo, budismo e de meditação tradicional chinesa, além de exercícios físicos, foi proibido há 19 meses pelo governo chinês, que alega que o movimento é um "culto ao demônio".
Pequim acusa o fundador da Fa Lun Gong, Li Hongzhi, exilado nos EUA, de tramar com "forças estrangeiras hostis" para desestabilizar a China, reverter as reformas econômicas e derrubar o Partido Comunista, que governa o país há cinco décadas.
O governo chinês acusa o grupo de ser responsável pela morte de 1.500 pessoas por dizer, principalmente, que a meditação é mais poderosa que a medicina moderna. Outras 139 pessoas teriam cometido suicídio, segundo o governo, abrindo as próprias barrigas em busca da "roda da lei", que Hongzhi diz estar escondida dentro de cada fiel.
O jornal "Diário do Povo", órgão oficial do Partido Comunista Chinês, publicou ontem um editorial defendendo a "completa eliminação" da Fa Lun Gong.
O governo chinês também distribuiu panfletos ontem com a versão oficial sobre o incidente, no qual cinco membros do grupo atearam fogo a seus corpos na praça Tiananmen, no mês passado. Um deles morreu e os outros quatro ainda estão internados em estado grave.
"De acordo com a investigação policial, o incidente foi uma ação chocante e absurda tomada pelos membros da Fa Lun Gong, incitados e espiritualmente controlados por Li Hongzhi, na esperança de alcançarem o "reino dos céus'", disse o texto dos panfletos.
A perseguição da China aos fiéis do movimento tem gerado preocupação na comunidade internacional, que acusa Pequim de violar a liberdade religiosa e as liberdades civis. Os líderes da Fa Lun Gong dizem que as acusações do governo chinês são falsas e que o objetivo do movimento, apolítico, é apenas melhorar a qualidade de vida das pessoas.



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