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Europa deve ampliar retórica antiimigrante
MARCELO STAROBINAS
DA REDAÇÃO
A chegada ao segundo turno na
França do candidato de extrema
direita Jean-Marie Le Pen, com
uma plataforma que atribui aos
imigrantes a culpa por parte dos
problemas sociais, deve levar os
partidos tradicionais da Europa a
aumentar a sua retórica nacionalista contrária à entrada de imigrantes no continente.
Entretanto, segundo analistas
ouvidos pela Folha, a recente ascensão da extrema direita européia não deve levar ao fechamento das fronteiras como gostariam
organizações xenófobas como a
Frente Nacional francesa.
"É provável que a retórica fique
mais dura contra os imigrantes",
disse Alasdair Murray, diretor de
política social do Centro para Reforma Européia, de Londres.
"Mas não creio que venha a haver
grande mudança política."
Murray cita como exemplo declarações do ministro do Interior
britânico, David Blunkett. Ele
avançou o sinal na semana passada ao defender a criação de escolas especiais para filhos de imigrantes, de forma a evitar que outras instituições de ensino sejam
"inundadas" por eles. O termo em
inglês utilizado, "swamped", é pejorativo e usado com frequência
pela direita do Partido Conservador. "O comentário de Blunkett
sugere que vários elementos do
governo possam falar mais com a
linguagem da direita", opinou.
Nos últimos 30 anos, os governos europeus evitaram ao máximo abrigar estrangeiros. Os fluxos migratórios de refugiados políticos e econômicos aumentaram
em larga escala no início dos anos
90 -em razão de guerras, como a
do Golfo e o conflito nos Bálcãs, e
do colapso do comunismo e da
Cortina de Ferro, barreira física e
ideológica que isolava o continente da imigração do Leste Europeu.
Em situação ilegal, esses imigrantes permanecem nas principais cidades da Europa Ocidental.
Fazem os trabalhos sem qualificação que os europeus se negam a
fazer e, desamparados pelo Estado, não raro caem na criminalidade -o que reforça as acusações
extremistas contra a imigração.
Segundo estimativas governamentais, há hoje por volta de 1 milhão de imigrantes ilegais no Reino Unido, 1 milhão na Alemanha,
400 mil na França e 300 mil na Itália. Cerca de 500 mil novos estrangeiros entram sem documentação
na União Européia anualmente.
Agora, com o crescimento da
extrema direita não apenas na
França, mas também na Áustria,
na Itália, na Bélgica, na Dinamarca e na Noruega, os partidos tradicionais de direita e esquerda se
vêem pressionados a lidar com a
questão dos imigrantes.
"O desafio é fazê-lo de forma
construtiva -lidando com problemas reais que, por tempo demais, foram deixados para a extrema direita", observou Tore
Bjorgo, especialista em extrema
direita do Instituto Norueguês
para Assuntos Internacionais.
A discussão já agita os corredores de Bruxelas, onde representantes dos 15 integrantes da União
Européia (UE) buscam a adoção
de regras comuns para concessão
de asilo e cidadania e ensaiam
uma cooperação para melhor
controle de fronteiras.
Apesar da retórica de interesses
comuns na UE, Murray destaca
que a maioria dos países prefere
agir por conta própria ao lidar
com a imigração. "Esses países
governados pela direita querem
recuperar para si o controle da entrada de imigrantes em vez de trabalhar juntos, de forma a agradar
sua população mais rapidamente", disse o analista britânico.
Na opinião de Jacques Barou,
especialista em imigração do Instituto de Estudos Políticos de Grenoble, na França, o bom resultado
de Le Pen pode motivar a Europa
a mudar. "Haverá uma política
repressiva contra os imigrantes
clandestinos", disse. Por outro lado, "deve haver um aumento da
imigração legal, dando a eles o direito de permanecer temporadas
mais curtas". Seria uma imigração que serviria aos propósitos
econômicos, sem acarretar novos
problemas de integração populacional como no caso dos norte-africanos na França.
Barou e outros estudiosos do assunto argumentam que a manutenção do crescimento econômico da Europa só é viável se o continente continuar a receber imigrantes. Isso porque, com o progressivo envelhecimento da população européia, seus países vão
precisar cada vez mais de jovens
estrangeiros para suprir a escassez de mão-de-obra e conseguir
pagar pensões para uma crescente população de aposentados.
Números da ONU indicam que
o continente teria de abrigar 13,5
milhões de imigrantes por ano
para conseguir manter a mesma
proporção entre trabalhadores e
pensionistas. É com isso em mente, argumenta Barou, que "os partidos tradicionais na França evitam uma retórica contra a imigração". E Le Pen, apesar de ter provocado um choque em suas estruturas, não deve provocar uma reviravolta. "Tanto a direita parlamentar quanto a esquerda vão
evitar falar nesse tema porque sabem que há uma necessidade econômica de trazer gente de fora."
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