São Paulo, segunda-feira, 28 de abril de 2008

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ARTIGO

A fome está à espreita nos EUA

CHRIS BRYANT
DO "FINANCIAL TIMES", EM WASHINGTON

Milhões de pobres americanos correm o risco de passar fome se os preços dos alimentos continuarem a subir e as agências de alimentos tiverem dificuldade em enfrentar a alta dos custos, a redução dos recursos e o aumento na demanda.
Mais e mais pessoas pobres nos EUA já estão recorrendo à beneficência e à ajuda do governo em sua luta para fazer frente aos custos crescentes dos alimentos e à alta das tarifas dos combustíveis. Na última semana o preço do arroz alcançou um novo pico, e algumas lojas estão limitando as compras atacadistas do grão.
Laurie True, diretora executiva da Associação de Programas da Califórnia para Mulheres e Crianças, disse que as agências locais estão relatando um aumento acentuado no número de novos cadastrados. "São pessoas que normalmente não pediriam ajuda à Previdência Social", disse ela.
O Escritório Orçamentário do Congresso previu que no próximo ano os americanos que recebem ajuda alimentar do governo chegarão a 28 milhões, o maior número desde que o programa de selos alimentares começou, mais de 40 anos atrás.
James Weill, presidente do Centro de Pesquisas e Ação Alimentares, disse que o número real provavelmente será muito maior, porque já chegara a 27,7 milhões em janeiro, um acréscimo de mais de 1,3 milhão de pessoas no último ano. Essa cifra não abrange todas as pessoas necessitadas, já que apenas cerca de 65% das pessoas que têm direito a pedir os selos de alimentação se candidatam a essa ajuda.
O impacto será sentido mais agudamente pelos 35 milhões de americanos -10,9% das famílias do país- que já enfrentam dificuldade em colocar comida suficiente na mesa todos os anos. Acredita-se que cerca de 11 milhões dessas pessoas tenham "segurança alimentar muito baixa", o que significa que algum membro de suas famílias passou fome por falta de dinheiro, segundo cifras governamentais de 2006.
Os responsáveis pelas campanhas de alimentação temem que a situação dos alimentos possa se deteriorar mais ainda se os negociadores na Câmara e no Senado não conseguirem fazer aprovar uma verba adicional de US$ 10 bilhões para os programas nacionais de assistência alimentar.
As medidas para ampliar as condições para que as pessoas possam candidatar-se a selos alimentares e para aumentar o estoque emergencial de alimentos estão contidas num projeto de lei agrícola no valor de US$ 288 bilhões que está parado há meses por divergências sobre aumentos no orçamento. Na semana passada, o Senado aprovou a extensão de uma semana da lei de 2002, para que as negociações continuem.
"Não sei o que faremos se a lei não for aprovada", disse Anne Goodman, diretora-executiva do Banco de Alimentos de Cleveland. "Já temos uma tragédia crescente aqui que está sendo exacerbada pela alta nos custos dos alimentos e combustíveis."
O custo dos alimentos que a população americana pobre tende a comprar vem subindo mais rapidamente que o dos produtos comprados por seus vizinhos mais ricos. Os preços dos alimentos tiveram alta média de 5,1% entre fevereiro de 2007 e fevereiro de 2008, mas o custo de uma cesta básica, usada como referência para os selos alimentícios, subiu 6,5% no mesmo período.
Bob Dolgan, porta-voz do Depósito Alimentar da Grande Chicago, disse que a alta dos preços dos alimentos está afetando "as pessoas que já vivem às margens, sobrevivendo mês a mês de seus salários".
Os espaços em que o governo não atua são preenchidos por uma rede de 200 bancos regionais de alimentos que distribuem comida a 30 mil igrejas e refeitórios beneficentes espalhados pelo país. O organismo que supervisiona a rede, America's Second Harvest (Segunda Colheita da América), estima que o número de pessoas que procuram sua ajuda aumentou 25% no último ano.
Cerca de 40% dos 13 milhões de adultos em idade economicamente ativa assistidos pela organização vêm de famílias em que pelo menos uma pessoa tem emprego, disse a diretora Vicki Escarra. "O rosto da pobreza e da fome mudou nos últimos anos. A idéia de que a fome atinge apenas os sem-teto é falsa."
Os recursos das agências alimentares estão apertados porque a alta dos preços dos combustíveis elevou os custos do transporte dos alimentos e também porque as doações, tanto públicas quanto privadas, começaram a diminuir. No passado o governo comprava grande quantidade de commodities agrícolas excedentes para respaldar os preços de mercado e os distribuía entre os bancos de alimentos. Com a alta dos preços nos últimos quatro anos, essas doações tiveram uma queda de 75%, deixando os bancos de alimentos em dificuldades.
"Os estoques estão bastante vazios neste momento", disse Lindsey Buss, presidente da organização de beneficência alimentar Martha's Table, em Washington. "Ao mesmo tempo em que a demanda aumenta, o custo para satisfazê-la também aumenta."


Tradução de CLARA ALLAIN


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