São Paulo, quarta, 28 de maio de 1997.



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ANÁLISE
Isolamento externo mascara divisões no regime

MARCELO MUSA CAVALLARI
da Redação

O Irã é um regime isolado. Talvez por isso, sua situação interna pareça mais monolítica do que é, e o novo presidente pareça ser muito mais uma ruptura do que realmente pode ser.
A república islâmica que se instalou em 1979 com o aiatolá Khomeini rapidamente apresentou rachaduras. Agrupando interesses de ordem diversa, dois grandes blocos se formaram.
Pouco antes de morrer, em 1989, Khomeini jurou que não permitiria que os "reformistas" -à época dominando o Parlamento- prevalecessem sobre os "conservadores" -então no comando do Executivo. A declaração foi entendida como alinhamento inequívoco com os "conservadores".
Na verdade, Khomeini preparou e fez aprovar, já depois de sua morte, mudanças constitucionais que mantêm os dois grupos alternando-se no comando de instituições que se controlam mutuamente.
O sucessor de Khomeini como líder espiritual é o líder dos conservadores, Ali Khamenei. A fim de assumir o cargo ele deixou a Presidência, para a qual o líder reformista Ali Akbar Hachemi Rafsanjani foi eleito com 95,9% dos votos em 1989.
Rafsanjani vinha então do Parlamento, onde a presença dos conservadores começou a crescer até se tornar dominante. Tendência que começou a mudar no ano passado.
O novo presidente entra nesse jogo. Khatami -que foi ministro de Khamenei e de Rafsanjani- venceu com apoio de Rafsanjani, que está deixando o cargo por exigência constitucional depois de dois mandatos. Ali Akbar Nateq-Nouri, preferido de Khamenei, que deixou a presidência do Parlamento para se candidatar, foi o derrotado.
A divisão dos dois grupos, porém, não passa por questões como ocidentalização ou liberação dos costumes.
Os conservadores se mantêm fiéis ao programa pan-islâmico de Khomeini. Todos os muçulmanos são irmãos, e o Irã deve ser a ponta de lança de uma unificação islâmica.
O debate é entre "expansão" -projeto conservador- e consolidação interna da revolução, projeto reformista que inclui as não muito cumpridas promessas de Rafsanjani de diminuir a pobreza e modernizar a economia.
Para Khamenei e seus conservadores, o Islã é mais importante do que o Irã. Para Rafsanjani e seu grupo, o Irã é mais importante do que o Islã.
Isso traz à baila outra divisão. Cada um dos candidatos à eleição teve apoio de um santuário iraniano. A mesquita que se congrega em torno do mausoléu de Khomeini apoiou, o que pode parecer surpreendente, o reformista Khatami.
Isso porque há uma ala radical xiita para a qual é mais importante ser xiita do que ser genericamente muçulmano.
Como o Irã é o único país em que os xiitas são esmagadora maioria da população, ser xiita e nacionalista são posições muito próximas no Irã.
Khatami ainda conseguiu atrair votos dos "bazaris" -comerciantes de Teerã que querem diminuição do Estado.



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