São Paulo, domingo, 28 de maio de 2000


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ANÁLISE
Oposicionista nas eleições do Peru acreditava ter o apoio incondicional dos EUA quando ameaçava sair da disputa
Toledo errou ao abandonar candidatura

DO ENVIADO ESPECIAL

Um erro de avaliação fez com que Alejandro Toledo -um descendente de índios formado em economia em Harvard (EUA)- adiasse seus planos de chegar à Presidência do Peru.
Toledo avaliou que teria o apoio incondicional dos Estados Unidos na estratégia de ameaçar retirar sua candidatura em protesto contra as fraudes no processo eleitoral.
O suporte dos EUA, acreditava Toledo, levaria o governo peruano a ceder, permitindo que a disputa se desse em condições mais equitativas. A avaliação se mostrou errada em vários pontos.
No segundo turno, Toledo passou boa parte do tempo fora do país buscando apoio externo. Viajou a Washington e a Nova York para se encontrar com dirigentes do FMI (Fundo Monetário Internacional), do Banco Mundial e do BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento) e com banqueiros norte-americanos.
Depois foi à Argentina se encontrar com o presidente Fernando de la Rúa, que o apoiava.
Durante esse período deu seguidas declarações de que não disputaria o segundo turno caso não fossem corrigidas as falhas no sistema eleitoral que permitiram a realização de fraudes em favor de Fujimori na primeira etapa do processo.
Embalado pelas manifestações antifraude, que chegaram a reunir 50 mil pessoas no primeiro turno, Toledo também contava com o apoio das massas. Entretanto, no segundo turno, não conseguiu reunir mais que 10 mil pessoas em seus comícios.
A posição de Toledo acabou sendo malvista pelo eleitorado peruano. Pesquisas do instituto Apoyo indicam que o candidato oposicionista perdeu pontos preciosos ao passar uma imagem de insegurança aos eleitores.
Toledo e Fujimori iniciaram a campanha no segundo turno empatados tecnicamente nas pesquisas de intenção de voto. Depois, o adversário do presidente peruano começou a cair nas pesquisas, até atingir 36% das intenções de voto contra 51% de Fujimori.
O golpe final contra Toledo foi dado pelo presidente dos EUA, Bill Clinton, que, na semana passada, criticou sua decisão de se retirar da disputa caso o segundo turno não fosse adiado.
"Deploramos tanto a decisão unilateral do candidato oposicionista de retirar-se da disputa como a decisão apressada da comissão eleitoral de rejeitar um possível adiamento da data do segundo turno", afirmou o porta-voz do Departamento de Estado norte-americano.
O governo peruano -que controla a Justiça eleitoral- terminou por não ceder às pressões de Toledo e manteve a data do segundo turno.

"Posição dúbia"
"Toledo deixou de enviar uma mensagem clara a seus adeptos ao assumir uma posição dúbia com relação à sua candidatura, pregando a abstenção e o voto nulo no segundo turno. Em quase nenhuma parte do mundo esse tipo de proposta teve êxito", afirmou o analista político peruano Fernando Tuesta.
Nos últimos dias, a Justiça eleitoral fez uma pesada campanha publicitária informando que os eleitores que deixassem de votar seriam multados ao equivalente a US$ 33.
Mesmo com a pressão das instituições peruanas, leais a Fujimori, o candidato oposicionista não voltou atrás e se deixou levar pelos seus assessores mais radicais, mantendo a decisão de não disputar o segundo turno hoje.
Toledo acreditava que Fujimori não teria coragem de disputar sozinho a eleição por não contar com o aval da comunidade internacional.
Entretanto, depois das críticas do governo norte-americano, até a OEA (Organização dos Estados Americanos) passou a assumir posição mais flexível, buscando um acordo que somente permitisse o adiamento do segundo turno, sem exigir mais mudanças no sistema eleitoral.
Toledo passou a bombardear a OEA, anunciando que não bastava a simples postergação do segundo turno, mas sim uma reforma completa no processo eleitoral.
Partidários da coligação que o apóia (frente Peru Possível) chegaram a exigir que todos os parlamentares de oposição eleitos em abril passado renunciassem em protesto contra as fraudes.
A posição de Toledo acabou por isolá-lo ainda mais, e ele foi perdendo apoio dos EUA e da OEA.
Fujimori decidiu então bancar a manutenção do segundo turno para hoje, independentemente das críticas da comunidade internacional.
O presidente peruano jogou com dois fatos: o que mais interessa aos EUA é a manutenção da política econômica liberal adotada no Peru e a aliança que o país tem com os norte-americanos na luta contra o narcotráfico.
Toledo agora aposta que o presidente Fujimori não terminará seu mandato com o previsível aumento da pressão popular no país por causa da aguda recessão pela qual passa o Peru. Resta saber se, dessa vez, fez a avaliação correta. (LF)


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