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PERU
Itamaraty atuou nos bastidores para tentar evitar isolamento do presidente Fujimori no cenário internacional
Governo brasileiro tentou legitimar "rerreeleição"
DO ENVIADO ESPECIAL
O governo Fernando Henrique
Cardoso atuou nos bastidores da
diplomacia internacional para
tentar dar uma capa de legitimidade à "rerreeleição" do presidente peruano, Alberto Fujimori,
e evitar o isolamento do Peru no
cenário mundial.
O plano fracassou com a intransigência de Fujimori em aceitar o
adiamento do segundo turno da
eleição, que se realiza hoje.
A Folha reconstituiu as manobras do governo brasileiro na eleição peruana e a forma como FHC
se colocou como único aliado externo de Fujimori. Os relatos foram colhidos no Itamaraty e na
assessoria de Fujimori.
De forma discreta, o Itamaraty
vem agindo em favor de Fujimori
desde o final do primeiro turno da
eleição (9 de abril), quando as críticas ao presidente peruano ficaram mais agudas por parte dos
EUA e da OEA (Organização dos
Estados Americanos).
O interesse do governo brasileiro era propor uma alternativa que
pusesse fim à crise política no Peru. A proposta deveria contemplar outros dois objetivos: reforçar a posição do Brasil de líder na
América Latina e diminuir a influência dos EUA.
Na avaliação do Itamaraty, com
ou sem fraude no segundo turno,
o candidato de oposição, Alejandro Toledo, tinha poucas chances
de ganhar a eleição.
Isso porque, conforme demonstravam pesquisas de opinião, boa
parte do eleitorado tinha perdido
a confiança em Toledo por causa
das suas seguidas ameaças de retirada da candidatura.
Assim, já que um terceiro mandato de Fujimori era quase inevitável, melhor que ele contasse
com o aval da comunidade internacional. Não interessava ao governo brasileiro mais um foco de
instabilidade na América Latina,
que enfrenta temas mais urgentes, como o fortalecimento da
guerrilha na Colômbia e o avanço
do populismo na Venezuela.
O primeiro passo do governo
brasileiro foi adotar uma posição
inversa à da comunidade internacional, dando apoio à gestão de
Fujimori. Para o Itamaraty, por
exemplo, havia sido um erro a decisão do governo argentino de
convidar Toledo para visitar o
país no intervalo entre o primeiro
e o segundo turnos.
Na ocasião, Toledo relatou as
fraudes no primeiro turno ao presidente da Argentina, Fernando
de la Rúa. O ex-presidente argentino Raúl Alfonsín chegou a criticar "a degradação institucional
no Peru" e o "comportamento autoritário" de Fujimori.
Como parte da estratégia do Itamaraty de seguir o caminho contrário ao do governo argentino,
na semana passada os três principais ministros de Fujimori foram
condecorados com a Ordem do
Cruzeiro do Sul -mais alta comenda do Brasil. Foram homenageados os ministros Alberto Bustamante (Gabinete Civil), Efrain
Goldenberg (Economia) e Edgardo Mosqueira (Presidência, que
controla a maior parte da verba de
investimento do governo).
O presidente peruano entendeu
que o Brasil queria assumir um
papel mais importante na crise e
enviou diplomatas a Brasília, em
missão sigilosa. Eles receberam o
sinal de que o Brasil apoiaria a soberania peruana, ou seja, acataria
o resultado oficial da eleição, mesmo com críticas da comunidade
internacional.
O Itamaraty alertou, no entanto,
que o resultado do pleito, ainda
que com reservas públicas, também deveria ser aceito pelos Estados Unidos, que baliza a posição
da OEA. Na semana passada,
FHC falou por telefone com o secretário-geral da OEA, César Gaviria, para negociar uma saída diplomática para a crise peruana.
A proposta do Brasil era que o
segundo turno da eleição fosse
adiado -como queriam Toledo,
os EUA e a OEA-, mas que seu
resultado fosse aceito publicamente por todos, fossem quais
fossem as condições em que se
desenrolassem.
Gaviria gostou da alternativa
apresentada pelo Brasil e passou a
articular com os EUA um acordo
nos moldes imaginados pelo Itamaraty. O chefe da missão da
OEA, Eduardo Stein, foi orientado a ser mais flexível com relação
às exigências, fixando-se somente
no adiamento do segundo turno.
Stein passou a jogar favoravelmente ao acordo e voltou atrás na
decisão de interromper os trabalhos da missão observadora da
OEA. Chegou a participar do teste
do sistema eletrônico de cômputo
dos votos na quarta e emitiu nota
elogiando sua confiabilidade.
A articulação da proposta brasileira foi torpedeada na quinta pelo JNE (corte suprema eleitoral
peruana, controlada politicamente pelo presidente Fujimori) com
o anúncio de que o segundo turno
seria mantido na data de hoje.
Ontem, o governo brasileiro divulgou nota oficial sobre a eleição
peruana, na qual disse estar
"acompanhando com preocupação a evolução dos fatos" no país.
Afirmou ter feito "contatos com
os principais atores políticos no
Peru e com a OEA" e salientou
que espera que o processo eleitoral respeite a democracia e "reflita
a vontade do povo peruano".
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