São Paulo, quinta, 29 de janeiro de 1998

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NO CONTRA-ATAQUE
Presidente viaja pelo país em clima de campanha e destaca agenda social; avião atola na lama
Crise faz Clinton recorrer a populismo

CARLOS EDUARDO LINS DA SILVA
de Washington


Uma semana depois do início do mais grave escândalo de sua administração, o presidente dos Estados Unidos, Bill Clinton, entrou em ritmo de campanha para preservar sua Presidência, defendendo uma plataforma política populista, com ênfase na missão social do governo.
Com sua mulher, Hillary, voltando à carga pela TV contra a "extrema direita" que, segundo ela, "conspira para reverter o resultado de duas eleições", Clinton foi para o interior do país ontem repetir os temas do seu discurso de terça sobre o estado da União.
No campus da Universidade de Illinois, em Champaign, Clinton e seu vice, Al Gore, fizeram inflamados discursos em favor da ampliação da previdência social, de mais creches em locais de trabalho, do aumento do salário mínimo, da diminuição do número de alunos por sala de aula, da proteção ao meio ambiente, temas tradicionais de seu partido, o Democrata, mas que haviam sido abandonados por eles nos últimos anos.
A estratégia do casal Clinton está funcionando bem, de acordo com as pesquisas de opinião pública, que mostram crescimento no nível de confiança da população no presidente e encolhimento do número de norte-americanos que acreditam que ele tenha cometido crimes no caso de Monica Lewinsky.
Mas os problemas de Clinton estão muito longe de superados. Lewinsky, a moça que contou a uma amiga ter feito sexo com o presidente e depois ter sido pressionada por ele para mentir sobre o caso, ainda pode fazer um acordo com o promotor independente do caso, Kenneth Starr, para contar sua história em juízo.

Atolado
Um incidente menor, mas cheio de simbolismo, atrapalhou Clinton ontem. Seu avião ficou atolado na lama quando se preparava para deixar Champaign com destino a La Crosse (Wisconsin), onde continuaria sua maratona populista.
O avião não era o Boeing 747 em que ele geralmente voa, e sim um Boeing 707, preferido ontem porque as pistas do aeroporto de Champaign são curtas para o 747. O 707 foi o que levou Richard Nixon de Washington para a Califórnia após a sua renúncia, em 1974.
Em entrevista à rede ABC de TV, Hillary Clinton disse ser "evidente" que "forças profissionais da extrema direita" estão por trás das acusações contra seu marido e pediu que sejam "investigadas" as "curiosas relações entre pessoas e entidades" envolvidas no caso.
Segundo pesquisa da mesma rede ABC, 46% dos entrevistados acreditam que o caso Monica Lewinsky seja o produto de uma "conspiração da extrema direita", como alega Hillary Clinton.
Se Lewinsky contar a Starr em juízo o mesmo que disse à amiga e se o promotor provar que sua história é verdadeira, Clinton poderá ser indiciado por falso testemunho (porque acredita-se que ele tenha negado ter feito sexo com ela no depoimento que deu no processo em que é acusado de assédio sexual por Paula Jones) e obstrução da Justiça. Os dois crimes podem levar à abertura de um processo de impeachment contra o presidente.

Confiança em alta
Depois do discurso de Clinton na terça-feira, no qual ele não tocou no caso Lewinsky, diminuiu dramaticamente o número de norte-americanos que acreditam na possibilidade de ele ter cometido esses crimes: de 62% no dia 23 para 49%, segundo a ABC.
Outra pesquisa, da rede de TV CNN, mostra que 78% dos entrevistados diziam confiar em Clinton anteontem.
O discurso sobre o estado da União, exibido ao vivo pela TV, recebeu aplausos generalizados, até dos adversários do presidente, pela forma descontraída, incisiva e dignificada com que foi proferido.
Se Starr não tiver evidências ou testemunhas com credibilidade para provarem as acusações, o discurso pode ter iniciado mais uma vitória do "garoto da volta por cima", um dos apelidos de Clinton.



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