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Capital se revolta com ataques contra civis
DO ENVIADO A BAGDÁ
O senhor gorducho, de 40 e tantos anos, muitos quilos e poucos
cabelos, não quis se identificar e
nem precisava: suas intenções
eram mais do que claras. Enquanto a imprensa visitava uma cratera provocada por um míssil da
coalizão anglo-americana que por
algum defeito não explodiu ao
atingir o solo ontem, ele pulou no
centro do buraco e pareceu procurar algo no chão.
Ignorando as ordens dos policiais e dos soldados que estavam
no local e que temiam por sua segurança -afinal, o armamento
havia sido lançado havia menos
de duas horas, e o impacto que
causou fez tremer diversos edifícios próximos do alvo, a sede da
companhia telefônica estatal iraquiana-, ele alcançou uma pedra no chão e passou a escrever
rapidamente no que sobrara do
asfalto.
"Abaixo Bush! Abaixo a América!" foram as frases grafadas. Terminado o protesto, o iraquiano
foi retirado do buraco sob aplauso
de seus pares.
O manifestante anônimo está
cada vez mais acompanhado. A
cada alvo civil que é atingido por
engano pela coalizão de britânicos e norte-americanos e a cada
alvo misto (de função tanto civil
quanto militar, como as companhias telefônicas de ontem), parece crescer rapidamente o apoio
que a população civil iraquiana
oferece à resistência contra os invasores.
"Eu sou um técnico de telefonia,
trabalhava aqui neste prédio destruído, mas agora, se for convocado, luto na hora", disse à Folha
Salam Ali, iraquiano que espiava
o estrago feito pelos Tomahawk
no lugar conhecido como Torre
Saddam.
Resistência
"Não estou sozinho, pode bater
nas portas de todas estas casas
que cercam esta torre e agora estão sem telefone, depois de quase
morrerem de susto durante a madrugada. Pergunte se elas vão lutar contra os invasores ou recebê-los de braços abertos", disse Salam Ali.
Com ele obviamente está de
acordo o ministro da Defesa do
Iraque, o general Sultan Hashem
Ahmad.
"Nós não nos surpreenderemos
se os inimigos cercarem Bagdá
em cinco ou dez dias, mas eles terão de entrar na cidade", disse o
general Ahmad. "E Bagdá não será tomada por norte-americanos
ou britânicos enquanto seus cidadãos estiverem vivos dentro dela", disse.
"Terror nos corações"
Nas diversas mesquitas espalhadas pela cidade, especialmente
cheias devido ao feriado muçulmano que acontece às sextas-feiras, a mensagem não era muito
diferente.
A ordem do dia eram lutar na jihad, a guerra santa do Islã, contra
os Estados Unidos. Durante toda
a manhã, a TV estatal transmitiu
o discurso de um dos principais
líderes religiosos da capital do Iraque, o imã Abdel-Ghafour Al-Quisi.
"Que Deus instale o terror nos
corações de nossos inimigos e
mande contra eles soldados invisíveis", disse Abdel-Ghafour Al-Quisi.
"Eles vão morrer no inferno
porque se lançaram numa agressão contra uma nação muçulmana", completou o líder religioso
iraquiano. A seu lado, descansando no púlpito, seu rifle Kalashnikov era tão eloquente quanto suas
palavras. A maioria da população
iraquiana segue a religião muçulmana.
(SÉRGIO DÁVILA)
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