|
Próximo Texto | Índice
PODER NACIONALISTA
"Guru" da organização paramilitar que originou o BJP, que está no poder, elogiou Adolf Hitler
Fascismo assombra governo indiano
PETER POPHAM
do "The Independent", em Nova Déli
Quando o novo governo indiano, liderado pelo Partido Bharatiya Janata (BJP, nacionalista hindu), foi empossado este mês, o
mundo recebeu a notícia sem alarde. O premiê britânico, Tony
Blair, foi um dos primeiros a congratular o seu novo colega indiano, Atal Behari Vajpayee.
Mas Abheek Barman, colunista
do jornal "Economic Times", de
Nova Déli, ofereceu um cenário
nada otimista. Barman apontou
que a chegada dos nazistas ao poder na Alemanha foi tão rápida
quanto a do BJP na Índia. E que
nas eleições de março de 1933, depois das quais Hitler rasgou a
Constituição e assumiu poderes
ditatoriais, o partido nazista tinha
obtido menos de 44% dos votos.
O que pode impedir a Índia de
seguir o caminho da Alemanha?
Ninguém em Nova Déli acredita
que isso vá acontecer. O governo,
apoiado por 21 parceiros, é provavelmente fraco demais para tentar
qualquer coisa tão drástica.
Além disso, a Índia não está
mergulhada no tipo de crise que
engoliu a República de Weimar.
Mas essas palavras tranquilizadoras não devem ofuscar o fato de
que, com a chegada do governo
nacionalista, a Índia está entrando
em águas turvas e desconhecidas.
O BJP não é um partido como os
outros. É o braço político de uma
organização paramilitar fundada
há 73 anos chamada Rashtriya
Swayamsevak Sangh (Associação
de Voluntários Nacionais) ou RSS,
que, em seu site na Internet
(http://www.rss.org), se descreve
como "a fonte do renascimento
nacional". É a consciência do BJP.
A RSS é facilmente descartada
como uma piada. Isso se deve
principalmente ao insólito vestuário de seus membros: bermudas
cáqui e bengalas de bambu os fazem mais parecidos com escoteiros crescidos do que com nazistas.
Mas a RSS se leva muito a sério.
Seu crescimento durante as últimas décadas do regime colonial
britânico foi uma tentativa de fazer aos hindus o que Mussolini e
Hitler estavam fazendo à Itália e à
Alemanha: evocar uma era dourada e desaparecida de força e pureza nacionais, forjar uma união popular identificando e estigmatizando inimigos nacionais e formar uma base para a tomada do
Estado criando um corpo paramilitar dedicado e fanático.
"Nossa história nos diz que houve uma época em que nosso país
era livre e próspero, atingindo elevados patamares em todos os aspectos da vida", declara o site.
"Mas ele foi derrotado e humilhado por um punhado de invasores estrangeiros. Vários defeitos
graves assolaram nosso corpo nacional e corroeram nossa força interna, tornando nosso país presa
fácil para agressores externos."
A maior obsessão da RSS tem sido o "problema muçulmano": o
que fazer com os cerca de 11% da
população indiana de fé islâmica.
Madhav Gowalkar, primeiro líder da RSS, conhecido simplesmente como "guru", se inspirou
em Hitler para resolver o seu próprio "problema semítico": "Para
manter a pureza de sua nação e
sua cultura, a Alemanha chocou o
mundo ao eliminar sua raça semítica, os judeus", escreveu.
"O orgulho nacional em sua plenitude foi exibido ali. A Alemanha
também demonstrou como é impossível raças e culturas diferentes
se assimilarem... O povo não-hindu do Hindustão (Índia) deve
...aprender a reverenciar a religião
hindu, deve deixar de ser estrangeiro ou deve ficar no país sem reivindicar nada, nem mesmo os direitos de cidadão."
Muçulmanos e outras minorias
continuam sendo a obsessão do
BJP. O mais polêmico e importante artigo do programa do partido,
retirado da agenda nacional por
pressão dos aliados, continua sendo a construção de um grandioso
templo hindu em Ayodhya, o suposto local de nascimento do Deus
hindu Rama, no lugar de uma
mesquita destruída por fanáticos
hindus em dezembro de 1992.
Mas mais temerários são alguns
fatos que passaram quase desapercebidos. Ativistas da RSS já começaram a intimidar missionários
cristãos e convertidos -tentando
reconvertê-los ao hinduísmo.
No início do mês, um encontro
religioso de quatro dias em Gujarat teve de ser cancelado no primeiro dia após ativistas hindus terem incendiado um carro e apedrejado participantes.
Agressões desse tipo vão se tornar mais comuns agora que o BJP
está no poder. A Justiça pode fazer
vista grossa. Uma mídia cada vez
mais simpática ao partido irá fingir que nada vê. E a Índia, famosa
por sua diversidade e tolerância,
se tornará um pouco mais cruel,
um pouco mais perversa. E isso é o
melhor que se pode esperar.
Tradução de Sérgio Malbergier
Próximo Texto | Índice
|