São Paulo, segunda-feira, 29 de abril de 2002

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Cohn-Bendit qualifica de absurdo boicote de Jospin a atos anti-Le Pen

DO "LE MONDE"

"Isso não é apenas chocante, mas absurdo e até idiota". É assim que Daniel Cohn-Bendit, deputado verde no Parlamento Europeu pela França, qualificou o fato de o premiê francês, Lionel Jospin, ter pedido a seus ministros que não participem das manifestações anti-Le Pen programadas para o 1º de Maio. Cohn-Bendit, que foi um dos principais líderes do movimento estudantil de maio de 68 na França, falou ao jornal "Le Monde" sobre a atual situação política na França.

Le Monde - O senhor acha que Lionel Jospin demorou para pedir aos franceses que "exprimissem, pelo voto, a sua rejeição à extrema direita" sem citar Jacques Chirac?
Cohn-Bendit -
Eu compreendo que Lionel Jospin tenha precisado de tempo para refazer-se e assumir sua derrota pessoal. Mas é um erro que ele só tenha falado em "rejeição à extrema direita" implicitamente, às escondidas, e de longe. Sua responsabilidade era pedir explícita e publicamente, pelo rádio, pela TV e nas ruas, o voto para Jacques Chirac. Acho que ele ainda não se reencontrou. Fiquei indignado com o fato de ele ter pedido a seus ministros para não se manifestarem no dia 1º de Maio contra a Frente Nacional. Isso não é apenas chocante, mas absurdo e até idiota.

Le Monde - O senhor afirmou no "Libération" de 26 de abril que teria votado em Jospin no primeiro turno se tivesse podido prever o resultado. Isso significa que os verdes não deveriam ter lançado candidato no primeiro turno?
Cohn-Bendit -
É claro que deveriam. Eu fiz campanha para Noël Mamère. Minha afirmação foi uma reação do coração. A razão política me leva a apoiar Noël, mas a emoção, vendo que Lionel Jospin não passou para o segundo turno, me leva a afirmar hoje que eu teria votado nele. A verdadeira questão é: por que o PS não conseguiu mobilizar seu eleitorado? Lionel Jospin poderia ter conseguido os 200 mil votos necessários para estar no segundo turno, se tivesse mobilizado suas tropas.

Le Monde - O senhor não considera, como muitos outros, que o grande número de candidatos de esquerda fez Jospin perder?
Cohn-Bendit -
Colocou-se a carroça na frente dos bois. Se o PS, dois anos atrás, tivesse decidido introduzir um pouco de proporcionalidade nas eleições legislativas, teria sido possível e desejável uma candidatura única da esquerda. A partir do momento em que os partidos políticos não têm outra alternativa para medir sua audiência real na sociedade, o primeiro turno da eleição presidencial se torna logicamente a alternativa ao sistema proporcional.

Le Monde - Esse sistema também favoreceria a extrema direita...
Cohn-Bendit -
Eu sou um democrata. Não posso recusar um sistema mais democrático só porque o partido que eu detesto e que combato também seria beneficiado. O escrutínio majoritário, as instituições da 5ª República, não impediram a França de perder-se na situação que todos conhecemos.

Le Monde - E como fica a situação se Chirac for eleito por um votação esmagadora?
Cohn-Bendit -
O sonho seria que houvesse 90% dos votos contra a guilhotina, o ódio, a intolerância, o racismo, o anti-semitismo, a cancerização [em francês, esses termos formam um acróstico para Chirac]. Esse resultado ultrapassaria por ampla margem a direita e daria aos franceses o poder de reequilibrar a República nas eleições legislativas, em junho.

Le Monde - É plausível que haja mais cinco anos de coabitação?
Cohn-Bendit -
Concedo que isso exigiria uma reviravolta política que é muito difícil. A esquerda precisaria reaprender, e em velocidade máxima, a colocar-se à escuta da sociedade, precisaria reinventar um reformismo libertário que ela perdeu.


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