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DIREITOS HUMANOS
Relatório da entidade diz que o mundo ficou mais perigoso porque o direito internacional foi subestimado
Anistia critica a guerra americana ao terror
MARIA LUIZA ABBOTT
FREE-LANCE PARA A FOLHA, DE LONDRES
A guerra ao terrorismo tornou o
mundo mais perigoso, segundo a
Anistia Internacional, que ontem
divulgou seu relatório anual sobre
o abuso de direitos humanos no
mundo em 2002. A entidade fez
duros ataques à política do governo americano. Segundo a Anistia,
as pessoas, hoje, estão mais inseguras do que em qualquer momento desde o fim da Guerra Fria.
"A guerra ao terrorismo, longe
de tornar o mundo um lugar mais
seguro, tornou-o mais perigoso,
ao reduzir os direitos humanos,
ao subestimar as normas da legislação internacional e ao impedir o
exame aprofundado dos governos", diz o relatório.
Para a entidade de defesa dos direitos humanos, o esforço contra
o terror aprofundou as tensões
entre pessoas de religiões e origens diferentes, lançando "sementes para mais conflitos". O resultado é "medo genuíno". A secretária-geral da Anistia, Irene
Khan, acusou os EUA de terem
adotado uma "doutrina de direitos humanos à la carte".
"Os EUA continuam a escolher
quais de suas obrigações dentro
da legislação internacional vão
usar", disse Khan na apresentação do relatório, em que criticou a
situação dos suspeitos de terrorismo que estão presos, sem acusação formal, na base americana de Guantánamo (Cuba).
"O que era inaceitável antes de
11 de setembro de 2001 agora está
se tornando norma", disse ela.
Segundo a Anistia, em tempos
de maior insegurança, governos
como o dos EUA escolheram ignorar um sistema de segurança
coletiva representado pela legislação internacional.
A organização não contesta o
direito de os governos agirem
contra a violência criminosa e política por grupos e indivíduos armados. "Pelo contrário, apelamos aos governos para protegerem as
pessoas de acordo com a lei", diz o
relatório, acrescentando que a
Anistia condena os ataques de
grupos armados contra civis como "grave abuso" dos direitos
humanos. "No entanto os abusos
de direitos humanos cometidos
por grupos armados não são uma
licença para os governos esquecerem suas obrigações. Os governos
não têm legitimidade para responder ao terror com terror."
Para a secretária-geral, é vital resistir à manipulação do medo e
desafiar o estreito foco da agenda
de segurança. "A definição de segurança deve ser ampliada para
incluir a segurança das pessoas,
assim como a dos países", disse.
Irene Khan disse que a comunidade internacional não tem do
que se orgulhar por seu desempenho no Afeganistão, porque "promessas de paz e justiça foram quebradas" e essa situação pode
se repetir no Iraque. Ela sublinhou que, semanas depois do fim
do conflito no Iraque, problemas
não foram resolvidos e que, "se
continuarem os atritos entre o povo iraquiano e as forças de ocupação, a situação pode se deteriorar
rapidamente".
A Anistia reconhece que a situação dos direitos humanos no Afeganistão melhorou desde a instalação do novo governo em substituição ao Taleban, no fim de 2001.
Mas alerta que, 18 meses depois
do fim da guerra, milhões de afegãos, incluindo refugiados forçados a retornar, enfrentam um futuro incerto e inseguro. Segundo
a secretária-geral, fora de Cabul a
insegurança e as disputas entre
diferentes grupos estão voltando
aos níveis que eram antes da chegada do Taleban ao poder, em 96.
A organização argumenta que a
guerra no Iraque dominou a
agenda do mundo, enquanto ficaram "esquecidos" conflitos que
provocaram pesadas perdas em
vidas e direitos humanos em diferentes partes do mundo, como os
da Colômbia, da Costa do Marfim, da Tchetchênia, do Burundi
ou do Nepal. Na Colômbia, segundo a Anistia, "desde 1985,
mais de 60 mil pessoas foram
mortas, 80% delas civis, e centenas de milhares foram desalojadas, torturadas e sequestradas ou estão desaparecidas".
O relatório também denuncia
que os governos gastaram "bilhões" em um esforço para reforçar a segurança nacional e a guerra contra o terrorismo. No entanto, "para milhões de pessoas, a
verdadeira fonte de insegurança
são os sistemas policiais e de Justiça corruptos e ineptos, a repressão brutal à dissidência política, a dura discriminação e as iniquidades sociais", diz a organização.
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