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GUERRA AO TERROR
Suprema Corte reconhece direito de "combatentes inimigos" apelarem para tribunais americanos
Justiça dos EUA aceita casos de Guantánamo
RAFAEL CARIELLO
DE NOVA YORK
A Suprema Corte dos Estados
Unidos decidiu ontem que prisioneiros americanos e estrangeiros
acusados de terrorismo podem
recorrer à Justiça americana para
questionar sua detenção.
A decisão limita a capacidade
do governo de George W. Bush de
manter presos e interrogar supostos terroristas indefinidamente,
sem lhes permitir acesso a advogados ou à Justiça, e, muitas vezes,
sem apresentar acusações formais
contra os detidos.
"A história e o bom senso nos
ensinam que um sistema de detenção sem questionamento carrega consigo o potencial de se tornar um meio de opressão e de
abuso", disse a juíza Sandra Day
O'Connor.
"Combatentes inimigos"
A Casa Branca argumentava
que todos os casos analisados ontem se referiam a "combatentes
inimigos", aos quais não se aplicariam os direitos tradicionais de
prisioneiros de guerra nem as
proteções constitucionais garantidas a suspeitos de cometerem
crimes nos EUA.
O argumento da administração
Bush era o de que apenas o presidente teria autoridade para ordenar prisões desse tipo, e que a Justiça não teria o direito de limitar a
autoridade do presidente na guerra contra o terror.
A prática era uma das principais
bases da guerra da Casa Branca
contra o terrorismo e também
uma das mais criticadas no governo Bush por organizações de defesa dos direitos humanos nos
EUA e em outros países.
A Suprema Corte analisou três
casos específicos: o de presos estrangeiros na base americana de
Guantánamo, em Cuba, o do preso americano Yaser Esam Hamdi
e o do também americano José
Padilla.
No mais importante desses casos, a Suprema Corte decidiu, por
6 votos contra 3, que os cerca de
600 prisioneiros de Guantánamo
têm o direito de recorrer à Justiça
americana para questionar supostas prisões ilegais e violações
de seus direitos. Os juizes não entraram no mérito de nenhum caso específico.
"O que está em questão é apenas
se cortes federais têm jurisdição
para determinar a legalidade da
detenção por tempo indeterminado por parte do Executivo de indivíduos que alegam ser absolutamente inocentes", disse o juiz
John Paul Stevens no texto sobre
o voto da maioria.
"As decisões históricas de hoje
representam um forte repúdio ao
argumento do governo de que
suas ações na guerra ao terrorismo encontram-se fora do alcance
da lei e incapazes de serem revistas por cortes americanas", disse
Steven Shapiro, representante da
organização União Americana
pelas Liberdades Civis.
Michael Ratner, do Centro pelos
Direitos Constitucionais, grupo
que levou o caso de Guantánamo
à Suprema Corte, declarou que a
decisão representa "uma enorme
vitória para o Estado de Direito".
Advogados do grupo afirmaram que pretendem entrar em
contato com os prisioneiros da
base de Guantánamo ao longo da
semana.
Na segunda decisão, a Suprema
Corte determinou, por 5 votos a 4,
que o Executivo tem a autoridade
para manter preso o cidadão
americano Yaser Hamdi, preso
no Afeganistão e suspeito de ter
lutado ao lado do Taleban. Mas,
na segunda parte da decisão, por 8
votos a 1, o órgão máximo do Judiciário afirmou que Hamdi pode
recorrer à Justiça para questionar
a sua prisão.
Apenas o mais conservador entre os membros da Suprema Corte, o juiz Clarence Thomas, concordou inteiramente com os argumentos do governo Bush.
O americano e muitos dos detidos de Guantánamo foram feitos
prisioneiros no Afeganistão entre
o fim de 2001 e o início de 2002.
Têm sido mantidos presos praticamente sem acesso ao mundo
exterior.
Hamdi e alguns poucos presos
tiveram recentemente autorização para serem representados por
advogados, mas nenhum dos prisioneiros pôde receber visitas de
familiares.
Num terceiro caso, a corte decidiu apenas sobre um aspecto formal do processo contra o suspeito
de terrorismo José Padilla, também cidadão americano, afirmando que ele deveria levar seu
caso ao Estado da Carolina do Sul,
e não a Nova York, como teriam
tentado fazer seus advogados inicialmente. A corte não entrou no
mérito de Bush poder ou não
mantê-lo preso.
O virtual candidato democrata à
Presidência dos EUA, John Kerry,
elogiou a decisão da Suprema
Corte. "Gostaria que essa administração tivesse feito o que fazia
sentido anos atrás e que está de
acordo com os valores e o espírito
do nosso país", disse.
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