São Paulo, segunda-feira, 29 de julho de 2002

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Fragilidade torna-se marca do fim de papado

FRANK BRUNI
DO "THE NEW YORK TIMES", EM TORONTO

Já foi bastante diferente. O papa João Paulo 2º, que atravessou o globo com frequência e entusiasmo diferentes de qualquer um de seus predecessores, participava de três ou quatro eventos grandes a cada dia de viagem. Mas, na semana passada, durante a sua primeira visita à América do Norte em mais de três anos, ele passou mais tempo em reclusão do que à vista do público.
O que os americanos observaram imediatamente foi um papa tão diminuído fisicamente que os oficiais da igreja ficavam nervosos a cada pequeno vacilo em seu vigor. "A sensação que se tem", disse o porta-voz do papa, Joaquín Navarro-Valls, "é de que o que você está vendo é uma alma empurrando um corpo". Chegou-se a um ponto onde essa imagem define em grande parte o atual momento do papado de João Paulo 2º e ofusca outros aspectos.
Para alguns, a pergunta é se o papa, de 82 anos, permanece em condições de lidar com os desafios da igreja, incluindo os crescentes relatos de abuso sexual de crianças por padres.
"Admiro sua determinação, mas creio que possa ser melhor se ele renunciar", disse Andrew Greeley, sociólogo e escritor católico dos EUA. "Não se pode ser tão vigoroso quanto um papa precisa ser quando se está com artrite, mal de Parkinson e sequelas de uma tentativa de assassinato."
O escândalo de abuso sexual de crianças por integrantes da Igreja Católica eclodiu nos EUA, onde está tendo grande repercussão. Mas o papa, durante sua atual viagem, apenas sobrevoará o país hoje, quando prosseguir rumo à Guatemala e ao México.
Os EUA nunca fizeram parte de seus planos de viagem, centrados nas Jornadas Mundiais da Juventude, no Canadá. Segundo o Vaticano, isso aconteceu devido à avaliação de que as dimensões do problema de abuso sexual foram exageradas. Mas a saúde do papa foi levada em consideração.
Em Roma, a rotina também foi modificada. De acordo com funcionários do Vaticano, frequentemente, ele recebe bispos estrangeiros em grupos de cinco, e não um de cada vez, como antes.
Mas Navarro-Valls diz que o papa está firme no comando da igreja e considerou insignificante o momento curioso na quinta-feira, quando João Paulo 2º declarou erroneamente que as últimas Jornadas da Juventude ocorreram na Polônia. Na verdade, elas foram realizadas em Roma.
Mas, para os adolescentes que foram a Toronto, a fragilidade do papa serviu de estímulo, pois muitos mencionaram a possibilidade de o papa não sobreviver por muito mais tempo como um incentivo extra para ir ao Canadá.
Oficiais da igreja se esforçaram para relatar as atividades de João Paulo 2º de forma a descrevê-lo como mentalmente vibrante. Não puderam negar a postura curvada do papa ou as expressões frequentemente vagas, mas tentaram mostrar sua fragilidade de forma positiva.
O cardeal Oscar Rodríguez Maradiaga, de Honduras, frequentemente mencionado como possível sucessor do papa, disse que ele "está mostrando como é possível cumprir uma missão, até o fim, com coragem e amor". Meses atrás, o cardeal dissera que o papa "teria a coragem" de renunciar se a sua saúde piorasse, mas, na semana passada, disse que era "melhor não falar sobre isso".
Seus comentários mostram a dificuldade para acessar informações sobre a saúde do papa. As próprias palavras do papa sugerem que ele vê o sofrimento como desejo de Jesus. Então ele segue em frente. Em agosto, deve ir à Polônia. Há a possibilidade de uma viagem em janeiro para as Filipinas. Seria uma viagem longa e árdua. Mas, segundo Navarro-Valls, "ele deseja ir".


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