São Paulo, domingo, 29 de agosto de 2004

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CÁUCASO

Candidato apoiado pelo Kremlin lidera a disputa; temor de ataques põe a região, em guerra desde 1999, em alerta máximo

Tchetchênia escolhe presidente sob ameaça rebelde

SOPHIE SHIHAB
DO "LE MONDE"

Em agosto de 1999, ataques tchetchenos contra o vizinho Daguestão serviram de pretexto à "segunda" guerra da Tchetchênia, a do presidente russo, Vladimir Putin, com o objetivo de liqüidar em meses toda a resistência ao domínio russo sobre o norte do Cáucaso.
Cinco anos depois, numa Tchetchênia exangue e oficialmente normalizada, as coisas não parecem ter mudado muito: 100 mil soldados posicionados no país "liqüidam" regularmente os "últimos mil bandidos" que ainda atacam as repúblicas vizinhas, em apoio aos mujahidin locais.
No final de junho, cerca de 600 deles tomaram o controle da Inguchétia. Em 12 de julho, a grande cidade tchetchena de Avtoury passou 12 horas sob controle dos combatentes rebeldes.
Em agosto, surgiram novos alertas no Daguestão e em Kabardino-Balkarie, seguidos por uma grande operação noturna em Grozni, a capital tchetchena, supostamente inatingível pelas forças rebeldes.
O ataque, conduzido uma semana antes do novo simulacro de eleição presidencial de hoje, era um recado claro: é preciso levar a sério as promessas rebeldes de lutar "até a vitória".
Segundo o diário russo "Izvestia", citando um telegrama cifrado do ministro do Interior às suas unidades na região, os combatentes pela independência conseguiram "restabelecer completamente a coordenação de seus bandos armados".
Enquanto isso, as forças russas continuam "mal coordenadas" e lutam de maneira medíocre porque seus homens "não querem morrer" e não confiam nos "soldados complementares" tchetchenos com quem dividem as trincheiras.
Para oficiais entrevistados pelo jornal, as forças russas já perderam a "guerra psicológica", ou "ideológica", enquanto a população, "por livre vontade ou à força, apóia os rebeldes".
Na verdade, o conjunto da população tchetchena nem de longe apóia os líderes rebeldes, quer seja o radical Chamil Bassaev, ou o moderado presidente Aslan Maskhadov. Mas, excetuados os clãs pró-russos envolvidos na administração local, os tchetchenos em geral apóiam a idéia da guerra, chamada ali de "ghazzawhat": contra o invasor.

Eleições
Cinco anos de guerra -sete, se contada a "primeira" guerra tchetchena, a do presidente Boris Ieltsin (1991-99)- não serviram para nada, a não ser provocar a eleição e a reeleição de presidentes sem poder, ao custo de milhares de vítimas.
Na votação de hoje, o "favorito" é Alu Alkhanov, egresso das fileiras da polícia e que sempre lutou no lado russo na Tchetchênia -ao contrário de seu predecessor, o ex-líder rebelde Akhmad Kadyrov, assassinado em maio num atentado a bomba.
Alkhanov concorre com outros seis candidatos considerados simbólicos, numa disputa questionada. "Todas as eleições até hoje na Tchetchênia foram ilegítimas", disse Sergei Kovalyov, ativista de direitos humanos russo. "Como se pode expressar o direito ao voto quando todas as ruas estão bloqueadas e a movimentação é restrita?"
Apontada pelo Kremlin como um passo na restauração da ordem, a votação acontece sob ameaça de ataques -temor reforçado após a queda, na última terça-feira, de dois aviões, supostamente derrubados por rebeldes.
Para garantir a segurança na região, cerca de 17 mil militares e policiais foram colocados em alerta máximo, com ordens para atirar contra pessoas mascaradas.


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