São Paulo, quarta-feira, 29 de setembro de 2004

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ÁSIA

De acordo com a Human Rights Watch, senhores da guerra fazem campanha de intimidação para consolidar seu poder

Eleição afegã está ameaçada, afirma ONG

MÁRCIO SENNE DE MORAES
DA REDAÇÃO

Vista pelos EUA como símbolo do início da democratização do Afeganistão -país virtualmente destruído por mais de 20 anos de guerras-, a eleição presidencial será dominada pela influência dos senhores da guerra, que fazem uma campanha de intimidação de eleitores e de candidatos para consolidar seu poder, segundo relatório publicado ontem pela Human Rights Watch (HRW).
"Os senhores da guerra ainda têm muito poder no interior, pois não foram desarmados. O governo central praticamente só controla Cabul [capital]. Em regiões rurais, os eleitores afirmam que têm recebido "visitas" de milicianos fiéis a diferentes líderes locais, que os aconselham a votar neste ou naquele candidato a presidente", explicou à Folha Brad Adams, diretor para a Ásia da organização de defesa dos direitos humanos.
"Muitos militantes políticos e representantes de organizações não-governamentais afegãs temem que sua vida possa estar em perigo por conta de suas ações para conscientizar a população, visando a uma eleição presidencial mais justa", acrescentou Adams.
De fato, em seu texto, a HRW expõe o modo como eleitores de diversas áreas afegãs não conseguem entender as cédulas ou não confiam nelas, são ameaçados por milicianos e até recebem suborno para favorecer certos candidatos. O pleito está marcado para 9 de outubro próximo, mas a situação de segurança no Afeganistão ameaça prejudicar sua realização.
O relatório de 52 páginas, intitulado "A Lei do Fuzil: Abusos dos Direitos Humanos e Repressão Política às Vésperas da Eleição Presidencial do Afeganistão", sustenta que facções armadas, incluindo grupos que contam com o apoio dos EUA, fazem uso de "força, ameaças e corrupção para controlar o processo eleitoral".
Milhões de afegãos se registraram para participar da votação. Contudo o número exato de eleitores ainda não foi divulgado oficialmente. Além da pressão dos senhores da guerra, a população sofre ameaças de combatentes do Taleban, grupo deposto por uma coalizão liderada pelos EUA após o 11 de Setembro porque abrigava Osama bin Laden e seus asseclas.
"O Taleban ainda constitui uma ameaça no sul do Afeganistão, na região que faz fronteira com o Paquistão. Todavia o principal problema do país é a influência dos senhores da guerra, sobretudo no norte e no oeste", analisou Olivier Roy, do Centro de Estudos e de Pesquisas Internacionais (Paris).
No norte afegão, de acordo com a HRW, funcionários da ONU e de agências humanitárias, além de políticos locais, afirmaram que combatentes fiéis a dois candidatos a presidente -os senhores da guerra Abdul Rashid Dostum e Mohammed Mohaqeq- ameaçaram líderes regionais para ter certeza de que a população votará conforme seus "conselhos".
Num estádio de Shiberghan, reduto de Dostum, dezenas de simpatizantes de sua candidatura, a maioria de origem uzbeque, reuniram-se ontem para participar de um raro evento de campanha. Esta tem sido minada pela ausência de condições de segurança razoáveis no interior do país.
Recentemente, o presidente Hamid Karzai, que, segundo pesquisas, deverá obter a reeleição, lançou uma ofensiva contra alguns poderosos senhores da guerra, como Ismail Khan, ex-governador da Província de Herat. De acordo com Adams, porém, a iniciativa é "positiva, mas limitada".


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