São Paulo, sexta-feira, 30 de abril de 2010

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Estado de exceção abala comércio paraguaio

Presença de militares em Pedro Juan Caballero afasta os consumidores de Ponta Porã (MS), do outro lado da fronteira

Prefeito culpa narcotráfico brasileiro pela insegurança na cidade e diz que, se o governo não agir, local vai virar nova Ciudad Juárez


Orisvaldo Sales/Folha Imagem
Brasileiros que dizem ter sido expulsos do Paraguai vivem em condições precárias em acampamento na beira da BR-163, em MS

GUSTAVO HENNEMANN
ENVIADO ESPECIAL A PEDRO JUAN CABALLERO (PARAGUAI)

O estado de exceção que entrou em vigor em cinco departamentos do Paraguai no último fim de semana afugentou turistas e calou a noite da cidade de Pedro Juan Caballero, capital do departamento de Amambay, localizada na fronteira com o Brasil. Ontem, as centenas de lojas que vendem roupas e eletrônicos a brasileiros viram seu movimento reduzido à metade, segundo os comerciantes.
Separada da cidade brasileira de Ponta Porã (MS) por apenas uma rua, Pedro Juan Caballero funciona como um grande atacado comercial para sacoleiros e um entreposto para traficantes de drogas. A cada esquina se encontra uma casa de câmbio. As lojas, que são praticamente emendadas uma na outra, mantêm seguranças privados, armados invariavelmente de espingardas calibre 12.
Apesar de mais grave hoje, a sensação de insegurança não é nova. Em uma praça do centro, o busto de um jornalista lembra seu assassinato em 1991. Foi morto a tiros por narcotraficantes por "falar demais", segundo moradores da cidade.
"Aqui sempre foi terra de ninguém. É só cruzar uma rua para escapar da polícia. O Estado só impõe respeito quando manda o Exército. Quando [os militares] se forem, a desordem volta", diz o comerciante coreano Alfredo Chun, 57.
O lojista brasileiro Jorge Gonçalves, 29, que vende eletroeletrônicos na cidade paraguaia, vê desvantagem na presença temporária dos militares. "Para o comércio é negativo. Os brasileiros [clientes] acham que há um clima de guerra e que está tudo dominado pelos traficantes", diz Gonçalves.
Na noite de anteontem, quatro caminhões esparramaram soldados armados pelas principais avenidas. Os carros com música em alto volume e grupos que se reuniam habitualmente para beber cerveja na rua sumiram, segundo os moradores locais.
Ontem, rádios locais explicavam as normas do estado de exceção -que tem como objetivo oficial deter o Exército do Povo Paraguaio, guerrilha que luta contra a concentração fundiária, e não o narcotráfico- e pediam à população para que não realizasse festas ou reuniões.
Ou que pedissem licença à polícia e à prefeitura para fazê-lo. Aproximadamente 200 militares patrulharam ruas e fizeram buscas em condomínios privados na tentativa de capturar envolvidos no atentado contra o senador Robert Acevedo. Na última segunda-feira, sua camionete foi metralhada em Pedro Juan Caballero.
Duas pessoas morreram e Acevedo foi atingido por dois tiros de raspão. Protegido por dez seguranças, ele agora se recupera em casa.
O prefeito da cidade, José Carlos Acevedo, irmão do senador baleado, diz que os comandantes do narcotráfico e responsáveis pelo atentado contra seu irmão são brasileiros, que têm a ação facilitada pela corrupção da polícia paraguaia e pela falta de controle na fronteira seca. Após o atentado contra o senador, a polícia paraguaia deteve quatro brasileiros, suspeitos de terem vínculos com a facção criminosa paulista PCC.
Segundo o prefeito de Pedro Juan Caballero, o presidente do Paraguai, Fernando Lugo, prometeu que o maior efetivo policial e o controle mais duro na fronteira com o Brasil serão mantidos mesmo após o fim do estado de exceção, que tem duração de 30 dias prorrogáveis por mais 30. Ontem, Lugo esteve na cidade para visitar o senador Acevedo e conversar com autoridades locais.
"Aqui 99% das pessoas são trabalhadores. Falta mais presença do Estado. Mas acho que é possível solucionar. Senão, vamos nos tornar uma Ciudad Juárez [cidade mexicana conhecida pelos massacres entre cartéis]", disse o prefeito à Folha em seu escritório particular, vigiado por três seguranças armados com metralhadoras.
Fazendeiro e dono de postos de combustível, José Carlos pertence ao Partido Liberal Radical Autêntico, sigla do vice-presidente paraguaio Federico Franco, atualmente em litígio com Lugo.

Veja perguntas e respostas sobre o estado de exceção no Paraguai

www.folha.com.br/1011914



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