São Paulo, sexta-feira, 30 de setembro de 2005

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TERROR EM LONDRES

Em encontro com comissão que investiga caso, família se "angustia" e reitera que polícia britânica mentiu

Pais vêem filme da morte de Jean Charles

FÁBIO VICTOR
DE LONDRES

Em seu terceiro dia em Londres, a família de Jean Charles de Menezes, o brasileiro morto por engano pela polícia britânica em julho passado, se reuniu ontem por quase quatro horas com a direção da IPCC (Comissão Independente de Reclamações contra a Polícia), que investiga o caso.
Maria Otone de Menezes e Matozinhos Otone da Silva, pais de Jean Charles, e Giovani, irmão dele, assistiram às imagens do circuito interno de TV da estação de metrô de Stockwell, onde o eletricista mineiro foi confundido com um terrorista e baleado sete vezes na cabeça. "Foi muito angustiante ver como o Jean Charles estava relaxado e normal, especialmente à luz do comunicado feito imediatamente após a morte", afirmaram os familiares numa nota divulgada depois do encontro.
As imagens do circuito interno são uma peça crucial da investigação, pois põem por terra a versão inicial da polícia de que a vítima foi alvejada porque vestia um casaco grosso e entrou apressada e nervosa na estação, pulando as catracas na entrada. Vazado possivelmente por algum funcionário da IPCC, o único órgão além da polícia a ter acesso ao seu conteúdo, o vídeo foi a base da reportagem da emissora britânica ITV, que mudou o rumo do caso.
Questionada se reconheceu facilmente o filho nas imagens, Maria de Menezes balançou a cabeça positivamente e chorou. Já Giovani disse estar ainda mais convicto de que a polícia mentiu. "Agora tenho certeza disso." A nota que divulgaram diz ainda que a família ainda tem muitas perguntas a fazer e que o encontro de ontem foi o primeiro de uma série.
Também num comunicado curto, o diretor da IPCC, Nick Hardwick, afirmou ter explicado aos familiares de Jean Charles como a investigação está sendo conduzida e que lhes passou as informações atualizadas sobre o processo, acrescentando que esses dados são confidenciais.
O caso do brasileiro é a maior investigação já produzida pela IPCC, órgão criado no ano passado para investigar reclamações contra a polícia no Reino Unido.
A comissão espera concluir o trabalho até dezembro. A partir do resultado do seu relatório é que a Promotoria definirá se vai levar o caso aos tribunais.
A família do eletricista foi à capital britânica por articulação do escritório de advocacia londrino que a representa no caso, mas a viagem foi paga pela Scotland Yard, que já dera 15 mil libras (cerca de R$ 65 mil) para ajudar a custear o enterro. Chegou-se a divulgar que a oferta foi rejeitada, mas parentes disseram à Folha que o dinheiro foi recebido. Veículos da mídia britânica também têm dado nas últimas semanas contribuições financeiras aos familiares de Jean Charles, normalmente em troca de entrevistas.
Outras reuniões estão previstas para os próximos dias, entre elas um ato público com a presença de parlamentares. Não está descartado um encontro com representantes da polícia, desde que, exige a família, sem a presença de Ian Blair, o comissário policial.
Jornais londrinos publicaram ontem que seis policiais envolvidos na operação que resultou na morte do brasileiro deverão enfrentar um processo disciplinar, algo que facilitaria um futuro indiciamento criminal deles.
Numa entrevista ao "Guardian", o encarregado por operações antiterrorismo da Scotland Yard, Andy Hayman, disse que investigações da polícia revelam que novas células, sem conexões com as que executaram os atentados de 7 de julho, duas semanas antes da morte de Jean Charles, planejam novos ataques à cidade, considerada por ele alvo prioritário de extremistas.
O valor das primeiras indenizações aos feridos nos atentados deverá ser divulgado hoje pelo fundo governamental responsável pelos pagamentos. A iniciativa surgiu depois de a mídia britânica divulgar dramas pessoais de vítimas mutiladas que passam por dificuldades financeiras.


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