São Paulo, sábado, 30 de outubro de 2004

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O IMPÉRIO VOTA - RETA FINAL

Kerry e Bush recorrem a astros da música, do cinema e do esporte para tentar romper o cenário de igualdade às vésperas da votação

Empate leva candidatos a apelo populista

CLÓVIS ROSSI
ENVIADO ESPECIAL À FILADÉLFIA

Como nem a economia produz notícias que desfaçam o persistente empate que as pesquisas mostram entre o presidente George W. Bush e o senador John Kerry, as duas partes lançaram mão do velho e bom populismo na reta final da campanha.
Bush arrastou para seu palanque (em Columbus, capital de Ohio) o ator e governador da Califórnia Arnold Schwarzenegger.
Na véspera, também em Columbus, Kerry exibira ao seu lado o astro do rock Bruce Springsteen, mais conhecido como "The Boss" (o patrão). Piada pronta: "Quando Bush soube que eu estava aqui com "o patrão", ele pensou que era o Dick Cheney", brincou Kerry. É uma alusão ao fato de que o vice-presidente é tido, nas fofocas políticas, como quem de fato manda na Casa Branca.
Sobre a economia, a notícia da sexta-feira foi usada por ambos os lados para festejar, o que parece contraditório, mas não é. Acontece que o crescimento no terceiro trimestre foi de 3,7%. É tão empate quanto o das pesquisas eleitorais, porque foi maior que o do trimestre anterior (3,3%), mas menor que os 4,3% esperados pela maioria dos analistas.
De todo modo, economia está longe de ser o tema central na campanha. O que predomina é o combate ao terrorismo e, por extensão, a Guerra do Iraque. Em segundo lugar, vêm as chamadas questões morais (aborto, casamento gay, células-tronco).
É por isso que o efeito Schwarzenegger, apesar da enorme popularidade do ator, pode ser pequeno ou até contraproducente para Bush. Ele é tido como republicano moderado, que não compartilha da resistência do presidente à pesquisa com células-tronco. Ao contrário, ele a apóia.
O populismo na reta final não se limitou a astros pop. A exemplo do que ocorre no Brasil com os grandes esportistas, Bush e Kerry aproveitaram a final do campeonato de beisebol para fazer propaganda, até com ares de cabala, pelo menos da parte do senador.
Quem ganhou foi o time de Kerry (o Red Socks, de Boston), depois de ficarem 86 anos na fila. Kerry não deixou de lembrar que, no início da campanha, um ouvinte de rádio dissera que o senador só seria presidente depois que o Red Socks fosse campeão.
"Bom, estamos a caminho", brincou o senador, boné com o "B" (de Boston) na cabeça, em comício em Toledo (Ohio).
Aliás, Ohio é tema para outro cabala, embora meio forçada. A mídia americana lembra constantemente que o Estado dá maioria, sempre, para o candidato que acaba ganhando a eleição. Não é bem verdade: em 1960, os eleitores de Ohio preferiram Richard Nixon, e quem ganhou a Presidência foi John Kennedy.
Em todo o caso, Bush está à frente nas pesquisas, dentro de margem de erro, o que para ele é bom sinal: jamais um republicano se elegeu sem ganhar em Ohio.
Esse tipo de superstição, tradicional em políticos de todos os países, mas exacerbado numa eleição tão apertada como a norte-americana, explica outro tipo de apelo de ambas as partes, este para pregadores religiosos -território em que Bush leva enorme vantagem sobre Kerry.
"Com todo o esforço dos músicos para atrair eleitores para os democratas, os pregadores estão fazendo um trabalho melhor que as estrelas do rock", disse ao jornal "Philadelphia Inquirer" Jonathan Trichter, da Pace University, de Nova York.
Religiosidade, aliás, é dos muitos territórios em que a sociedade norte-americana está dividida, de acordo com os dados ontem divulgados por John Zogby, presidente da Zogby International, um dos principais institutos de pesquisa. "Nos Estados vermelhos [maioria republicana], 54% dos eleitores nos dizem que freqüentam um local de oração pelo menos uma vez por semana. Nos Estados "azuis" [democratas], 32% dizem a mesma coisa. É uma diferença de 22 pontos percentuais."
As cenas explícitas de populismo prosseguem hoje, na caça a outro público: a comunidade latina, cada vez mais numerosa.
Os dois candidatos deram entrevistas ao "Sábado Gigante", uma mistura de Faustão com Chacrinha, que vai ao ar pela Univisión, a rede hispânica dos EUA, que diz ser vista por 100 milhões de pessoas, nos próprios EUA, mas também na América Latina.
Para Bush, é um público interessante porque a maioria dos hispânicos vota com Kerry, conforme mostra pesquisa recente do jornal "The Washington Post" e da própria Univisión (59%, contra 30% que preferem Bush).
Esse gigantesco esforço mesmo nos dias finais da campanha é fácil de explicar: a mais recente pesquisa da Zogby dá empate literal (47% a 47%) entre os dois candidatos. Vale tudo, portanto, para tentar desfazer o empate.


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