São Paulo, sábado, 31 de março de 2001

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BÁLCÃS

Condição do ex-ditador era ignorada; ação coroa dia confuso, em que sua prisão foi divulgada pelo governo e negada por aliados

Polícia iugoslava invade a casa de Milosevic

DAS AGÊNCIAS INTERNACIONAIS

A polícia iugoslava invadiu ontem a casa do ex-ditador Slobodan Milosevic, 59, no subúrbio de Belgrado. Houve um tiroteio e, até a 1h (horário de Brasília), não havia informações oficiais sobre a condição de Milosevic.
A invasão foi o ápice de um dia de confusão envolvendo do ex-ditador. Horas antes, funcionários do Departamento de Estado dos EUA disseram ter sido informados pelo governo iugoslavo de que Milosevic havia sido preso.
O presidente dos EUA, George W. Bush, o premiê britânico, Tony Blair, e autoridades da Otan e da ONU chegaram a fazer comentários sobre a prisão do ex-ditador -reiteradamente negada por aliados de Milosevic.
Mais tarde, Milosevic deu entrevista por telefone a uma rádio e apareceu na porta de sua casa saudando simpatizantes.
"Estou tomando um café com meus camaradas e estou muito bem", disse Milosevic à rádio independente B92. "Diante da minha casa se reuniu um grande número de simpatizantes, empenhados em salvar nosso povo e nossa dignidade", afirmou o ex-ditador.
A informação sobre a prisão de Milosevic fora divulgada ao final do prazo estipulado por uma lei do Congresso dos EUA para o novo governo da Iugoslávia mostrar que está cooperando com o tribunal da ONU para a ex-Iugoslávia, que indiciou o ex-ditador e expediu mandado de prisão contra ele.
Se o governo norte-americano considerar que Belgrado não está cooperando, irá reter ajuda financeira de US$ 100 milhões e barrar verbas de organismos internacionais como o Banco Mundial e o Fundo Monetário Internacional.
O Tribunal Penal Internacional quer a extradição de Milosevic para Haia (Holanda) para julgá-lo por crimes de guerra. O governo do presidente Vojislav Kostunica diz que a Constituição da Iugoslávia não prevê extradição, mas já indicou que pode julgar Milosevic no país sob acusação de corrupção e abuso de poder.

Confusão
Deputados do Partido Socialista da Sérvia, presidido por Milosevic, e dezenas de simpatizantes foram à porta da casa do ex-ditador, no luxuoso bairro de Dedinje, após os primeiros rumores da prisão, causados pela chegada ao local de uma ambulância, um carro da polícia e outros veículos sem identificação.
Durante várias horas, especulou-se sobre a prisão, com fontes do governo confirmando-a e aliados de Milosevic negando-a.
A TV privada sérvia BK disse no final da tarde que havia um mandado de prisão contra Milosevic e que a polícia estava dentro da casa negociando sua rendição. Depois, a emissora disse que Milosevic estava em um dos veículos pretos que saíram da casa do ex-ditador, com vidros escuros, e se dirigiram ao Palácio da Justiça, onde ele seria interrogado.
Imagens de TV mostraram o ex-ditador saudando os simpatizantes do lado de fora de sua casa, pouco depois da meia-noite, o que indica que ele pode ter sido preso e liberado após um breve interrogatório.
Membros da "guarda do povo", que fazia a vigília pró-Milosevic diante de sua casa, disseram que viram vários homens armados descerem dos carros sem identificação e entrarem na casa do ex-ditador, que controlou o poder na Iugoslávia por 13 anos.
O governo norte-americano havia admitido que seria improvável que Belgrado entregasse Milosevic ao tribunal da ONU no prazo estipulado. Mas sugeriram que, se ele estivesse atrás das grades, o país teria mais chances de ter a aprovação dos EUA.
"Sempre dissemos que Milosevic deveria ser levado à Justiça", disse ontem o presidente dos EUA, George W. Bush. "Estamos acompanhando a situação bem de perto e daremos qualquer ajuda solicitada (por Belgrado)."
O Departamento de Estado dos EUA disse que não anunciaria antes da segunda-feira sua decisão sobre a ajuda a Belgrado.
O tribunal da ONU em Haia indiciou Milosevic por crimes contra a humanidade por causa das acusações de atrocidades cometidas pelas forças iugoslavas sob seu comando contra a população de origem albanesa em Kosovo, em 1999. Milosevic dizia combater a ameaça à integridade territorial do país representada pelos guerrilheiros do Exército de Libertação de Kosovo (UCK). Em março, após Milosevic se negar a assinar acordo com o UCK, a Otan lançou seu ataque contra a Iugoslávia.
Depois de 78 dias de bombardeios, Belgrado aceitou retirar suas tropas de Kosovo, que passou a ser administrada pela ONU sob proteção de tropas da Otan.
Milosevic foi deposto em outubro numa revolta popular pacífica, após denúncias de fraude nas eleições gerais, que teriam sido vencidas já no primeiro turno por Kostunica.



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