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AMÉRICA LATINA
Jorge Castañeda, tido como guru do brasileiro Ciro Gomes, recebe críticas fortes de ex-aliados cubanos
Cuba abre "guerra" a chanceler do México
CLÓVIS ROSSI
Colunista da Folha
O governo cubano abriu guerra
contra quem já foi menino mimado pela ilha de Fidel Castro e, mais
recentemente, guru do presidenciável brasileiro Ciro Gomes
(PPS). O inimigo é Jorge Castañeda Gutman, 48, sociólogo de profissão e, atualmente, ministro de
Relações Exteriores do México.
É um "renegado", ataca o jornal
cubano "Granma", que, como todos em Cuba, funciona como
porta-voz do governo.
A guerra contra Castañeda se
deve a um incidente diplomático
ocorrido no dia 21, em Monterrey,
durante a Cúpula sobre o Financiamento ao Desenvolvimento,
organizada pelas Nações Unidas.
O presidente cubano Fidel Castro fez o discurso de praxe, na sessão plenária inaugural, no qual,
também como de praxe, acusou a
ordem econômica internacional
de ser "um sistema de pilhagem".
Mas a rotina terminou aí.
Logo em seguida, Castro anunciou que se retiraria imediatamente do país, devido ao que chamou de "situação especial" criada
por sua presença.
Dias depois, o "Granma" incumbiu-se de explicar a "situação
especial": acusou Castañeda de,
sob pressão dos Estados Unidos,
ter pedido que Castro ficasse poucas horas em Monterrey, para não
cruzar, em momento algum, com
George Walker Bush, igualmente
presente ao encontro.
Castañeda, como é óbvio, nega.
Mas a edição eletrônica da revista
"Proceso", a principal do México,
confirma a versão cubana. Diz a
revista que o governo mexicano
pedira a Cuba que Castro não fosse a Monterrey. O chanceler cubano, Ricardo Alarcón, recusou o
pedido. "Não podemos permitir
que mutilem nossos direitos como membros das Nações Unidas", teria dito.
Foi então que o governo mexicano pediu que Fidel fosse breve
em seu discurso (foi) e que não ficasse além do dia 21.
No dia 22, haveria o que o presidente mexicano Vicente Fox batizou de "retiro", apenas entre os
chefes de Estado/governo presentes, no que seria, portanto, a ocasião em que Castro e Bush poderiam ficar na mesma sala, talvez
lado a lado.
O incidente acabou provocando
tremendo ruído no México, o único país latino-americano que não
rompeu relações com a Cuba de
Fidel Castro quando a OEA (Organização dos Estados Americanos) colocou a ilha caribenha de
quarentena absoluta, sob pressão
norte-americana.
Tanto ruído que Jorge Castañeda foi chamado a dar explicações
ante a Comissão de Relações Exteriores do Congresso mexicano.
Ele deve comparecer na próxima
quarta-feira.
A explicação não será tarefa
simples. Castañeda chegou a receber treinamento militar em Cuba,
para lutar na América Central,
conforme o "Granma" contou,
para justificar o rótulo de "renegado" aplicado ao chanceler mexicano.
Livros polêmicos
É verdade que Castañeda já vinha se distanciando de Cuba,
paulatinamente. Primeiro, porque o governo cubano não gostou
de seu livro "Utopia Desarmada",
um alentado trabalho sobre a luta
armada na América Latina.
Um segundo livro, a biografia
do guerrilheiro argentino Ernesto
Che Guevara, herói da Revolução
Cubana, selou a ruptura.
O livro é de 1997, ano em que o
próprio Castañeda estava empenhado em construir alianças da
esquerda com a centro-esquerda
em vários países latino-americanos, no Brasil inclusive.
Seu parceiro acadêmico na empreitada foi o filósofo Roberto
Mangabeira Unger, geralmente
tido como o guru de Ciro Gomes.
Ciro, aliás, participou de várias
reuniões da esquerda promovidas
pela dupla Castañeda e Mangabeira Unger, a última das quais foi
em 1998, no Chile.
A convite de Castañeda/Mangabeira Unger, lá estavam também
Luiz Inácio Lula da Silva, José Dirceu, presidente nacional do PT,
Tarso Genro (indicado, naquela
reunião, para candidato presidencial do PT, o que acabou não se
concretizando), Leonel Brizola e
Vicente Fox, entre muitos outros.
Castañeda decidiu passar da
teoria para a prática, pelo menos
em seu próprio país: aliou-se a Vicente Fox (de um partido conservador) na campanha eleitoral,
ajudou a captar votos nas áreas de
centro e esquerda, virou chanceler e, atualmente, é tido como candidato para o pleito que definirá o
ocupante da Presidência em 2006.
A questão pendente é saber se a
guerra com Cuba ajuda ou atrapalha sua eventual candidatura.
Se depender da esquerda que
Castañeda antes cortejava, atrapalha muito. No jornal "La Jornada", o colunista Carlos Montemayor escreve que "uma das razões
não explícitas (para o "affaire" Cuba/Castañeda) poderia ser o crescente domínio que exerce o governo norte-americano sobre o
governo mexicano".
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