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Corte corre contra o tempo para julgar genocidas de Ruanda
Tribunal instalado na Tanzânia é patrocinado pela ONU, que pôs o fim deste ano como prazo para encerramento dos trabalhos
Desde 1994, ocorreram 37 julgamentos; 42 ainda aguardam sentenças sobre sua responsabilidade no extermínio de 1 milhão
FÁBIO ZANINI
EM ARUSHA (TANZÂNIA)
Há longos 14 anos, dentro de
salas apertadas de um centro
de convenções em Arusha, norte da Tanzânia, juízes em togas
vermelhas e promotores com
perucas brancas buscam fazer
justiça ao 1 milhão de mortos
no genocídio de Ruanda.
Eles correm contra o tempo
para encerrar suas atividades
até o fim deste ano, como cobra
a patrocinadora da corte internacional para os crimes contra
a humanidade, a ONU.
Dos 92 indiciados como organizadores do genocídio -um
primeiro-ministro e 15 ministros, além de líderes militares,
empresariais, religiosos e da
mídia-, somente 37 foram julgados desde 1994 (dos quais 32
condenados e 5 absolvidos).
Outros 42 ainda precisam receber seu veredicto nos pouco
mais de seis meses que faltam
até o prazo final. Os demais 13
estão foragidos (e poderão ser
julgados em qualquer tempo se
forem capturados).
Por isso, o ritmo nas salas do
centro de convenções de Arusha é frenético. Até quatro julgamentos simultâneos ocorrem.
"O tribunal está fazendo todos os esforços para completar
os casos até dezembro. Não estamos correndo apenas por
correr. Não iremos comprometer a integridade, a justiça e o
processo legal dos julgamentos", diz Roland Amoussouga,
diretor de planejamento estratégico do tribunal.
A fila de casos pendentes em
Arusha é só parte da empreitada gigantesca que é fazer justiça
num caso como esse. O genocídio envolveu não algumas dezenas de pessoas, mas literalmente milhares que atenderam ao chamado do "poder hutu".
Em Ruanda, 818 mil pessoas,
ou cerca de 10% da população,
foram em algum momento investigadas nos últimos 14 anos
por participação. Dessas, 120
mil foram indiciadas e 20 mil
ainda precisam ser julgadas por
cortes tradicionais, as "gacacas".
Jornalistas e compositor
No caso da corte da ONU, a
lista de julgados inclui o ex-primeiro-ministro do governo extremista, Jean Kambanda, que
pegou prisão perpétua, o primeiro caso na história de um
chefe de governo condenado
por genocídio.
Outros precedentes estabelecidos pelo tribunal são a definição de estupro em massa como instrumento de genocídio e o estabelecimento de limites
para a liberdade de expressão
para os casos de apologia aos
crimes contra a humanidade.
Isso porque rádios e jornais
foram fundamentais na instigação de cidadãos comuns a
participar da matança. Quatro
jornalistas já foram condenados. Simon Bikindi, um compositor popular que escreveu músicas exortando ataques aos
tutsis, aguarda julgamento.
O tribunal já consumiu cerca
de US$ 1 bilhão desde seu início. A pressão para uma conclusão definitiva tem levado a alguns procedimentos controversos, como a limitação do número de testemunhas que os
advogados podem apresentar.
"Nos primeiros anos, era comum haver até cem testemunhas para cada caso. Agora, é algo entre 20 e 25", diz Tim Gallimore, porta-voz da promotoria.
Além disso, nas sessões que a
Folha acompanhou, advogados
de defesa rotineiramente tinham a palavra cortada por juízes impacientes com a demora
na argumentação.
Reservadamente, já se admite que o objetivo de terminar
tudo até dezembro não será
cumprido e que alguns casos
devem invadir 2009. Além disso, julgamentos de recursos podem ocorrer até 2010. Isso demandará mais dinheiro e mais
paciência da comunidade internacional -e dos ruandeses.
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