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Iniciativa americana visa a atingir público doméstico, diz especialista
MÁRCIO SENNE DE MORAES
DA REDAÇÃO
A criação do Escritório de Comunicações Globais responde a
anseios domésticos e não deve ter
como real objetivo melhorar a
imagem internacional do EUA.
A análise é de Charles Tilly, historiador, especialista em relações
internacionais da Universidade
Columbia (EUA) e autor de, entre
outros, "Stories, Identities and
Political Change" (história, identidades e mudança política).
Leia a seguir trechos de sua entrevista, por telefone, à Folha.
Folha - Como anda a imagem internacional dos EUA?
Charles Tilly - Ela se deteriora
por conta do comportamento do
governo dos EUA no que se refere
a assuntos que interessam à comunidade internacional. O problema é que a atual administração
não pára de atacar acordos internacionais importantes e delicados, como a Convenção contra a
Tortura, e é unilateralista.
Folha - O antiamericanismo se intensificou após a campanha militar
no Afeganistão?
Tilly - Sem dúvida. Afinal, durante o governo de Bill Clinton,
embora também tenham tomado
posições unilateralistas, os EUA
ao menos consultavam seus aliados da Otan a esse respeito.
Contudo, após 11 de setembro
último, Washington passou a
pensar que não tinha mais de
preocupar-se com os outros países. Isso poderá criar problemas
reais com os países europeus, pois
eles acabarão se unindo contra as
políticas americanas que afetam
questões delicadas, como o Tribunal Penal Internacional.
Folha - A iniciativa atual é uma
novidade geopolítica?
Tilly - Não creio que seja verdade
que o governo dos EUA não tenha
noção de sua imagem internacional. É indiscutível que a sociedade
americana é um pouco alienada,
porém seu governo não é.
Nos anos 50, CIA já enviava
agentes à Europa para falar com
especialistas a respeito de um
crescente antiamericanismo. À
época, as autoridades americanas
já pensavam que a Europa não
entendia o que os EUA eram.
Nos anos 50 e 60, duas coisas
preocupavam os EUA nesse âmbito. Primeiro, que a França, comandada por Charles De Gaulle, e
que a Alemanha Ocidental pudessem começar a operar de modo
independente da política externa
americana. Os EUA temiam que
eles pudessem se opor à Otan e à
política externa americana.
Segundo, havia a preocupação
de que alguns países pudessem
ser passivos em relação ao comunismo. Como havia partidos comunistas ativos na França e na
Itália, isso gerou o medo de que
houvesse um recrudescimento do
antiamericanismo na Europa.
Assim, não é a primeira vez que
agências governamentais americanas se preocupam com o crescimento do antiamericanismo.
Folha - O sr. crê que essa iniciativa possa realmente surtir efeitos
positivos?
Tilly - Não creio que esse tipo de
iniciativa possa surtir o efeito oficialmente esperado. Acredito que
ela vise a atingir o público interno.
Não creio que, realmente, ela tenha como objetivo melhorar a
imagem do país. A história mostra que esse tipo de iniciativa busca atingir o público doméstico.
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