São Paulo, quarta-feira, 31 de julho de 2002

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ÁFRICA

Tratado pode levar ao fim do maior conflito armado do continente; analistas apontam obstáculos para a sua implementação

Congo e Ruanda assinam acordo de paz

DA REDAÇÃO

Os presidentes da República Democrática do Congo (ex-Zaire) e de Ruanda assinaram ontem um acordo de paz que pode ser o primeiro passo rumo ao fim de um conflito que já deixou 2 milhões de mortos em quatro anos.
O documento prevê a retirada dos cerca de 30 mil soldados ruandeses do leste do Congo. Em contrapartida, o governo congolês deve prender e desarmar rebeldes de etnia hutu que, após atuarem no genocídio de 1 milhão de tutsis em Ruanda, em 1994, se refugiaram no vizinho Congo. Tropas da ONU devem ajudar os congoleses nessa missão.
"Esse é um dia brilhante para o continente africano", disse o presidente sul-africano, Thabo Mbeki, durante a cerimônia de assinatura, em Pretória, da qual participaram os presidentes ruandês, Paul Kagame, e congolês, Joseph Kabila. "O sangue não precisa mais ser derramado", disse Kabila. "Há um tempo para a guerra e um tempo para a paz."
Apesar da retórica animadora, analistas recomendam que o acordo seja recebido com cautela. Há dificuldades para a implementação dos compromissos. O prazo de 90 dias estipulado para a prisão dos hutus é apertado. O governo do Congo já quebrou promessas parecidas no passado. Nada leva a crer que os rebeldes se entregarão sem resistência. Além disso, a ONU não tem um contingente na região capaz de fazer a diferença na ofensiva contra os hutus.
Da mesma forma, o governo de Ruanda tem suas razões para adiar a retirada militar. Os seus soldados continuam a saquear diamantes e marfim do território que ocupam no leste congolês.
"Qualquer passo adiante é bem-vindo. Mas as perspectivas de implementação desse acordo são completamente fora da realidade", disse Alison Des Forges, especialista em Ruanda da organização defensora dos direitos humanos Human Rights Watch.
Bélgica e França, ex-potências coloniais na África, elogiaram ontem a iniciativa. Em nome da União Européia, a Dinamarca, atual presidente do bloco, disse esperar empenho dos dois lados para levar adiante o processo de paz no maior conflito africano.
Indagado se três meses eram suficientes para desarmar e repatriar rebeldes e ex-soldados ruandeses radicados no Congo, o presidente Kabila respondeu: "Todo fim de mês, nós, os chefes de Estado, nos reuniremos, de forma rotativa, em Kigali (Ruanda), Kinshasa (Congo) e, talvez, aqui (Pretória) para avaliar o progresso e seguir o caminho".
Já Kagame afirmou estar preparado para retirar seus soldados do Congo, contanto que suas preocupações de segurança sejam atendidas. "O importante é que todos concordamos que devemos fazer tudo o que podemos para que as milícias deixem de ser um risco para Ruanda ou para qualquer outro país", declarou.
"A segunda questão é a de que todas as tropas estrangeiras devem sair do Congo. Ruanda está pronta para sair." Zimbábue, Angola e Namíbia enviaram tropas ao país para apoiar as forças de Kinshasa. Segundo Kabila, elas serão retiradas quando ele sentir que não enfrenta mais ameaças externas. O conflito ainda é complicado pelo apoio de Uganda e de Ruanda aos rebeldes congoleses.


Com agências internacionais

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