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DA PASSARELA À PRESIDÊNCIA
Irene Sáez enfrenta golpista e partidos desgastados na mais estável democracia sul-americana
Ex-miss desafia 'caciques' na Venezuela
RODRIGO BERTOLOTTO
da Reportagem Local
Brasil, Equador, Colômbia e Pa
raguai também terão eleições pre
sidenciais em 1998, mas em ne
nhum desses países deve haver
uma campanha com candidatos
com passados como os que con
correm na Venezuela.
Entre os mais de 15 pré-candida
tos estão a Miss Universo 1981, Ire
ne Sáez, e o tenente-coronel retira
do Hugo Chávez Frías, líder do
frustrado golpe de Estado de 1992.
Mas Chávez, com apoio de pe
quenos partidos de esquerda, não
chega nem perto dos 40% de inten
ção de votos de Sáez, que é prefeita
de Chacao (Grande Caracas).
Aproveitando o desgaste dos
partidos tradicionais (90% dos ve
nezuelanos dizem não mais acre
ditar neles), a loira Sáez se lança à
campanha apoiada pelo movi
mento Integração, Renovação e
Nova Esperança, cuja sigla é Irene.
A Venezuela é a democracia mais
estável da América do Sul, chegan
do em 1998 a seu 40º ano de vida.
Nesse período, funcionou um bi
partidarismo que revezou no po
der o Copei (Comitê de Organiza
ção Política Eleitoral Independen
te, centro-direita) e a AD (Ação
Democrática, centro-esquerda).
Desses, apenas a Ação Democrá
tica já perfila um candidato. É
Claudio Fermín, carismático líder
social-democrata que é uma espé
cie de herdeiro de Carlos Andrés
Pérez, presidente deposto após
impeachment em 1993.
Por outro lado, setores do Copei
querem engolfar a candidatura de
Sáez, enquanto outros resistem.
90-60-90
Mas a polêmica em torno do cha
mado "fenômeno Sáez" envolve
toda a sociedade, não só o Copei.
"Irene cultiva o enigma e o si
lêncio. Sua comunicação não se
baseia em palavras, mas em gestos,
sinais e indícios que o povo inter
preta. Ela é mágica", afirma o inte
lectual Diego Bautista Urbaneja.
A opinião do analista político ve
nezuelano Manuel Caballero é
bem diferente. "A mágica são os
números 90-60-90. Sua impressio
nante estatura, a cabeleira leonina
e o sorriso de propaganda estão
domando os venezuelanos."
Os opositores de Sáez dizem que
ela não tem experiência para ser
presidente e que fazer um bom go
verno em Chacao é fácil, afinal, a
população de lá é quase toda de
classe média e alta.
Na verdade, Chacao é uma ilha
de prosperidade em um país que
viveu a bonança do petróleo nos
anos 70, mas que, a cada ano, vê
seus índices sociais piorarem.
Na cidade de Sáez, foram criados
serviços públicos que seriam con
siderados de luxo, como aula de
tai-chi para idosos, atendimento
médico domiciliar, duas orques
tras e uma escola de balé.
Enquanto o resto de Caracas tem
problemas de tráfego e de coleta de
lixo, os policiais de trânsito, com
uniformes cáqui e capacetes bran
cos, e os lixeiros, com roupas es
porte, cuidam do município apeli
dado de "Irenelândia".
Sáez foi eleita prefeita em 1992,
com 70% dos votos, e reeleita com
96% do eleitorado, em 1995.
O prédio da prefeitura que ocupa
atualmente dista dois quarteirões
da edificação onde se preparam to
das as misses do país.
A Venezuela é a vice-líder mun
dial na produção de Miss Univer
so, com quatro títulos -perde so
mente para os EUA, os inventores
desses concursos, que têm sete.
Falta muito para a eleição de 4 de
dezembro de 1998, mas a história
local já guarda um exemplo de bel
dade que se deu mal na política.
Nas eleições de 1958, o contra-al
mirante Wolfgang Larrazábal,
amparado em sua boa aparência e
conclamações ao estilo "minha
gente", era o mais popular dos
candidatos. Quando as urnas fo
ram abertas, o eleito foi Rómulo
Betancourt, da AD, o inaugurador
do ciclo democrático que sobrevi
veu à onda de ditaduras que varreu
a América Latina nos anos 60 e 70.
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