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São Paulo, domingo, 31 de agosto de 2003

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EUROPA

Segundo Harald 5º, descoberta de petróleo nos anos 60 criou o "problema" do país, cuja economia não comporta tanta riqueza

Dinheiro demais é ruim, diz rei da Noruega

LUCIANA COELHO
ENVIADA ESPECIAL A OSLO

Às vésperas de sua primeira visita de Estado ao Brasil, o rei Harald 5º da Noruega também reclama dos problemas de caixa de seu país. Mas, ao contrário de Brasília, para Oslo a dificuldade está nas sobras -e não nos buracos- do Orçamento.
Com um Produto Interno Bruto de US$ 166 bilhões -o Brasil tem um PIB de US$ 450 bilhões, mas com uma população 40 vezes maior-, o grande problema da Noruega hoje é o excesso de dinheiro, diz o rei.
"Colocando em termos populares -e não é da minha alçada o que eu vou dizer-, o problema hoje é que temos muito dinheiro", afirmou ele durante entrevista em seu gabinete de trabalho, no palácio real em Oslo, acompanhado da rainha Sonja. "Temos uma economia pequena e, se começarmos a usar todo o dinheiro que todo mundo sabe que temos, a economia terá problemas."
O "problema" norueguês começou na década de 60, quando a descoberta de poços de petróleo no mar do Norte tornou o país, já rico, riquíssimo. Atividades relacionadas à indústria de petróleo e gás natural respondem, sozinhas, por 20% do PIB do país.
A sobra de dinheiro é tão grande que permitiu ao governo criar o "fundo do petróleo", uma espécie de reserva a ser usada quando a indústria petroleira do país, que começa a entrar em declínio, não tiver mais uma produção satisfatória. Atualmente, o fundo guarda cerca de 900 bilhões de coroas norueguesas, algo em torno de US$ 120 bilhões.
Parte do dinheiro tem sido usada em investimentos sociais, mas o montante maior é guardado para um caso de emergência.
"É um problema muito grande para os políticos explicar ao povo que você não pode fazer tudo de uma vez, mesmo tendo dinheiro para isso. Acredite ou não, é um problema político", diz o rei.

Custos elevados
Mas não é apenas a família real que reclama do excesso de dinheiro. Empresários no país constantemente lamentam que a elevação do custo de vida decorrente da exploração do petróleo tenha encarecido a manutenção de empresas, serviços e, sobretudo, de empregos -salários baixos não existem na Noruega, onde um trabalhador na indústria ganha metade do salário de um médico e a renda das demais categorias profissionais, com raras exceções, oscila dentro dessa faixa.
Políticos e ministros, em campanha para as eleições locais no fim do ano, se vêem em dificuldade para explicar ao eleitorado as limitações que independem do dinheiro e o risco de se alavancar a inflação do país caso o dinheiro do fundo do petróleo seja distribuído, promovendo uma corrida de consumo.

Qualidade de vida
Outra queixa frequente entre os noruegueses são os impostos. Um norueguês comum entrega 40% de sua renda ao governo. Somando-se impostos sobre a propriedade, em alguns casos o percentual chega a 60%.
Entretanto, no país com o maior Índice de Desenvolvimento Humano do mundo, segundo as Nações Unidas, a educação é gratuita e as vagas são garantidas a todos. De escolas particulares, há somente um pequeno percentual de berçários e creches. E o governo ainda custeia os estudos daqueles que desejam concluir sua formação fora do país.
Os hospitais também são exclusivamente públicos, embora nos últimos anos algumas clínicas particulares tenham ganhado dinheiro entre a clientela mais abastada não disposta a esperar pelo atendimento gratuito.
Além disso, há uma enorme preocupação com a família - a jornada de trabalho acaba às 16h em qualquer fábrica, órgão público ou escritório, para que o norueguês possa passar mais tempo com a família. E, com exceção da capital -a maior cidade do país, com 512 mil habitantes-, em outras cidades é quase impossível achar gente na rua após as 17h.
Os índices de violência são baixíssimos -em 2000, ano da estatística mais recente, houve 53 homicídios no país -o número de suicídios foi dez vezes maior.
Com estatísticas assim, talvez fique mais fácil entender por que o maior problema do país, aos olhos do rei, seja o dinheiro que sobra nos cofres públicos.


A jornalista Luciana Coelho viajou a convite da Chancelaria norueguesa


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