São Paulo, sexta-feira, 31 de dezembro de 2004

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OPINIÃO

Somos sovinas? Sim

Leia a seguir o editorial publicado ontem pelo "New York Times"
 
O presidente Bush finalmente saiu do torpor de suas férias em Crawford, Texas, para telefonar expressando simpatia aos governantes de Índia, Sri Lanka, Tailândia e Indonésia, e para se pronunciar publicamente sobre a devastação que os tsunamis de domingo causaram na Ásia. Bush não demorou em se distanciar da ridícula oferta inicial de assistência norte-americana, de US$ 15 milhões, e contestou uma declaração prévia de Jan Egeland, coordenador das operações de assistência das Nações Unidas, no sentido de que os países ocidentais ricos vinham sendo "sovinas". "A pessoa que fez essa declaração estava muito equivocada e mal informada", disse o presidente.
Egeland tinha completa razão. Esperamos que o secretário de Estado tenha se sentindo embaraçado quando, passados dois dias de um desastre catastrófico que atingiu 12 dos países mais pobres do mundo, convocou uma entrevista coletiva para informar que os EUA, a mais rica nação do planeta, contribuiriam com US$ 15 milhões. É menos de metade do que o Partido Republicano planeja gastar com a posse de Bush em seu segundo mandato.
A assistência norte-americana no atual desastre é agora de US$ 35 milhões, e aplaudimos o recuo determinado por Bush. Mas US$ 35 milhões continuam a ser uma mesquinha gota no mar das necessidades, e representam atitude coerente com as somas medíocres que o Orçamento dos Estados Unidos reserva para a assistência internacional de caráter não-militar. Pesquisa de opinião pública indica que a maioria dos americanos acredita que os EUA gastem 24% de seu orçamento em assistência a países pobres; na verdade, o país gasta 0,25%.
Funcionários do governo Bush ajudam a criar essa disparidade de percepção. Furioso diante da acusação de sovinice, Powell apontou para os esforços de assistência em casos de desastre e disse que o país havia "fornecido mais assistência nos últimos quatro anos do que qualquer nação ou combinação de nações no mundo". Mas, em termos de assistência ao desenvolvimento, os EUA doaram US$ 16,2 bilhões em 2003; a União Européia doou US$ 37,1 bilhões. Em 2002, as somas foram de US$ 13,2 bilhões para os Estados Unidos e de US$ 29,2 bilhões no caso da Europa.
Muitas vezes prometemos mais dinheiro do que efetivamente doamos. As vítimas do terremoto em Bam, no Irã, há um ano, continuam vivendo em tendas, porque a assistência, incluindo a nossa, não se materializou nos montantes prometidos. Em 2002, Bush anunciou a criação de um fundo de assistência ao desenvolvimento africano, chamado Desafio Milênio, com a dotação de até US$ 5 bilhões ao ano. Mas nem um centavo foi desembolsado sob esse programa, até agora.
Bush disse ontem que os US$ 35 milhões que prometemos contribuir até agora "são só o começo" da ajuda dos Estados Unidos ao esforço de recuperação. Esperemos que isso se prove verdade, e que dessa vez nossas ações se equiparem às nossas promessas.


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