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Para celebrar a Olimpíada e uma vida, um decatlo cultural

Ulli Weiss
"World Cities" traz dez obras de Pina Bausch encenadas pelo Tanztheater Wuppertal; o trabalho foi inspirado em vários locais, como São Paulo ("Água") e Hong Kong ("Der Fensterputzer", à direita), e será apresentado durante a Olimpíada
"World Cities" traz dez obras de Pina Bausch encenadas pelo Tanztheater Wuppertal; o trabalho foi inspirado em vários locais, como São Paulo ("Água") e Hong Kong ("Der Fensterputzer", à direita), e será apresentado durante a Olimpíada

POR ROSLYN SULCAS

LONDRES - Durante a próxima Olimpíada, nem todos os espetáculos acontecerão nos estádios. Muitas revelações serão feitas em teatros, notadamente durante a temporada inédita de "World Cities 2012", da coreógrafa alemã Pina Bausch: dez obras baseadas em residências em todo o mundo, apresentadas pela companhia Tanztheater Wuppertal.

É uma espécie de decatlo cultural. As obras de Bausch não são minimalistas nem fáceis de encenar. São exaustivas para os artistas e os técnicos, muitas vezes duram mais de três horas e geralmente têm cenários de complexidade e tamanho desafiadores. O custo para se levar dez peças da companhia com 73 integrantes para Londres é de R$ 5,6 milhões, uma quantia quase inédita para uma temporada de dança.

Três anos depois da morte repentina de Bausch aos 68 anos, em 2009, "World Cities 2012" estreou em 6 de junho como obra principal do Festival Londres 2012.

"World Cities" se une ao Festival Mundial de Shakespeare, ao projeto El Sistema de Gustavo Dudamel (programa que ensina música para crianças pobres na Venezuela) e à estreia da ópera de "Stockhausen Mittwoch aus Licht", que transmitirá a música de um quarteto de cordas de quatro helicópteros em voo.

O "World Cities", que será apresentado 20 vezes com dois ou três dias de intervalo, é "simplesmente um evento cultural sem precedentes", disse Joseph V. Melillo, diretor-executivo da Academia de Música do Brooklyn.

Ao longo de 36 anos, Bausch criou uma forma de dança totalmente nova, que ela chamou de "Tanztheater", ou "teatro-dança". Construída muitas vezes de vinhetas surrealistas, em que os artistas aparecem como veículos de estranhos rituais e obsessões, as danças transformam os corpos em repositórios de profundos medos e esperanças irracionais, memórias e instintos. O trabalho atraiu um público que praticamente o cultua.

A morte de Bausch, poucos dias depois de ela receber um diagnóstico de câncer, quase abortou o plano de fazer o "World Cities".

"Pina achava a ideia meio maluca, uma espécie de sonho", disse Michael Morris, diretor da companhia Cultural Industry.

As residências começaram em 1986, no Teatro Argentina, em Roma, definindo um padrão pelo qual Bausch e seus bailarinos passavam várias semanas em cada país, reunindo impressões e compartilhando seus sentimentos, reações e perguntas.

Julie Anne Stanzak é membro do Tanztheater Wuppertal desde 1985. "O que foi interessante descobrir, apesar das especificidades de cada cultura, é que compartilhamos os mesmos desejos de bem-estar, criatividade, bondade e tradições ", disse.

"Viktor", a obra de Roma que abriu a temporada, é ambientada dentro e ao redor de um enorme túmulo. "Der Fensterputzer" (O lavador de vidraças), que será apresentado em 18 e 19 de junho, foi criado após uma residência em Hong Kong e tem a cena dominada por um monte de 6 metros de altura de flores de seda vermelhas. "Nefés" (Istambul, 24 e 25 de junho) tem água que sobe pelo chão para criar um lago raso. "Ten Chi" (Saitama, Japão, 15 e 16 de junho) é dominado por uma enorme cauda de baleia branca.

Cinquenta e três caminhões vão transportar os cenários e figurinos pelos 515 quilômetros que separam Wuppertal e Londres.

Figurantes, cães, camundongos, galinhas, carneiros e pombos serão alugados. Cargas de terra e areia devem ser fornecidos. Será preciso encontrar tempo para ensaios, passagens de luz e de som e solução de problemas artísticos.

"Algo nessa escala só poderia acontecer por causa da Olimpíada", disse Alistair Spalding, diretor artístico de Saddler's Wells.

As dez peças, que incluem "Bamboo Blues", inspirada em Calcutá, e a última de Bausch, do tempo em que passou em Santiago, no Chile, foram criadas em seus últimos 23 anos.

Elas mostram como o trabalho de Pina Bausch mudou com o tempo: indo de criações mais sombrias para peças mais alegres e cheias de dança.

Afirma Shaw: "O World Cities 2012 poderá ser uma maneira de permitir que Pina acene para nós, e que possamos reconhecer que, assim como ela foi o futuro, hoje é o passado."

Para ele, Pina Baush também é uma figura olímpica: "E nós seguimos adiante, sobre seus ombros".

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