Índice geral New York Times
New York Times
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice | Comunicar Erros

Resenha de Arte - Roberta Smith

Tributo aos artistas do bizarro

Os gêmeos mestres da animação tipo "stop-action"

Nem todos os cineastas criam mundos de fantasia completos e vibrantes, repletos de seres estranhos, às vezes assustadores, além de movimentos misteriosos, suspense emocional e detalhes surpreendentes. Menos cineastas ainda são homenageados com grandes retrospectivas que fazem jus a esses mundos. Mas é isso o que o Museu de Arte Moderna fez pelo complexo universo paralelo centrado em bonecos criado pelos animadores conhecidos como os Irmãos Quay.

Primeiro pontuada e depois dominada por telas de vídeo e projeções que oferecem mais de sete horas de filmes, a mostra rende homenagem ao trabalho e à saga artística de Timothy e Stephen Quay, gêmeos idênticos nascidos em Norristown, Pensilvânia, em 1947, que começaram como ilustradores, passaram a fazer cinema e, desde o fim dos anos 1970, vêm trabalhando na Europa.

A mostra "Quay Brothers: On Deciphering the Pharmacist's Prescription for Lip-Reading Puppets" ("Irmãos Quay: Decifrando a Receita do Farmacêutico para Fantoches que Fazem Leitura Labial") ficará no museu até 7 de janeiro e revela que os irmãos Quay são hábeis em várias mídias artísticas. A mostra inclui desenhos deles para capas de livros e álbuns musicais, embora seja ótimo saber que a conhecida capa do álbum "Blood Sweat & Tears", de 1968, é obra deles, criada quando eram alunos da Universidade das Artes, em Filadélfia.

Há desenhos, colagens e gravuras, animações em papel cortado, da fase inicial de suas carreiras, e obras que vieram depois de eles fazerem sucesso como animadores: vídeos de sets criados para ópera e teatro (que estão em uso) e dois filmes de ação ao vivo -"Institute Benjamenta" (1995) e "The Piano Tuner of Earthquakes" (2006)- que fazem parte da programação de filmes da mostra. (A trama de "The Piano Tuner" gira em torno de sete cenários, descritos como autômatos. Eles aparecem apenas brevemente no filme, mas vistos diretamente na mostra, são extraordinários.)

Mas a mostra não deixa dúvida quanto ao fato de os irmãos Quay serem mestres de um tipo fascinante de animação "stop-motion" (técnica em que os objetos são fotografados quadro a quadro e depois filmados em sequência) que eles lançaram em 1979.

Repletas de narrativas oníricas não resolvidas e tensões psicossexuais, essas obras remetem ao surrealismo, ao gótico e ao vitoriano e também refletem o interesse profundo dos irmãos Quay pela literatura, a arte gráfica, a animação e a música da Europa do leste.

As melhores animações fazem uso de fantoches, bonecos, animais empalhados e criaturas relacionadas (demônios emplumados maníacos são uma especialidade dos irmãos), que encenam seus encontros, em grande medida sem diálogos, nos palcos dos cenários. Esses painéis grandes partem da estética da colagem de Joseph Cornell e do artista tcheco Jiri Kolar, fazendo uso de uma gama surpreendente de materiais naturais e artificiais e de "objets trouvés". Eles são, na realidade, esculturas.

O alívio cômico é fornecido por uma dúzia de comerciais de TV animados que os irmãos Quay chamam de "acordos com o diabo", já que foram feitos para financiar trabalhos mais sérios, mas que são tão brilhantes quanto tudo que eles já fizeram.

O ponto culminante da mostra acontece numa pequena galeria que parece um cinema, onde você poderá assistir à muito elogiada obra-prima dos irmãos, "Street of Crocodiles" (1986), uma excursão em clima de sonho para uma alfaiataria, feita por um fantoche de olhos argutos.

Ele encontra um grupo de assistentes de alfaiate que rapidamente o equipam com uma nova cabeça e novo cérebro. Baseado numa história do autor polonês Bruno Schulz (1892-1942), o clima de entreguerras no Velho Mundo do filme é repleto de referências ao controle da mente e à aproximação do fascismo.

Em seguida, o visitante pode ver 15 dos cenários. Há níveis diferentes de realidade, elementos inesperados, ecos vagos e muitas conexões frouxas.

É tentador encarar os irmãos Quay como artistas fora de sintonia com seu tempo, demasiado atraídos pelo antigo e o arcano. Mas eles parecem eminentemente pós-modernos, à sua própria maneira bizarra.

É a natureza enfaticamente física de suas animações, a ênfase sobre textura e materiais, sobre o cinema como uma coisa feita à mão, que faz o trabalho deles parecer tão atual.

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice | Comunicar Erros


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.