São Paulo, segunda-feira, 03 de novembro de 2008

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

ELEIÇÕES 2008 NOS EUA

Em antigas cidades do aço, eleitores enfrentam o dilema da raça

Por MICHAEL POWELL

ALIQUIPPA, Pensilvânia - Votar em um negro não é fácil para Nick Piroli. Ele é o primeiro a admiti-lo. Piroli, 77, trabalhador siderúrgico aposentado, diz que alguns de seus amigos não votarão em Barack Obama.
"Não sou racista, mas também não sou louco por ele", diz. "Não sei, talvez porque ele seja negro." Ele se repreende. "Nós crescemos e trabalhamos com negros, sérvios. Era uma verdadeira liga das nações. E a economia agora está terrível."
"Preciso votar nele", diz Piroli, finalmente.
Nele quem? "No democrata, Obama", responde. "Não posso ser estúpido."
O adversário republicano de Obama na eleição presidencial, John McCain, jogou suas fichas na aposta de que pode ganhar no condado de Beaver, onde os brancos e a classe trabalhadora são predominantes, e em uma dezena de outros condados da Pensilvânia como este.
Mas nas cidades ao longo do rio Beaver, onde as maiores minas de aço foram fechadas há tempo, e em localidades rurais como Economy e Hookstown, um bom número de democratas garante que, embora relutantemente, vai apoiar o candidato do seu partido. Muitos democratas e alguns independentes consideram McCain muito velho e sua companheira de chapa, Sarah Palin, muito pouco sofisticada para substituí-lo se necessário.
Esses sentimentos podem ser um mau presságio para McCain, que confia em uma vitória-surpresa na Pensilvânia para salvar sua candidatura. Eles ecoam pesquisas que mostram os eleitores brancos migrando para Obama.
Mas McCain pode ter uma oportunidade de conter esse movimento. Trinta e cinco entrevistas feitas pela reportagem sobre raça e escolha presidencial revelaram incertezas dos eleitores sobre Obama.
Em Ambridge, Olga Permon, 71, viúva de um trabalhador siderúrgico e democrata desde sempre, considera as opções. McCain? Um velho rabugento. Palin? Sem chance. Que tal Obama?
Ela faz uma longa pausa. "Ele me assusta", diz Permon. "Os negros estão excitados, mas eu e minhas amigas pretendemos escrever o nome de Hillary na cédula."
Não é um terreno amistoso para Obama. Nas primárias democratas, Hillary Clinton o derrotou por 40 pontos no condado de Beaver. Os democratas superam os republicanos na região, mas, nas eleições presidenciais, já houve vitórias dos dois partidos. A piora da economia é um trunfo para os democratas. Obama e seu vice, Joe Biden, atraíram 8.000 pessoas a um comício em Beaver há um mês. Membros de sindicatos vão de porta em porta nos fins de semana, cabalando votos.
G. Terry Madonna, diretor do Centro de Política e Relações Públicas da Faculdade Franklin & Marshall em Lancaster, diz que assessores de McCain "olharam para a imensa margem a favor de Hillary nas primárias e pensaram: 'temos uma chance'. Mas vai ser muito difícil para ele conseguir aqui as margens que precisa para compensar a derrota nas grandes cidades da Pensilvânia".
Vince Pisano, 47, encanador de Ambridge, é uma mostra desse desafio. Ele leva em consideração o colapso da economia e os efeitos sobre seu fundo de aposentadoria. Ele é um firme apoiador de Obama, mas muitos que ele conhece não são. "Amigos próximos, muito próximos, me dizem que não podem ignorar a questão racial. Se Obama fosse branco, venceria de lavada."
Sarah Palin assumiu um papel-chave em cortejar condados culturalmente conservadores como Beaver. Ela fez um comício no local, e a audiência aplaudiu quando ela falou de sua oposição ao aborto.
"É dela que precisamos", disse Steve Matoic, caminhoneiro que vestia uma jaqueta camuflada e usava bandana com a bandeira dos EUA.
O apoio a Palin, porém, não é universal. Grace Ruscitti, professora aposentada, ainda está desapontada com o fato de McCain tê-la escolhido para vice. "Isso foi um insulto à nossa inteligência", diz ela.
McCain, é verdade, também tem apoiadores. O reverendo Chris Noyes, ministro presbiteriano de Beaver Falls, estima que dois terços de sua congregação apóiam a chapa republicana.
Os republicanos gastaram muito dinheiro em propaganda. Até o início de outubro, a campanha de McCain tinha gasto mais do que a de Obama na Pensilvânia.
Um sindicato distribui um panfleto entitulado "A Verdade Sobre Barack Obama", que diz: "Ele é cristão? Sim. Ele jurou pela Bíblia? Sim. Ele nasceu nos EUA? Sim".
Ainda assim, persistem as dúvidas sobre o democrata. Rita Ratjer, viúva de um trabalhador siderúrgico, diz que não pretende votar. Mas Peggy Doffin, 79, viveu a Grande Depressão e teme que outra esteja chegando. Ela já foi uma firme apoiadora de Hillary e não gostava de Obama. Então ouviu seu discurso na Convenção Democrata e sentiu calafrios.
"A raça simplesmente não importa mais para mim", ela diz. "Mas muitos democratas por aqui...". Ela dá de ombros. "Vamos descobrir no dia da eleição, não vamos?"

Texto Anterior: Como a insanidade dos mercados atrai as massas
Próximo Texto: Ciência & Tecnologia: Na Itália, recriar a natureza para restaurá-la
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.